São Paulo, quinta-feira, 14 de outubro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Déficit público americano não será contido, afirmam analistas

MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO

Se cumpridas, as promessas eleitorais no que tange às políticas socioeconômicas dos dois principais candidatos à Presidência dos EUA, o presidente George W. Bush (republicano) e seu adversário democrata, John Kerry, terão como principal impacto a manutenção do enorme déficit fiscal americano, segundo economistas consultados pela Folha.
Vale ressaltar que ambos prometeram reduzir pela metade o déficit público americano até 2010. No ano fiscal de 2003, o governo federal dos EUA apresentou um déficit recorde de US$ 375 bilhões. E, segundo o Escritório Orçamentário do Congresso dos EUA, ele chegará a US$ 415 bilhões neste ano fiscal. Este acabou no fim de setembro e teve um Orçamento total de US$ 2,4 trilhões.
"Ambos os candidatos prometeram cortar pela metade o déficit até 2010, mas nenhum deles apresentou um plano crível sobre como agirá para cumprir suas promessas", analisou Brian Friedl, economista da Fundação Heritage, reputado centro de pesquisas conservador (Washington).
"Se aplicarem o que vêm prometendo na campanha, Bush e Kerry contribuirão ao menos para a manutenção dos altos níveis de endividamento dos EUA."
Curiosamente, Lee Price, do Instituto de Políticas Econômicas, um centro de pesquisas "de esquerda" de Washington, concorda com Friedl nesse aspecto.
"Se pretende reduzir consideravelmente o déficit público, um presidente tem de expor propostas razoáveis sobre como pretende fazê-lo. O problema é que Bush e Kerry não apresentaram um plano factível e não param de fazer promessas que, se cumpridas, agravarão o mal", disse Price.
O déficit fiscal dos EUA deverá atingir um valor acumulado de US$ 2,29 trilhões nos próximos dez anos. A estimativa, feita em agosto último pelo Comitê de Orçamento do Congresso, elevou em US$ 300 bilhões a projeção anterior para o período (entre 2005 e 2014). Em 2000, quando Bush assumiu, estimava-se um superávit de US$ 5,6 trilhões em dez anos.
Todavia deve-se lembrar que o déficit público dos EUA equivale hoje a cerca de 5% do PIB (total de riquezas produzidas no país). A proporção chegou a 8% no governo de Ronald Reagan (1981-89).
Segundo os dois economistas, a intenção de Bush de tornar permanentes os cortes de impostos, além de sua "vocação belicista", e a de Kerry de aumentar os gastos em áreas como saúde e educação estão por trás da manutenção do déficit. Ambos divergem, contudo, quanto ao impacto dessas medidas a médio e longo prazos.
"Kerry pretende gastar entre US$ 650 bilhões e US$ 1,3 trilhão com saúde e educação nos próximos dez anos. Somados os cortes de impostos para a classe média e subtraído o aumento da carga tributária que incide sobre os mais ricos que ele propõe, seus planos serão catastróficos para a economia americana", explicou Friedl.
Para Price, porém, a manutenção do déficit público não será tão preocupante se "medidas corretas" forem aplicadas. "O déficit cresce por causa do aumento dos gastos ou da redução da receita fiscal. Mas, se conseguem fortalecer o desempenho econômico e a criação de empregos a médio e longo prazos, as despesas oficiais aumentam a arrecadação fiscal."
No que tange à proposta de Bush de manter o corte de impostos, ambos também não estão de acordo. "O diminuição da receita fiscal só será preocupante em dez ou 20 anos, quando os gastos com o Medicare [espécie de seguro-saúde] e com a Previdência explodirão por conta da aposentadoria dos "baby-boomers" [pessoas nascidas logo após a Segunda Guerra]. Antes disso, o déficit não inquieta", avaliou Friedl.
Para Price, todavia, os cortes de impostos de Bush são uma "política redistributiva", cuja meta é reduzir a carga tributária que incide sobre os ricos. "Isso não gerará empregos nem fortalecerá o desempenho econômico dos EUA", sustentou Price.
Ele acrescentou que considera irresponsável a manutenção de altos níveis de endividamento, já que, em dez ou 20 anos, será tarde demais para "atacar um problema que deve ser enfrentado agora", como no caso da Previdência.
"Esta irá à falência se nada for feito em breve. Bush pensa que a solução seja a Previdência privada, mas isso terá um impacto inicial terrível. Afinal, o governo deverá financiar a transformação do sistema atual", indicou Price.
Para Friedl, por outro lado, sem a introdução de um componente forte de Previdência privada no sistema público, este entrará em colapso. "Não há outra solução."
Para ambos os especialistas, entretanto, temas econômicos menos "populares" são tão importantes quanto a criação de empregos ou o crescimento. Entre eles está a escolha do próximo presidente do Federal Reserve (banco central), visto que Alan Greenspan deverá aposentar-se em 2006.


Texto Anterior: Frases
Próximo Texto: Oriente Médio: Israelense descarrega arma em palestina
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.