São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2004

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"Triângulo xiita" é o novo desafio dos EUA

KHALED YACOUB OWEIS
DA REUTERS, EM BAGDÁ

Os comerciantes xiitas das cercanias da mesquita Kazimain em Bagdá são historicamente contra as atitudes do líder xiita Moqtada al Sadr e de seu pai. Porém, mesmo assim, condenaram a ofensiva americana contra o clérigo e os seus seguidores em Najaf.
Enquanto as forças americanas bombardeavam Najaf e cercavam a mesquita de Ali, mais iraquianos expressavam preocupação sobre o que eles chamam de força bruta para esmagar o levante liderado por Al Sadr. Eles disseram que essas táticas não servirão no longo prazo para estabilizar o Iraque pós-Saddam Hussein.
"Se os EUA matarem Moqtada, será uma tragédia para o Iraque e para o xiismo como um todo. Particularmente, não gosto de alguns de seus criminosos seguidores, mas o banho de sangue deve parar", disse Mohammad Aziz, que importa tecidos da Ásia.
"Os americanos não entendem que os iraquianos que estão massacrando são nossos parentes. Eles devem usar os cérebros. Al Sadr, por sua vez, precisa entender que nem Saddam conseguiu enfrentá-los [os EUA]", acrescentou.

Sem movimento
O mercado ao redor da mesquita Kazimain, normalmente um dos mais movimentados do Iraque, estava quase vazio por causa do medo do levante. Muitas lojas foram fechadas e havia poucos clientes. Com o seu domo dourado, a mesquita, local do mausoléu de dois importantes imãs xiitas, não foi aberta ao público.
Fotografias de Al Sadr e de seus falecidos pai e tio estão penduradas em todos os locais. Os dois mortos se tornaram figuras proeminentes na história xiita por suas posturas desafiadoras.
Saddam executou o tio de Al Sadr Mohammad Baqer, um dos mais expressivos pensadores xiitas, em 1980. Ele era conhecido como o "leão branco" por ter se recusado a reverenciar Saddam para salvar a própria vida. Mohammad Sadeq, pai de Al Sadr, foi morto em 1999. Ele desafiou Saddam e a autoridade religiosa do aiatolá Ali al Sistani, uma liderança xiita que não apóia o envolvimento dos clérigos com a política -alguns de seus seguidores manifestaram apoio a Al Sadr, que prometeu não se render.
"Os americanos não nos derrotarão matando Moqtada. Nós demos a eles até janeiro para realizar eleições e depois devem sair. O problema de Moqtada é que ele não é tão paciente quanto Sistani", disse o joalheiro Faleh Kawthar.
Na rua, centenas de estudantes do seminário de Al Sadr marchavam, carregando fotografias de Al Sadr e perguntando sobre notícias de seu líder. "Nós triunfaremos mesmo se sofrermos uma derrota militar em Najaf. Está claro que o governo instalado pelos EUA de Iyad Allawi [premiê] efetivamente já ruiu", disse o religioso islâmico Hazem al Araji.
Do outro lado do rio Tigre, na mesquita do imã Abu Hanifah, no distrito de Adhamiya, os muçulmanos manifestaram apoio a Al Sadr, dizendo que ele é um nacionalista cuja campanha contra a ocupação tem encontrado simpatizantes tanto entre os xiitas quanto entre os sunitas -os dois principais ramos do islamismo. Hoje o Iraque é majoritariamente xiita. Porém a minoria sunita governou o país desde a sua fundação, nos anos 20.

Nova frente
"Moqtada acabou com o mito americano de que a resistência está confinada ao que eles chamam de triângulo sunita", disse o imã Moyad al Adhami. "Os americanos também estão tendo de lidar com o "triângulo xiita" em Amara, Nassiriah, Basra e em outras partes. Essa resistência não acabará", acrescentou.


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