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Kirchner afasta piqueteiro do governo
Jorge D'Elía, subsecretário de Terras, se solidarizou com Irã; demissão enfraquece tropa de choque governista
BRUNO LIMA
DE BUENOS AIRES
O presidente Néstor Kirchner não teve alternativa ontem
a não ser demitir o mais polêmico -mas também o mais
útil- dos membros de seu governo, o líder piqueteiro Luis
D'Elía, que era o subsecretário
de Terras, e que, anteontem,
saiu em defesa do Irã, dizendo
que os EUA e Israel manipulam
a Justiça argentina para levar
ao rompimento das relações
entre os dois países.
O episódio, comemorado pela oposição, que enxerga um
enfraquecimento do poder "bélico" de Kirchner sem D'Elía,
ocorre após a Justiça argentina
determinar a captura internacional de nove iranianos -entre eles o ex-presidente Ali Akbar Rafsanjani (1989-1997).
A ordem, que deu início a
uma troca de farpas da Argentina com o Irã, está baseada no
suposto envolvimento dos então governantes daquele país e
de membros do Hizbollah, grupo xiita do Líbano, no atentado
a bomba na sede da Amia (Associação Mutual Israelense Argentina), que matou 85 pessoas
em Buenos Aires, em 1994.
As declarações do piqueteiro,
que anteontem se reuniu com o
principal diplomata iraniano
na Argentina, criaram enorme
mal-estar para Kirchner com a
Justiça e com a comunidade judaica argentina, que defende o
rompimento do país com o Irã.
O funcionário apresentou
uma carta de renúncia, que foi
aceita pela Casa Rosada -mas
D'Elía não teve escolha. Disse
que mantém "excelente relação" com Kirchner e que se orgulha de ter estado no governo.
"Há vários meses os EUA
pressionam pela minha renúncia. É um lobby que eles têm
feito e que está baseado na prática do terror sobre a qual podem testemunhar o povo do
Afeganistão e os palestinos",
disse. "Os EUA e Israel pretendem usar um tema doloroso para a Argentina em função de
uma política que ameaça a república islâmica e põe em perigo a humanidade."
A Argentina segue pressionando Teerã por uma manifestação oficial sobre as declarações de um promotor iraniano
de que seria pedida, como reação à ordem argentina, a captura internacional do promotor
argentino do caso Amia, Alberto Nisman, e do ex-juiz do caso,
Juan José Galeano.
Considerado o "piqueteiro
oficial", D'Elía tem sido uma
das principais armas de Kirchner para atacar adversários.
Defensor da expropriação de
terras de estrangeiros, liderou
em agosto, como subsecretário,
a invasão da propriedade do
milionário americano Douglas
Tompkins na Província de Corrientes. O governo se aproveitava dos arroubos antiamericanos do funcionário para mostrar que não estava alinhado ao
"imperialismo" dos EUA.
O piqueteiro, que tem interlocutores em Cuba, na Venezuela e no PT brasileiro, já havia gerado outras saias justas
para o governo. Para analistas,
o presidente avaliava que D'Elía vinha se tornando "perigoso" demais.
Maior realizador das "contramarchas" (manifestações
que se tornaram rotineiras na
Argentina como reação a protestos), D'Elía garantia platéia
para qualquer palanque do oficialismo. Soldado leal, tornou-se uma pedra no sapato do ex-presidente Eduardo Duhalde,
desafeto de Kirchner, e agia para conter o avanço da popularidade de Juan Carlos Blumberg,
engenheiro que teve o filho assassinado e que ganhou visibilidade como crítico do governo.
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