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Êxito no Iraque é chave para a paz
MICHAEL SCOTT DORAN
ESPECIAL PARA O "NEW YORK TIMES"
A derrota de Saddam Hussein vai levar à criação de
uma nova ordem no Oriente Médio. A natureza exata dessa nova
ordem ainda não pode ser conhecida, mas uma coisa é certa: vários
países vão exigir que os EUA dediquem mais recursos à melhora
das relações palestino-israelenses.
Washington faria bem em atender a essas exigências. Mas deve
rejeitar a idéia de que resolver esse
conflito é a chave para estabelecer
uma nova ordem estável.
Um consenso emergiu entre comentaristas europeus e árabes sobre a política externa dos EUA:
Washington é cega à realidade.
Dois slogans expressam o dogma
à perfeição: ""a questão palestina é
a verdadeira fonte de instabilidade regional" e ""resolva a questão
da Palestina e aí você resolverá a
maior parte dos problemas da
América no Oriente Médio".
Embora esse ponto de vista esteja longe de ser um consenso nos
EUA, ele goza de considerável
apoio no mundo acadêmico e em
alguns setores de Washington.
O ponto mais forte a favor da
doutrina da Palestina é que o
apoio dos EUA a Israel provoca o
repúdio dos árabes e outros muçulmanos. Será que é exato supor
que o Oriente Médio muçulmano
enxerga os EUA principalmente
pelo prisma da Palestina?
A questão palestina com certeza
tem grande peso nos países que
fazem fronteira com Israel. Mesmo assim, não é de longe a única
questão que influi sobre os sentimentos na região. Para os egípcios, só para dar um exemplo, as
relações entre Cairo e Washington têm importância igual.
À medida que nos afastamos
geograficamente da Palestina, a
natureza redutiva da análise se
torna mais aparente.
As populações do golfo avaliam
os EUA principalmente segundo
o efeito que a política de Washington exerce sobre os conflitos
que mais lhes interessam. A ambivalência dos xiitas iraquianos em
relação aos EUA se deve à decepção que sentiram com políticas
americanas no passado -com
relação a eles, não aos palestinos.
Para curdos e kuaitianos, Saddam era um mal maior do que o
Grande Satã. Seja o que for que
causou o mal-estar recente nas relações EUA-Turquia, certamente
não foi a questão palestina.
O caso do Irã possivelmente seja
o que mais bem demonstra que,
quando o assunto é o dos sentimentos da população em relação
aos EUA, a política é sempre algo
local. O sentimento pró-americano está crescendo rapidamente na
terra de Khomeini, a ponto de
muitos jovens terem aplaudido a
guerra contra Saddam.
Os reformistas iranianos compartilham com Washington o
ódio pelos extremistas em Teerã.
Se o inimigo de meu inimigo é
meu amigo, concluem, Washington não pode ser tão ruim.
Uma receita para harmonizar as
relações EUA-Oriente Médio que
não cubra a realidade do golfo
Pérsico jamais vai resistir à prova
do tempo. O golfo sempre foi o
ponto focal para os EUA, e sua riqueza petrolífera faz dele uma
preocupação de primeira grandeza para todos os envolvidos, incluindo os próprios Estados do
Oriente Médio. É o golfo Pérsico,
e não o conflito árabe-israelense,
que domina as relações internacionais no Oriente Médio.
Se a doutrina da Palestina primeiro é um guia imperfeito à opinião pública no Oriente Médio,
ela está totalmente errada quando
se trata de descrever o comportamento dos Estados. A história recente da política iraquiana em relação a Israel ilustra a fraqueza da
idéia de que resolver o problema
da Palestina significará alicerçar
uma ordem regional estável.
Em 79, quando o Cairo assinou
os acordos de Camp David, Bagdá
liderou os outros Estados árabes
num esforço bem sucedido para
relegar o Egito ao ostracismo.
Durante um período curto depois disso, Saddam liderou o
campo daqueles que rejeitaram os
acordos. A situação continuou assim até que ele ficou atolado em
sua guerra contra o Irã. O medo
da derrota o levou a reabilitar o
Egito e a aplacar Israel, chegando
ao ponto de cogitar a possibilidade de paz com o Estado judaico.
Era Washington, e não Cairo
nem Jerusalém, o alvo principal
da nova política de Saddam. Bagdá precisava do apoio dos EUA
contra o Irã e viu que adotar uma
pose de moderação com Israel seria bem visto em Washington.
Isso ilustra duas regrinhas básicas muito úteis quando se trata de
prever o comportamento dos Estados árabes. A política do poder e
a opinião pública são duas coisas
que não giram no mesmo eixo.
O flerte de Bagdá com Israel começou na esteira da invasão israelense do Líbano, algo que o mundo árabe enxergou como uma
guerra brutal de agressão contra
civis indefesos. Por mais que tenha enfurecido a opinião pública
iraquiana, a invasão israelense
não chocou Saddam. Ele a aprovou, porque Israel combatia a Síria, que tinha se colocado contra
ele na guerra entre Irã e Iraque.
Ao evocar uma unidade árabe
fictícia e focalizar a opinião pública, a doutrina da Palestina primeiro ignora a natureza caleidoscópica da política de poder no
Oriente Médio.
Uma solução para o problema
palestino não significará o fim da
competição entre os países árabes
e, portanto, não irá estabilizar a
região tanto quanto se imagina.
Tradução Clara Allain
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