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ANÁLISE
"Pólo de poder na América Latina" é retórica populista
CLÓVIS ROSSI
do Conselho Editorial
A defesa de um "pólo de poder na América Latina", feita
pelo coronel Hugo Chávez,
presidente eleito da Venezuela,
é a reprodução da retórica típica do caudilhismo populista da
América Latina.
Bem antes dele, outro caudilho populista (e militar), o general-presidente argentino
Juan Domingo Perón, já havia
cunhado uma das frases mais
repetidas por seus seguidores e
na essência parecida com a de
Chávez:
"O ano 2000 nos encontrará
unidos ou dominados", dizia
Perón, nos anos 50, referindo-se à América Latina.
O ano 2000 está às portas, a
América Latina (ou, pelo menos, a do Sul) jamais esteve tão
integrada como agora, mas
nem por isso é menos dominada ou menos subordinada aos
interesses dos países centrais.
De todo modo, a tese de Chávez tem, agora, um elemento a
seu favor e outro que joga contra.
A favor: a diplomacia brasileira trabalha exatamente com
essa perspectiva, embora com a
discrição habitual e sem a retórica agressiva do presidente
eleito da Venezuela.
O Itamaraty nunca escondeu
que gostaria de construir uma
Alcsa (Área de Livre Comércio
Sul-Americana), para fortalecer a posição negociadora do
subcontinente no diálogo com
os EUA em torno da Alca (Área
de Livre Comércio das Américas, prevista para abranger os
34 países americanos, excluída
apenas Cuba).
Contra, trabalha o fato de que
a crise no Brasil tende a esfriar
o interesse de seu governo -e
também de seus empresários- por mais integração regional, na medida em que ela é
um jogo permanente de concessões recíprocas. Um país sitiado como o Brasil hoje está
evitando qualquer concessão.
Pior: a crise brasileira, mesmo que não se agrave mais ainda, já está provocando uma desaceleração econômica também em seus vizinhos.
O que é lógico, pela inescapável influência que tem sobre
eles um país que responde por
45% do PIB total latino-americano (Produto Interno Bruto,
medida da renda de um país
ou, no caso, região).
Países fragilizados por dificuldades econômicas tornam-se inexoravelmente mais dependentes das potências regionais ou mundiais. No caso da
América Latina, dá-se o fato de
que a potência regional (os
EUA) é também a superpotência mundial.
Há, pois, hoje, mais chances
de a América Latina aprofundar a sua dependência dos EUA
do que de se transformar, como quer Hugo Chávez, em pólo
capaz de pelo menos dialogar
em condições de menos desigualdade com a única superpotência restante.
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