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São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 2003

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Fracasso ameaça futuro do bloco

DO "INDEPENDENT"

A cúpula da União Européia foi palco das maiores e mais difíceis negociações do bloco em anos, um momento da verdade há muito adiado. Estava em jogo não apenas a primeira Constituição da UE mas o futuro do continente, reunificado após uma divisão leste-oeste de 50 anos.
A dúvida era se o continente seguiria adiante unido ou se dividiria como ocorreu, de forma amarga, na Guerra do Iraque. O fracasso do encontro aponta para nova divisão. Não houve acordo para aprovar o projeto de Constituição, de 300 páginas, elaborado por uma equipe liderada pelo ex-presidente francês Valery Giscard d'Estaing. O maior impedimento foi um protocolo na página 282 sobre o peso nas votações do bloco de seus atuais 15 membros e os dez novos que entrarão em maio do ano que vem.
O debate, altamente técnico, gira em torno de poder político e o controle de bilhões de euros.
O que torna o debate potencialmente fatal para a Europa é a forma com que ele está sendo conduzido. A UE cresceu das cinzas de um continente devastado pela Segunda Guerra. Seus arquitetos, especialmente a Alemanha, colocaram a causa da integração européia acima de tudo. Com o milagre econômico da Alemanha Ocidental, o governo de Bonn financiou a conta. A UE se expandiu, inicialmente de 6 para 12 países, até o Muro de Berlim cair (1989) e a Alemanha se reunificar.
Por mais de uma década, a Alemanha reunificada lutou para se adaptar ao custo econômico da reunificação e ao seu novo papel de maior país do bloco. Antes, a Alemanha Ocidental tinha quase a mesma população dos outros "grandes" da UE -França, Reino Unido e Itália. Agora, supera em 20 milhões a Espanha e em 40 milhões a Polônia.
Numa desastrosa cúpula em Nice, há três anos, os líderes europeus se debateram com o tema da representatividade por cinco dias.
O presidente francês, Jacques Chirac, se recusou então a aceitar uma mudança na paridade entre França e Alemanha, principais motores da UE. O compromisso resultante deu à Espanha e à recém-chegada Polônia quase o mesmo número de votos que a Alemanha no sistema decisório da UE expandida. Hoje o bloco paga o preço do fracasso em Nice.
Chirac, agora percebendo que os novos e menores membros terão influencia desproporcional, mudou de lado e apóia a Alemanha. Mas a oposição espanhola foi reforçada pela vontade polonesa. Como disse um diplomata: "Em Varsóvia, o tema é visto como um teste para a sua influência. Se perderem essa batalha, acham que não serão levados a sério". O assunto é tão importante que o premiê Leszek Miller foi a Bruxelas em cadeira de rodas, convalescendo de acidente com helicóptero.
O fracasso em Bruxelas é relevante? A resposta é sim. França e Alemanha fazem ameaças cada vez mais fortes de que, sem acordo, seguirão adiante liderando um núcleo duro de países dedicados a uma integração maior. Um grupo baseado nos seis países-fundadores seria recriado, com os países menos integrados e mais atlanticistas, como o Reino Unido e a Polônia, relegados ao segundo círculo. A Europa mais unida seria criada à imagem franco-alemã, enquanto os outros se voltariam mais para Washington.
A Europa já evolui em várias velocidades. O Reino Unido, por exemplo, está fora do euro, a moeda única da UE. Como disse o ministro das Relações Exteriores alemão, Joschka Fischer, numa Europa onde diferentes países cooperam em assuntos diferentes, "alguns países estarão em todos os núcleos, então haverá um núcleo dos núcleos", no qual estariam França e Alemanha.
Os assuntos na mesa não são novos, e precisam ser resolvidos pelo bem do bloco. Como disse o presidente do Parlamento europeu, Pat Cox, antes da cúpula: "Como já conhecemos as questões, não há grande benefício em adiar as respostas".


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