|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Medida "é remédio para a febre, não para a doença", diz analista
ROGERIO WASSERMANN
DA REDAÇÃO
A decretação do estado de comoção interna não servirá como
instrumento para conter o conflito interno na Colômbia, na avaliação de Camilo González Posso,
presidente do Indepaz (Instituto
para o Desenvolvimento e para a
Paz) e ministro da Saúde no governo César Gaviria (1990-1994).
Para ele, o governo buscou uma
forma de criar um novo imposto
para financiar sua estratégia de
guerra sem ter de depender do
Congresso para isso.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida ontem por González à Folha, por telefone, de Bogotá.
Folha - A decretação do estado de
comoção interna se justifica?
Camilo González Posso - O governo tem sua justificativa dentro de
sua política de buscar financiamento para a guerra, por causa da
escalada do conflito, dos ataques
nas cidades e das ameaças da
guerrilha aos prefeitos e governadores. Mas acho que o remédio
não serve para curar o doente. É
como um remédio para a febre,
não para a doença de fundo.
Acho que o governo tem um
propósito principalmente tributário, para permitir a criação de
uma nova taxa por decreto. O estado de exceção pode durar um
dia, mas os decretos e as normas
emitidas durante sua vigência se
tornam permanentes.
Folha - O exagero no uso do estado de sítio levou à sua restrição pela Constituição de 1991. O repúdio
da população ao estado de exceção
desapareceu?
González - Há hoje um estado de
ânimo entre a população muito
favorável às medidas de força. Isso é resultado do fracasso nas negociações de paz no passado, mas
também é uma ilusão que vai levar a novas frustrações.
Folha - A intensificação do conflito não justifica a medida?
González - A dinâmica da guerra
é assim. Cada ação dura de um lado justifica uma ação mais dura
do outro. São posturas coerentes
dentro dessa lógica, mas já levamos 40 anos nisso. A Colômbia
viveu 30 anos em estado de sítio
quase permanente. Poderíamos
viver agora mais 40 anos em exceção, e cada vez vai haver mais barbárie para justificar a guerra. O
que pode mudar isso é só uma estratégia de solução negociada.
Folha - Uribe acenou com a possibilidade de um processo de paz nos
últimos dias, pedindo inclusive
uma mediação do diálogo por parte das Nações Unidas. O sr. acredita
que haja vontade para negociar?
González - Falam sobre uma solução negociada, mas colocam ao
mesmo tempo obstáculos. Fazer
exigências como o cessar-fogo
unilateral é como exigir uma rendição. Ignoram o que pode ser um
processo viável. Tem de haver
concessões mútuas para se chegar
ao fim das hostilidades. É uma
mensagem confusa, que aparece
como linguagem de paz, mas que
coloca as condições de tal forma
que torna as coisas difíceis. O
mesmo fazem as Farc quando exigem para conversar a desmilitarização de um território que é quatro vezes o tamanho da zona desmilitarizada vigente durante o
processo de paz no governo Andrés Pastrana (1998-2002). Todos
falam de paz, mas estão na verdade desenvolvendo a guerra.
Texto Anterior: Colômbia: Uribe decreta exceção e cria taxa de guerra Próximo Texto: Chuvas: Centro de Praga será alagado, e 50 mil deixam casas Índice
|