São Paulo, Domingo, 14 de Março de 1999
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PESQUISA
A cada 100 mil abortos, há 330 mortes nas regiões em desenvolvimento; índice cai para 1,2 em países desenvolvidos
Aborto mata 275 vezes mais onde é proibido

MARCELO DIEGO
de Nova York

Mulheres que praticam aborto em países onde ele não é permitido têm 275 vezes a mais de chance de morrer do que em países onde ele é legalizado.
Vinte e seis milhões de mulheres praticam aborto, todo ano, em países onde ele é permitido. Nesses lugares, 312 morrem em decorrência de complicações do ato.
Por outro lado, 20 milhões de mulheres praticam o aborto em lugares onde ele é ilegal. Desse número, 66 mil morrem por complicações.
A diferença é uma das conclusões do relatório divulgado pelo pelo Instituto Alan Guttmacher, uma organização apartidária que destina recursos para pesquisas na área da reprodução humana e análises políticas em todo o planeta.
O instituto diz que hoje há cerca de 1,38 bilhão de mulheres entre os 15 e 44 anos (faixa que compreende a maioria absoluta de grávidas). Levantamentos mostram que, em média, 210 milhões mulheres engravidam a cada ano. Cerca de 38% dos casos acontecem sem planejamento e 22% terminam em aborto.
Os abortos acontecem em maior parte nos países desenvolvidos graças à permissão da lei. Segundo o instituto, 41% das mulheres do mundo vivem hoje debaixo de leis que permitem a prática do aborto sob quaisquer circunstâncias e sem a necessidade de razão específica. O percentual cresce entre os países desenvolvidos (71%) e cai drasticamente nos países em desenvolvimento (33%).
O restante das mulheres (59%) está dividido entre países com restrições parciais (caso do Brasil, onde a prática só é permitida quando há risco evidente para a mãe ou quando a gravidez é originada por estupro) ou até com proibição total ao aborto.
Mesmo proibido, o aborto continua sendo praticado em alguns países, elevando o grau de perigo para a saúde da grávida. Segundo o relatório, das 600 mil mortes decorrentes de complicação com a gravidez ao ano, cerca de 11% são causadas por abortos em condições irregulares.
Em países em desenvolvimento (com a exceção da China) acontecem 330 mortes a cada 100 mil abortos. Em países desenvolvidos o índice de mortalidade é de 1,2 para cada 100 mil abortos. O maior risco se encontra na África: a cada 100 mil abortos, 680 acabam matando a parturiente.
"Nos países mais pobres, as mulheres estão expostas aos maiores riscos de complicações e morte por causa da ilegalidade e das condições de insegurança", diz Jeannie Rosoff, presidente do Instituto Alan Guttmacher.
O relatório mostra, em estatísticas, que há sérios problemas decorrentes da prática.

Envelhecimento
Um é o envelhecimento da população. Nos EUA, onde 23 de cada 100 mil mulheres já praticaram o aborto, esta é uma preocupação do Congresso, que prevê crescimento populacional negativo na próxima década, falta de mão-de-obra e colapso no sistema previdenciário em 20 anos.
Outro dado importante é que 63% das mulheres norte-americanas chegam aos 18 anos já tendo praticado sexo. Só na Dinamarca (72%) e na Islândia (71%) o percentual é maior. O próprio instituto reconhece que parte das mulheres só fazem sexo por saberem que não terão filhos (seja porque usam métodos contraceptivos, seja pela prática do aborto).
Outra conclusão do relatório diz que as maiores taxas de gravidez não planejada (49%) e de aborto (36%) acontecem nos países desenvolvidos. Mas eles englobam apenas 28 milhões de mulheres grávidas por ano. Já os países subdesenvolvidos apresentam planejamento melhor (36% dos nascimentos não são previstos) e menos abortos (20%), embora representem 182 milhões de grávidas.
Os meios de contracepção mais eficazes que existem são a esterilização (masculina e feminina). Pílulas anticoncepcionais e camisinha têm grande eficácia, segundo a pesquisa.
Tentar a abstinência costuma falhar: de cada 100 que tentaram não fazer sexo para evitar filhos, 13 não seguiram adiante.


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