São Paulo, quinta-feira, 14 de outubro de 2004

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ARTIGO

Militares dos EUA criticam conflito

NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Boa parte do establishment militar dos EUA não se conforma com a idéia (ou medo) de uma humilhação no Iraque. "Em situações como as que enfrentamos, a sabedoria aconselha retirar-se, cair fora", é a opinião do general William Odon. O candidato democrata, John Kerry, diz contar com o aval de 12 generais. Tem usado um conflito conhecido, envolvendo o general Eric Shinseki e os civis com o comando do Pentágono, sobretudo o vice-secretário Paul Wolfowitz, "ideólogo" da invasão do Iraque, para ilustrar divergências entre o governo Bush e altas patentes dos quartéis. Com isso rebater afirmações de Bush de que a Guerra do Iraque está no rumo certo.
Shinseki ocupou a chefia do Estado-Maior do Exército. Foi constrangido a passar para a reserva em 2003 por insistir na necessidade de mandar mais tropas e apontar erros no pós-invasão. O "Defense Policy Board", ninho dos falcões civis no Pentágono, previu "vitória fácil" e necessidade no máximo de 40 mil soldados. Hoje, os 140 mil não dão conta do recado. Odon comandou a Agência Nacional de Segurança e hoje integra a elite do Instituto Hudson, centro de estudos conservador, ao que se sabe nada hostil à Casa Branca. Em depoimento à Salon.com, "as tensões entre o governo Bush e oficiais militares veteranos, a respeito do Iraque, são piores do que os mesmos tipos de tensões em qualquer outra época, incluindo a do Vietnã".
Saiu de uma eleitora de Bush a declaração de que "salvamos a Europa do nazismo e agora vamos salvá-la do islamismo". Uma guerra desse tipo não entusiasma os generais americanos. Odon garante que "uma maioria significativa de oficiais americanos está convencida de que acontece um desastre no Iraque". Vai contra o discurso de Bush e até afirma que o Irã e Bin Laden podem acabar sendo beneficiários. O terrorista mais procurado do mundo argumentaria, com alguma razão, segundo Odon, que o avanço dos EUA no Iraque equivale ao dos alemães em Stalingrado.
Derrotaram a si próprios, caíram num abismo, tentando ir mais a fundo. Manter o rumo, como ordena Bush, o comandante-chefe? "O rumo pode ser as cataratas do Niagara", é o que prevê outro general. Não é da tradição militar nos EUA oficiais questionarem os civis da cúpula do Pentágono. O controle civil dos militares tem sido algo sagrado na democracia americana. Com a Guerra no Iraque há o registro de desabafos nada amistosos por parte de oficiais. Se a tradição é quebrada é porque, na visão do establishment militar dos EUA, sucedem coisas graves na condução da Guerra do Iraque.


Newton Carlos é jornalista e analista de questões internacionais


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