São Paulo, domingo, 13 de outubro de 2002

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AMÉRICA LATINA

Líder nas pesquisas "subsidia" mídia na corrida presidencial

Adolfo Saá tenta campanha popular na Argentina

JOÃO SANDRINI
DE BUENOS AIRES

Adolfo Rodríguez Saá, que foi presidente da Argentina por uma semana no fim do ano passado e lidera as pesquisas de intenção de voto para a eleição presidencial de março, aposta não apenas em um discurso populista, mas também em uma campanha popular com importante participação da imprensa para se eleger.
O pré-candidato, ligado ao Partido Justicialista (peronista), iniciou no mês passado uma caravana -ironicamente chamada pela imprensa local de "Marcha dos Sonhos"- que promete percorrer todas as Províncias do país até a data da eleição. Na última quarta-feira, a Folha acompanhou a largada da caravana em Buenos Aires, em La Cava (o poço, em português), uma das favelas mais miseráveis da Província.
Sob chuva fina e rodeado de seguranças, Rodríguez Saá caminhou por ruas enlameadas e cumprimentou com beijos e abraços parte dos moradores. Depois, donas-de-casa, desempregados e ex-presidiários, entre outros, contaram suas mazelas e reclamaram mais emprego e educação ou menos violência e fome.
Os moradores também mostraram seu descontentamento com uma classe política que não foi capaz de evitar que a pobreza atingisse o índice recorde de 53% da população. Sempre sorridente, Rodríguez Saá escutou frases como: "Olho para o senhor e o acho simpático agora, pisando na lama. Mas será da mesma forma depois de ganhar a eleição?".
Após ouvir umas 15 pessoas, o pré-candidato improvisou um discurso e prometeu, entre outras coisas, criar empregos para que "a Argentina volte a ser como em outros tempos".
Antes disso, Rodríguez Saá pediu aos jornalistas que se afastassem para deixar lugar para a população. "A imprensa não pode ser um obstáculo para o povo argentino", disse ele, sob aplausos.
A participação dos meios de comunicação no ato, no entanto, foi subsidiada pelo próprio candidato. Um ônibus e almoço foram oferecidos para que dezenas de jornalistas e fotógrafos locais e estrangeiros pudessem acompanhar a marcha nas dez vilas visitadas durante o dia. Se necessário, assessores buscavam repórteres em suas próprias casas para obter maior divulgação.
A preocupação de Rodríguez Saá com a imprensa é reduzida à marcha. O pré-candidato tem recusado pedidos de entrevistas do maior jornal do país, o "Clarín", e da revista de maior circulação, a "Noticias". Mas ele mantém boas relações com apresentadores de TV que comandam os programas em que sempre aparece.
Tanto o "Clarín" quanto a "Noticias", assim como outros meios argentinos, resgataram, em reportagens recentes, denúncias judiciais de enriquecimento ilícito ou escândalos sexuais envolvendo Rodríguez Saá.
No entanto o porta-voz de campanha, Gustavo Valenzuela, negou que sejam escolhidos para entrevistas apenas jornalistas de confiança. "A imprensa deve entender que nós definimos a estratégia de campanha, e não eles."
Ele também afirmou que a marcha foi a maneira encontrada por Rodríguez Saá para fazer campanha sem necessitar de doações de empresários -"para não se comprometer com ninguém"- e sem poder contar com a estrutura do Partido Justicialista -cuja maior parte dos dirigentes e filiados deve apoiar o ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) na eleição.
O porta-voz garantiu que Rodríguez Saá não vai comprar espaços publicitários na TV como fazem seus concorrentes.
Além disso, ele afirmou que os custos da marcha são financiados por militantes e que, apesar de o patrimônio de Rodríguez Saá ter crescido de dois carros e uma casa para 3,3 milhões de pesos (R$ 3,394 milhões) durante os 18 anos em que governou a Província de San Luis, ele não vai investir dinheiro próprio na campanha. "Na situação atual, isso seria zombar do povo", disse Valenzuela.



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