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HAITI EM RUÍNAS
Maior fração do Orçamento do país vem de doações
Mais de 70% da população sobrevive com menos de US$ 2 por dia, e um terço dela é dependente de ajuda alimentar
A debilidade do Estado e
a dependência de atores externos se combinam para a ausência de políticas de longo prazo contra pobreza
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
Com histórico de intervenções capitaneadas pelos EUA
desde 1905, ditaduras e instabilidade política, o Haiti atingido
pelo terremoto desta semana já
tinha mais de 60% do seu Orçamento bancado por doadores
externos, segundo Bernice Robertson, analista baseada em
Porto Príncipe do International Crisis Group (ICG).
A debilidade do Estado e a
dependência de ONGs, instituições multilaterais e governos
estrangeiros se combinam para
a ausência de políticas coerentes e de longo prazo para o combate da pobreza, da degradação
ambiental e da precariedade
econômica -30% do PIB vem
de remessas de emigrantes.
"O financiamento flutua de
acordo com as circunstâncias
políticas, as estratégias dos
doadores variam, e o governo
tem pouca influência sobre o
uso de recursos. A visibilidade
dos projetos, não bons resultados, é muitas vezes a prioridade", diz o último relatório do
ICG sobre o Haiti, divulgado
em abril do ano passado.
O texto do centro de estudos
especializado na radiografia de
áreas de conflito traz dados que
ilustram a tragédia haitiana.
Mais de 70% da população vive com menos de US$ 2 por dia,
e 56% com menos de US$ 1.
Apesar de majoritariamente
rural, o Haiti produz apenas
46% dos alimentos que consome. Os dependentes de ajuda
alimentar chegaram a 3,3 milhões, um terço da população,
depois dos furacões de 2008.
O ingresso na Petrocaribe,
iniciativa venezuelana de venda de petróleo em condições
mais favoráveis do que as de
mercado, aliviou os gastos com
combustível, que eram de 50%
das importações.
Mas 75% da energia usada
pelos haitianos ainda vem da
queima do carvão, o que levou à
destruição das florestas que cobriam o terreno montanhoso
do país. A cobertura vegetal,
que já tinha sido reduzida para
22% há 70 anos, agora é de menos de 2%.
A erosão do solo favorece as
enchentes e dificulta a produção agrícola nos vales e encostas, contribuindo para o inchaço das cidades costeiras -um
quarto da população vive em
Porto Príncipe. Na capital, apenas 54% dos moradores têm
acesso à água potável, proporção que é de 25% nas favelas locais e de 46% nas demais cidades. A rede pública de saúde
atende a 30% da população.
"Os médicos estão pedindo
gaze, remédios para dor e outros itens de primeiros socorros", disse Robertson à Folha,
por e-mail.
O terremoto veio depois de
período de redução das remessas e das doações internacionais, devido à crise financeira.
Nomeado enviado especial
da ONU para o Haiti, o ex-presidente americano Bill Clinton
queixou-se há seis meses de
que conseguira apenas US$ 21
milhões de US$ 760 milhões
prometidos em conferência de
doadores em abril de 2009. Na
época, o objetivo ainda era cobrir o prejuízo dos furacões, estimado em US$ 1 bilhão.
Apesar do aumento relativo
da segurança sob o mandato da
força de intervenção aprovada
pela ONU após a deposição do
presidente Jean-Bertrand
Aristide, o país demora a alcançar estabilidade política.
O presidente René Preval,
eleito em 2006, está no seu terceiro primeiro-ministro.
Transferidas de novembro de
2009 para o mês que vem, as
eleições legislativas estavam
sendo contestadas devido ao
veto à participação de 15 agremiações políticas, incluindo o
Lavalas, ainda formalmente dirigido por Aristide.
No século 19, o Haiti pagou
indenização à França para obter o reconhecimento de sua
independência. Na democratização, nos anos 90, teve que assumir dívida externa deixada
pelo clã Duvalier, parte da qual
só recentemente foi perdoada.
Para o ICG, é fundamental
que o país possa assumir o comando de seu desenvolvimento. "A reconstrução deve ser
orientada nacionalmente, com
a participação ativa dos setores
empresariais e políticos e da
sociedade civil", escreveu o
centro de estudos ainda sobre
os furacões de 2008.
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