São Paulo, sexta-feira, 15 de outubro de 2010

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"Lucro deve ser distribuído de forma justa"

Para o escritor chileno Antonio Skármeta, progresso gerado pela mineração ainda fica nas mãos de poucos

Autor chileno defende que caso de mineiros presos inspire uma ética mais humana e que permita salários dignos

GUSTAVO HENNEMANN
DE BUENOS AIRES

O Chile considera os mineiros, em geral, um símbolo de esforço, porque eles entram no "coração da Terra para sobreviver" em uma região onde a superfície é desértica, segundo o chileno Antonio Skármeta, autor do livro que inspirou o filme "O Carteiro e o Poeta".
Para ele, a humanidade reagiu como se fosse um único corpo ao ver em perigo os 33 mineiros que estiveram presos no subsolo por 69 dias, e isso mostra que há "reservas de bondade" no mundo.
Em conversa com a Folha, por telefone, Skármeta recomendou os livros de contos "Sub Terra" e "Sub Sole", de Baldomero Lillio, e o romance "La Reina Isabel Cantaba Rancheras", de Hernán River Letelier, para os brasileiros que queiram entender como vivem os mineiros chilenos.

 

Folha - A dimensão dramática que tomou esse resgate tem relação com o fato de serem mineiros? O que eles representam para o país?
Antonio Skármeta -
Os mineiros representam vários símbolos na sociedade chilena. Primeiro, o esforço, por que se metem no coração da terra para sobreviver em uma região árida onde não há nada na superfície, apenas deserto. Esse esforço enorme para viver é feito por gente pobre, mal paga, mas com muita solidariedade mútua.
Segundo, o país conhece de maneira profunda e verdadeira o modo de vida dos mineiros porque há grande literatura sobre o tema.

Esse episódio evidenciou algo que é maior que o acidente e o espetáculo do resgate?
A maior metáfora que deixa essa história é que o mundo todo, independentemente de nacionalidade, quando se depara com uma situação em que seres humanos estão em perigo, reage emocionalmente como se fosse um único corpo.
Isso é essencialmente humano e desmente os céticos que desconfiam da bondade e da solidariedade entre as pessoas.
Porque não só os chilenos se interessam profundamente pelo destino dos mineiros, mas o mundo inteiro colocou sua energia e sua esperança nesse resgate.
É uma metáfora das reservas de bondade que existem na humanidade.

O que aconteceu na mina pode mexer com a identidade chilena?
O Chile, internamente, sentiu um afeto coletivo. Essa unidade cria ânimo bom e coesão nacional.
Mas não quero ver isso de maneira nacionalista, é algo universal, que se estendeu pelo mundo. Temos de aproveitar essa pequena situação para pedir [...] que isso inspire uma ética mais humana, com salários mais dignos para os mineiros.

Esse fato pode mudar a relação do país com a mineração?
O Chile não é como o Brasil, que tem um mercado interno enorme e pode viver por si e para si.
Somos um país pequeno, que precisa exportar. A mineração permitiu um grande progresso econômico. Mas esses lucros da exportação devem ser investidos de forma justa.
É preciso dar oportunidades aos filhos dos mineiros assim como têm oportunidades os filhos dos donos das minas.


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