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RELIGIÃO
Bispos decidiram que padres envolvidos em abusos serão proibidos de ter contato direto com integrantes da paróquia
Igreja dos EUA não vai expulsar pedófilos
SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK
Em decisão histórica e inédita,
os bispos católicos norte-americanos reunidos em Dallas, no Texas, aprovaram no fim da tarde de
ontem a chamada política de "tolerância zero", segundo a qual padres que cometeram e cometerem
abuso sexual de menores serão
impedidos de exercer suas funções, sem que, contudo, sejam expulsos da igreja.
O documento, aprovado por
239 votos a favor e 13 contra,
avança em relação à proposta anterior, que permitia a manutenção nas funções de religiosos que
tivessem sido acusados de apenas
um crime, mas fica aquém do que
pediam as vítimas, que era a expulsão imediata de todos os acusados.
Segundo a nova política, batizada de "Plano de Proteção das
Crianças e dos Jovens", os padres
em questão serão proibidos de ter
qualquer contato direto com os
integrantes da paróquia, como celebrar missas, ensinar nas escolas
e mesmo servir refeições aos necessitados, mas poderão continuar realizando atividades de
bastidores na igreja.
"De hoje em diante, ninguém
que tenha reconhecidamente
abusado de uma criança vai trabalhar na Igreja Católica", disse
Wilton Gregory, presidente da
Conferência dos Bispos Católicos
dos EUA. "Nós nos desculpamos
por nossa tragicamente lenta resposta em reconhecer este horror
que é o abuso de menores."
Vaticano
A decisão dos bispos sai no
meio da maior crise da história da
Igreja Católica nos EUA. Há hoje
no país cerca de 300 processos
correndo nos tribunais contra padres (por pedofilia) ou dioceses
(por omissão).
Desde janeiro, pelo menos 150
padres e quatro bispos renunciaram sob acusações de abuso sexual de menores; daqueles, dois se
suicidaram e um foi assassinado
por uma suposta vítima.
O documento recebe agora a
chancela da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA e segue para o Vaticano, onde será examinado pela Santa Sé e pelo papa João
Paulo 2º, que pode vetar partes ou
o texto inteiro. É mais provável
que a primeira hipótese venha a
acontecer.
Desde que a conferência apresentou o esboço do documento,
há algumas semanas, o líder religioso vinha evitando comentar as
propostas.
Fontes ligadas ao Vaticano afirmam, no entanto, que a Santa Sé
vê com reservas o caráter retroativo da proposta e o fato de que a
decisão de retirar o padre do convívio público depende apenas do
desejo do bispo, e não de instâncias superiores.
Ontem, João Paulo 2º mandou
mais sinais nessa direção. Ao comentar a reunião dos bispos, antes do fim da votação, afirmou somente que a Igreja Católica dos
EUA deveria escolher melhor
seus padres daqui para a frente.
Uma fonte ligada ao papa, que falou ao "National Catholic Reporter" na condição de anonimato,
disse: "A "tolerância zero" vai enfrentar tempos difíceis aqui".
Oficialmente, um porta-voz do
Vaticano afirmou que a Santa Sé
só iria se manifestar sobre a votação depois de receber o documento americano.
"Tolerância um"
Por ter acontecido sob forte
pressão da opinião pública e ter
contado com depoimentos emocionados de vítimas durante o encontro, a reunião dos bispos deu
sinais de que a facção que defendia a expulsão pura e simples de
padres acusados acabaria vencendo. Não foi o que aconteceu.
Alguns militantes da Rede de
Sobreviventes dos Abusados por
Padres (Snap, na sigla em inglês),
principal ONG que reúne vítimas
de abusos sexuais, já estavam rebatizando o documento sarcasticamente de "tolerância um".
"Isso é o mesmo que chegar para um assassino urbano e dizer:
"Agora, você vai ser obrigado a viver no campo'", afirmou Mark
Serrano, um dos diretores da
Snap e ele próprio vítima de pedofilia.
"Os padres vão achar outras
crianças para atacar", disse.
Os religiosos envolvidos na votação tentavam minimizar a tibieza do documento final. "É preciso
mostrar compaixão cristã em relação aos padres que erraram",
disse o cardeal Anthony Bevilacqua, da Filadélfia. "Nós os chamamos de filhos, então precisamos
ter a mesma compaixão de pais
com os seus erros."
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