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IRAQUE NA MIRA
Chefe dos inspetores diz que qualquer tentativa de Bagdá de atrasar seu trabalho será considerada falta "grave"
Inspetores não tolerarão atrasos, diz Blix
CORINE LESNES
DO "LE MONDE", EM NOVA YORK
O Iraque tem de estar pronto a
respeitar os termos da resolução
da ONU, já que atrasos não serão
tolerados. É claro que a administração iraquiana está insatisfeita,
e isso será levado em consideração pelos inspetores de armas.
Mas a aplicação da resolução também interessa ao Iraque. Afinal, o
Conselho de Segurança da ONU
disse que se trata da última chance do Iraque, o que é muito sério.
A análise é do sueco Hans Blix,
74, chefe dos inspetores de armas
da ONU e especialista em direito
constitucional. Blix foi ministro
das Relações Exteriores da Suécia
durante um ano (1978-1979) e diretor da Agência Internacional de
Energia Atômica nos dez anos
subsequentes.
Desde 2000, ele dirige a Comissão de Controle, Verificação e Inspeção das Nações Unidas no Iraque (Unmovic). Os inspetores deverão enviar a Bagdá, na próxima
segunda-feira, uma primeira
equipe encarregada da logística
da operação. Em seguida, no dia
25 de novembro, será a vez de
uma equipe operacional desembarcar no Iraque.
Leia a seguir sua entrevista.
Pergunta - O que o sr. acha da carta em que Bagdá disse aceitar a resolução 1441?
Hans Blix - É uma verdadeira
carta de amor, não? Nossa opinião é que o Iraque está pronto a
respeitar os termos da nova resolução. É claro que a administração
iraquiana está insatisfeita. Registramos isso. Mas cabe a nós aplicar a resolução, e isso também
atende aos interesses do Iraque. O
Conselho de Segurança [da ONU"
disse que é a última chance do Iraque. Isso é muito sério.
Pergunta - A carta do ministro
iraquiano lembra que estamos no
Ramadã [mês sagrado para os muçulmanos]. Isso não pode causar
atraso no trabalho dos inspetores?
Blix - O Ramadã é um período
de jejum. Os inspetores não interferem de nenhuma maneira na
prática religiosa. As inspeções são
inteiramente possíveis no Ramadã. Isso já ocorreu no passado.
Pergunta - Por outro lado, o sr.
passou a ser vigiado pelos "falcões" do governo americano, não?
Blix - Fui a Washington com
Mohamed El Baradei [diretor-geral da Agência Internacional de
Energia Atômica]. O presidente
[George W." Bush nos assegurou
que os EUA preferem uma solução pacífica, se isso for possível, e
que ele apóia os inspetores totalmente. Alguns setores da administração americana talvez não
estejam satisfeitos com as decisões que foram tomadas. Mas as
decisões cabem ao presidente.
Pergunta - Não é verdade que algumas divergências ainda persistem?
Blix - Para nós, foi extremamente importante contar com o apoio
unânime do Conselho de Segurança. Mas o fato de contarmos
com esse apoio fundamental não
significa que não existam problemas. Há muitas formulações que
suscitam interpretações distintas.
Sobre a questão das violações, pode haver pontos de vista diferentes entre os Estados-membros.
Pergunta - Consta que Paul Wolfowitz, um dos "falcões" da administração americana, teria insistido para que fosse exigido que os
inspetores conduzam os interrogatórios de cientistas iraquianos fora
do país. O sr. se opôs à proposta?
Blix - As entrevistas são muito
importantes no desarmamento.
Entretanto o Iraque não é um país
em que a liberdade de expressão é
exercida facilmente. No passado,
muitas entrevistas ocorreram
sem problemas. Também houve
casos em que os inspetores perceberam que as testemunhas estavam com medo.
É claro que temos o direito de
exigir falar com as pessoas sem a
presença de testemunhas. Mas
não podemos forçar ninguém a
falar. É aqui que entra a cláusula
da resolução que nos autoriza
-eu disse autoriza, não ordena- a "facilitar" a viagem para
fora do Iraque de testemunhas e
de seus familiares. Eu disse que
previa dificuldades de ordem prática. E, sobretudo, não quero sugerir uma ação que coloque em
risco a vida das pessoas envolvidas.
Acho que o trabalho dos inspetores é realizar inspeções, não servir como agência de deserções. Ficou claro?
Pergunta - Se uma inspeção for
atrasada ou bloqueada durante algumas horas pelos iraquianos, isso
constituirá uma violação?
Blix - Isso vai contrariar o princípio central de acesso imediato, irrestrito e incondicional. Se houver atraso de duas horas, dependendo do motivo dado, isso poderá constituir delito grave, sim. Eu
diria que até mesmo um atraso de
meia hora pode ser grave.
Pergunta - Tudo vai depender da
avaliação feita pelos inspetores em
campo. O sr. vai estar lá, em campo?
Blix - Existe uma cadeia muito
rápida de prestação de contas para os inspetores em campo. Mas
não cabe a nós decidir se ocorreu
uma violação. Quem o fará será o
Conselho de Segurança. Nós diremos apenas que há obstáculos ou
que ocorreu uma interferência
em nossas atividades. O Conselho
julgará o caso.
Pergunta - Vocês receberam dos
governos listas de locais a serem
inspecionados?
Blix - Não. Temos uma boa idéia
dos locais aos quais iremos. Existem ao todo cerca de 700 locais a
serem inspecionados. Alguns deles foram destruídos em 1998, e as
imagens que obtivemos por satélite nos mostraram reconstruções. Vamos procurar guardar sigilo, vamos trabalhar sem dar avisos prévios. É por isso que até
mesmo meia hora de atraso terá
sua importância. Em meia hora,
não é possível esconder uma arma volumosa ou uma máquina
de grande porte, mas documentos ou tubos de ensaio, sim.
Pergunta - Os inspetores dispõem de novos meios de verificação?
Blix - Sim, os instrumentos foram aperfeiçoados. Veja esta imagem de Bagdá obtida via satélite.
No passado, essas imagens tinham uma resolução de dez metros. Agora ela foi reduzida para
65 centímetros. E esse instrumento pode ser comprado no mercado. A técnica de análise de amostras também avançou. A análise
de amostras de terra, ar, folhas ou
areia pode revelar a presença de
substâncias químicas, mesmo
quando feita com quantidades ínfimas.
Pergunta - O que o sr. espera para
o próximo dia 8 de dezembro?
Blix - O Iraque será obrigado a
declarar seus programas e suas
armas de destruição em massa,
além dos programas que afirma
que têm usos civis, mas que
abrangem os setores químico,
biológico ou nuclear. No que diz
respeito às armas de destruição
em massa, espero que os iraquianos procurem em seus estoques e
depósitos e que as descrevam.
Eles disseram que não têm armas de destruição em massa.
Fontes dos serviços de inteligência dos EUA, do Reino Unido e da
França estão convencidos de que
existe alguma coisa. O Iraque terá
de olhar com muito cuidado e declarar qualquer coisa que tiver.
Nós vamos examinar suas declarações e muitas outras. Atualmente, não temos provas de que
Bagdá possua armas de destruição em massa. Mas muitos elementos nos levam a não poder
descartar a possibilidade de que o
país possua mísseis Scud, esporos
de antraz e outras coisas.
Tradução de Clara Allain
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