|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Com Pachauri, Bush tentou conter painel
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
De uma tacada só, o comitê
do Nobel premiou o maior rival político do presidente
americano, George W. Bush,
e o painel de cientistas que
ele achou que tinha sob seu
controle -Rajendra Pachauri, presidente do IPCC, é um
corvo que Washington criou
e que acabou comendo os
olhos da Casa Branca, aparentemente os únicos no
mundo ainda cegos para a
crise do clima.
Em 2002, um ano após rejeitar o protocolo de Kyoto,
Bush lançou uma grande
ofensiva contra o IPCC. O
painel era então presidido
por Robert Watson, conhecido por sua defesa estridente
do corte imediato e profundo
das emissões de gases de
efeito estufa. Watson era indicado político da administração Clinton-Gore e uma
pedra no sapato dos republicanos e das empresas de petróleo que os apoiavam.
Naquele ano, quando o
IPCC realizaria eleições, um
memorando da Exxon à Casa
Branca perguntava: "Será
que Watson pode ser substituído agora, a pedido dos
EUA?". Pedido atendido. E
os EUA passaram a fazer
campanha para que Pachauri
fosse escolhido para a presidência do painel.
O lobby tinha o claro objetivo de enfraquecer o IPCC.
Relativamente desconhecido, Pachauri trabalhava para
a indústria do carvão mineral na Índia, o ramo da economia que mais polui. A expectativa de Washington era que o economista indiano
permanecesse fiel a suas origens e silenciasse o IPCC.
Uma vez na liderança do
painel, no entanto, Pachauri
se viu cercado pelas evidências. E teve de se render a
elas. Estudo após estudo,
medição após medição, desastre natural após desastre
natural, o quadro que se configurava era o de que o aquecimento global era real e,
sim, era causado sobretudo
pela queima de combustíveis
fósseis por seres humanos.
Essas conclusões teriam
de ficar bem explícitas no
Quarto Relatório de Avaliação do Conhecimento sobre
a Mudança Global do Clima,
cuja produção o indiano liderou com retidão e transparência. E ficaram. O tiro de
Bush saiu pela culatra.
A Exxon não desistiu: passou a financiar uma ONG, o
neoconservador American
Enterprise Institute, para
subornar cientistas a escrever estudos desacreditando
as conclusões do IPCC. O
instituto oferecia US$ 8.000
por crítica. A armação foi
descoberta pela imprensa e
denunciada. A Bush nada
mais restou do que declarar
que acredita nos cientistas,
tentando ao mesmo tempo
manter na prática a decisão
de não fazer nada para resolver a crise.
O Nobel da Paz a Al Gore e
ao IPCC acaba funcionando
como uma declaração política: Bush, você perdeu a sua
chance de liberar o planeta.
Que os democratas façam
melhor em 2008.
Texto Anterior: "Divisão de lucros": US$ 7.500 do Nobel poderiam vir para o Brasil Próximo Texto: Uribe diz em cúpula querer Colômbia no Banco do Sul Índice
|