São Paulo, Domingo, 14 de Março de 1999
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TRADIÇÃO VIOLENTA
Mulheres que cometem adultério são mortas por parentes
Cidade turca é a capital das mortes "por honra"


JUSTIN HUGGLER
do "The Independent", em Istambul

A cidade de Sanliurfa é a capital turca das mortes "por honra". Com seu labirinto de ruas estreitas e empoeiradas, vigiadas por um castelo da época das Cruzadas, Sanliurfa herdou um legado austero da velha Anatólia.
No sudeste da Turquia, as mulheres que desgraçam a família cometendo adultério ou mantendo relações sexuais antes do casamento são mortas por familiares.
Sob a lei turca, essas mortes "por honra" são consideradas crimes cometidos sob "provocação pesada", e as sentenças são leves.
Hasan Gemici, ministro turco para os Direitos das Mulheres, diz que deseja acabar com isso.
As mortes "por honra" não são crimes passionais, mas planejadas a sangue frio, de acordo com Canan Arin, ativista que luta pelos direitos femininos.
"Se a comunidade acha que uma menina desonrou a família, seus parentes são condenados ao ostracismo. E eles se sentem obrigados a matá-la. Houve cinco ou seis casos que foram para um tribunal nos últimos anos, mas ninguém se apresenta como testemunha. No ano passado, uma mulher conseguiu sobreviver a uma tentativa de assassinato -tentaram jogá-la no rio Eufrates. Ela mudou o nome e passou a esconder-se."
Em outro caso, uma mulher que não era casada foi esfaqueada até a morte por um primo adolescente numa rua movimentada de Sanliurfa. Apenas um comerciante se apresentou como testemunha. O assassino foi condenado a pouco mais de dois anos de prisão.
"É como se essas mulheres fossem sempre "culpadas'", explica Seyda Toreuk, também ativista pelos direitos da mulher.
"O erro de algumas é simplesmente ir ao cinema com um homem. Uma mulher foi morta porque lhe dedicaram uma canção no rádio. A família pensou que a dedicatória viesse de um amante."
O Ministério para os Direitos da Mulher afirma que pôr fim às mortes "por honra" é sua prioridade.
Mas, com a proximidade das eleições, em 18 de abril, a chance de eles conseguirem logo uma nova lei no Parlamento é pequena.
"O problema é que a sociedade, incluindo as mulheres, acredita que matar para defender a honra é justificável. A única maneira de mudar isso é educando o povo".


Tradução de Paulo Daniel Farah


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