São Paulo, domingo, 14 de abril de 2002

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"Ação militar de Israel foi erro tático"

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

A ofensiva militar israelense para pôr fim à "infra-estrutura terrorista" dos palestinos, iniciada em 29 de março último, constituiu um enorme erro tático -uma tolice. No entanto, por razões políticas domésticas, ele tinha de ser cometido. Além disso, os estrategistas militares israelenses tinham, provavelmente, consciência das sérias consequências que a ofensiva iria acarretar.
A análise é de Edward Atkeson, ex-subchefe do Estado-Maior das Forças Armadas dos EUA -responsável por assuntos de inteligência-, pesquisador de questões militares do Oriente Médio no Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais (Washington) e autor de, entre outros, "A Military Assessment of the Middle East" (uma avaliação militar do Oriente Médio).
Leia a seguir trechos de sua entrevista, por telefone, à Folha.

Folha - Como o sr. analisa a ofensiva militar israelense iniciada em 29 de março último?
Edward Atkeson -
Foi um ato tolo, um enorme erro tático. Contudo, por razões políticas domésticas, ele tinha de ser cometido. A decisão de invadir os territórios palestinos não foi tomada por razões militares, mas políticas. Creio que os estrategistas militares israelenses tivessem consciência de que as consequências de seus atos seriam gravíssimas.
Porém, do ponto de vista estritamente militar, com novos atentados suicidas sendo cometidos pelos palestinos, as forças de segurança israelenses deverão intensificar o controle e as revistas efetuados na população civil e apertar o cerco nas regiões consideradas mais delicadas, o que deve causar mais mortes.

Folha - Numa região eminentemente civil, como a Cisjordânia, uma operação militar de tal envergadura é viável?
Atkeson -
Isso depende da perspectiva de quem analisa o fato. Do ponto de vista militar, a operação é viável, pois não há verdadeiras limitações físicas para nenhuma ação que os militares israelenses queiram empreender.
Por outro lado, se levarmos em conta as consequências políticas dessa operação militar, sobretudo por causa das inúmeras mortes por ela causadas, concluiremos que se trata de uma maluquice. Todavia não podemos esquecer que muitos malucos ocupam posições de comando em todo o mundo atualmente.

Folha - O sr. crê que Israel tenha conseguido minimizar as baixas civis em sua ação militar?
Atkeson -
Não acredito que as autoridades israelenses que realmente controlam o país hoje, como o premiê Ariel Sharon, estejam preocupadas com a morte de civis. Na atual conjuntura, elas privilegiam apenas seus objetivos políticos e "militares".
Já há quem suspeite que quase 500 pessoas tenham sido mortas durante a ofensiva no campo de refugiados de Jenin, na Cisjordânia. Assim, quando a crise atinge o nível de gravidade atual, ninguém mais pensa em minimizar as baixas civis. Afinal, uma coisa é certa: a situação está totalmente fora de controle. Isso no que se refere aos israelenses, aos palestinos ou aos americanos. Estes talvez sejam os mais perdidos.

Folha - Que lições Israel pode tirar da ação e de suas repercussões?
Atkeson -
Para que alguém possa tirar uma lição do que quer que seja, ele tem de ter disposição para aceitar que há lições a aprender. Afinal, é necessário entender a lição e interiorizá-la. Não vejo esse tipo de disposição nos atuais líderes políticos ou militares israelenses. Na verdade, não vejo isso em nenhum dos dois lados.

Folha - No caso hipotético da deflagração de uma guerra, que tipo de cenário o sr. imaginaria?
Atkeson -
Israel poderia atacar a Síria se quisesse expandir o conflito, já que Damasco exerce forte influência sobre o Hizbollah [grupo extremista libanês". Também poderia atacar o Líbano, uma vez que os ataques do Hizbollah partem de seu território. Entretanto não creio que os outros países árabes queiram entrar num conflito armado contra Israel, pois os israelenses têm muito mais poder militar que os árabes.


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