São Paulo, domingo, 14 de agosto de 2005

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ESTATÍSTICA INCÔMODA

Estudo britânico conclui que esse é o índice médio de discrepância paterna em testes de DNA

Um em cada 25 pais cria filho de outro

JEREMY LAURANCE
DO "INDEPENDENT"

Um surto de paranóia masculina é uma conseqüência possível do anúncio da descoberta de que um em cada 25 pais pode, sem sabê-lo, estar criando um filho que não é seu.
Uma revisão dos estudos de perfis de DNA, a prova máxima da relação genética, mostra que o índice de chamada "discrepância paterna" -o que acontece quando o homem testado não é o pai biológico da criança- varia de 1% a 30%.
Pesquisadores do Centro de Saúde Pública da Universidade John Moores, de Liverpool, disseram que o índice médio é de 3,7%, o que significa que quase um em cada 25 pais testados descobre que não é o verdadeiro pai do filho que considera seu.
A revelação pode ser devastadora para as famílias, mas suas implicações ainda não foram compreendidas, segundo os autores do estudo publicado no "Journal of Epidemiology and Communal Health". Cerca de um terço das gravidezes no Reino Unido não são planejadas, e uma em cada cinco mulheres que mantêm um relacionamento amoroso de longo prazo já teve um caso com outra pessoa.
Os pesquisadores dizem que a proporção de famílias afetadas será muito superior a uma em cada 25, já que, para cada "falso pai" identificado pelos exames, há um pai biológico verdadeiro em outro lugar, possivelmente com outra família própria.
O uso de exames de DNA vem aumentando rapidamente, e os sistemas judiciário e de saúde dependem deles para procedimentos tais como a doação de órgãos e a identificação de criminosos. Em alguns casos, como a identificação de vítimas de desastres, já aconteceu de exames de DNA terem inesperadamente trazido à tona uma identidade biológica diferente daquela sugerida pelos objetos pessoais, roupas e cartões de crédito das pessoas testadas -uma surpresa que só intensifica a dor dos familiares sobreviventes.
O professor Mark Bellis, autor principal do estudo, comentou: "Sabemos que a infidelidade separa as famílias. Vinte por cento dos divórcios envolvem alegações de infidelidade por parte de um dos parceiros ou de ambos. Há, também, questões relativas à saúde mental do pai ou da pessoa que pensou ser pai, além da mulher e do filho".
"Cada vez mais pessoas vêm se submetendo a esses exames e correm o risco de receber informações fundamentais, sobre elas próprias ou sobre seus parentes mais próximos, para as quais não estão preparadas. Ainda não analisamos as conseqüências da revelação ou não dessas informações às partes interessadas", completou.
O impacto do exame de paternidade ficou claro durante o rompimento público entre o ex-secretário do Interior britânico David Blunkett e sua antiga namorada Kimberly Quinn, após ele pedir para ter contato com uma criança que era sua filha, fato revelado por exames de DNA.
Na Alemanha, três irmãos publicaram um livro neste ano após terem feito testes e provado serem filhos do aviador americano Charles Lindbergh (1902-74), que se notabilizou por ter feito o primeiro vôo solitário atravessando o Atlântico sem escalas.
Várias telenovelas britânicas, entre elas "Brookside", que se passa em Liverpool, incluem ou incluíram tramas relativas a disputas de paternidade, e a Comissão de Genética Humana expressou preocupação quando os resultados de exames de paternidade foram divulgados ao vivo no programa "Trisha", da ITV.
O teste de DNA pode ser feito com um fio de cabelo ou com esfregaços bucais. Pode ser realizado por agências comerciais, com material enviado pelo correio. Alguns países estudam a possibilidade de proibir o exame genético de crianças sem o consentimento de pai e mãe.

"Eu sabia"
Ian Gould provou que não era o pai do filho de sua antiga amante -após pagar pensão alimentícia por 13 anos. Ele foi citado num processo de paternidade na década de 1980, antes do surgimento dos exames de DNA. Seu grupo sanguíneo era o mesmo da criança, o que lhe dava 35% de chances de ser o pai.
Depois de Gould pagar 8 mil libras em pensões por um filho com o qual não tinha contato, em 1994 o CSA (órgão que faz a análise de pedidos de pensão alimentícia) exigiu que a pensão semanal que ele pagava fosse aumentada de 12 libras para 85 libras. Gould se recusou, alegando não ser o pai da criança. Um exame de DNA provou que ele e o garoto não tinham parentesco. O CSA lhe devolveu o dinheiro pago desde 1994, mas não o que ele gastou antes disso.
Gould disse: "Tinha a certeza íntima de que Craig não era meu filho. Em alguns momentos, tem sido de cortar o coração. Quando tinha 11 anos, ele bateu à nossa porta e disse que queria me conhecer. A mãe havia colocado na cabeça dele a idéia de que éramos pai e filho. O CSA simplesmente não queria me ouvir."


Tradução de Clara Allain

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