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São Paulo, sexta-feira, 16 de maio de 2003

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Há como controlar o mal, diz OMS

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

A pneumonia asiática ainda pode ser devolvida à natureza antes que se torne endêmica em países como a China e cause surtos futuros no planeta. A opinião é do chefe do departamento de doenças transmissíveis da OMS (Organização Mundial da Saúde), o americano David Heymann.
"Nós não vamos ver uma repetição da gripe de 1918 [que matou 20 milhões de pessoas] com essa infecção", disse Heymann, 57, em entrevista à Folha. "Ela pode ser controlada."
Segundo Heymann, indícios de que esse controle está próximo foram a eliminação das transmissões no Vietnã e a redução no número de casos em Hong Kong, Cingapura e Canadá. No entanto ele diz que nenhum país está fora de risco -nem o Brasil.
Leia abaixo a entrevista, concedida de seu escritório na sede da OMS, em Genebra (Suíça).
 

Folha - No dia 17 de março, o sr. disse que o vírus com o qual estávamos lidando não era tão contagioso e que a probabilidade de uma pandemia era mínima. O sr. mantém essa posição?
David Heymann -
Sim, eu mantenho. A doença é moderadamente transmissível, não é tão transmissível quanto a gripe. Vimos que países como o Vietnã podem ficar livres da Sars e acreditamos que Toronto, Hong Kong e Cingapura também venham a estar livres. Cingapura não teve novos casos em muitos dias, e Hong Kong tem poucos casos por dia. Acreditamos que essa doença possa ser empurrada de volta à natureza, de onde ela veio.

Folha - E como isso pode ser feito? Estudos recentes mostram que o vírus é bem adaptado a humanos.
Heymann -
A China vai ter de trabalhar duro. Sim, o vírus é bem adaptado à transmissão humana. Mas o fato de que países tenham interrompido a transmissão é encorajador. Então, se nós conseguirmos impedir que essa doença se torne endêmica, teremos cumprido nosso objetivo.
Nós não vamos ver uma repetição da gripe de 1918 [20 milhões de mortos] com essa infecção. O que nos preocupou foi o fato de que demoramos para saber qual era ou causador, e ainda sabemos pouco sobre ele. Mas ela pode ser controlada.

Folha - O que quer dizer "a China vai ter de trabalhar duro"?
Heymann -
A China vai precisar primeiro descobrir onde a doença está presente, porque parece que ela já se espalhou muito pelo país. Depois, vai precisar conter o surto onde ele ocorrer.

Folha - Como o sr. avalia a resposta das autoridades mundiais de saúde em relação à epidemia? Foi rápida o suficiente?
Heymann -
Acredito que, depois que a OMS fez seu primeiro alerta global, em 14 ou 15 de março, as autoridades tenham reagido muito prontamente e, assim, evitaram surtos em muitos países.

Folha - Mas a China teve seus primeiros casos em novembro do ano passado, e a OMS só divulgou o alerta em março.
Heymann -
Não tínhamos toda a informação da China. Não sabíamos até março que os casos de Sars na China eram os mesmos que os casos fora da China. Em fevereiro, conseguimos estabelecer uma relação com os casos na China e, no meio de março, conseguimos mostrar que se tratava da mesma doença.

Folha - Quanto tempo o sr. acha que vai levar para uma vacina chegar ao mercado e, se chegar, como a OMS vai garantir que ela seja distribuída às regiões pobres?
Heymann -
Se a doença não se tornar endêmica, não precisaremos de uma vacina. Por isso, nossos esforços se concentram em tentar conter o surto.
Se houver um mercado para a vacina, se falharmos e ela se tornar endêmica como a tuberculose e a malária, haverá interesse de empresas privadas em desenvolver a vacina.
Hoje, sem mercado, cabe ao setor público desenvolver uma vacina, e os EUA estão começando a fazer isso. Uma vacina pública será mais barata.

Folha - A globalização é culpada pela disseminação da Sars? Nós estamos condenados a ver mais epidemias assim no futuro?
Heymann -
Certamente. Doenças infecciosas não respeitam fronteiras. O que é pouco usual com relação à Sars é que ela é facilmente transmissível de humano para humano. Outras infecções emergentes nos últimos 30 anos não eram tão transmissíveis, exceto a Aids.

Folha - O Brasil está livre de risco?
Heymann -
Nenhum país está livre de risco.


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