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VENEZUELA
Segundo diretor de instituto de pesquisa, eleitorado de classe baixa, 78% dos votantes, ignora propostas
Eleitor vota sem conhecer Constituição
do enviado especial a Caracas
O eleitorado venezuelano, que
votou ontem a nova Constituição,
simplesmente a desconhece. A vitória do "sim", apontada pelas
pesquisas, é exclusivamente mais
uma vitória política e pessoal do
presidente Hugo Chávez.
O grau muito precário de conhecimento sobre o texto constitucional submetido a referendo
foi detectado pelas pesquisas do
Datanálisis, o mais conhecido instituto de opinião do país.
Seu presidente, José Antonio Gil
Yepes, assinala que Chávez tem
um prazo relativamente curto, de
um a dois anos, para responder às
expectativas que despertou. Caso
contrário a tendência é de queda
de sua popularidade, hoje refletida num índice de aprovação de
69%. Eis a entrevista.
Folha - Qual o conhecimento
que o eleitorado venezuelano
tem do projeto de Constituição?
José Antonio Gil - O grau de conhecimento é baixíssimo. Os segmentos D e E, 78% do eleitorado,
nada sabem sobre o conteúdo da
Constituição. Fundamentam o
"sim" e o "não" no fato de gostar
ou não do presidente Chávez.
Folha - É difícil acreditar que
não se tenha a menor idéia.
Gil - Ao insistirmos, o eleitor
pesquisado evoca apenas dois temas: maior direito territorial às
populações indígenas, o que para
as pessoas não é bom nem ruim, e
a mudança do nome do país -de
"República da Venezuela" para
"República Bolivariana da Venezuela"-, à qual 60% se opõem
porque acreditam que perderão
tempo e dinheiro para trocar os
seus documentos em que o nome
do país está impresso.
Folha - As pesquisas demonstram algum conhecimento específico sobre a ampliação dos
direitos sociais?
Gil - A questão aparece basicamente nos segmentos A e B. Eles
evocam a existência de uma economia informal que absorve 53%
da mão-de-obra. Somados os
18% de desempregados, tem-se
que apenas 29% dos venezuelanos pagam impostos. É impossível fazer gastos sociais com uma
parcela tão pequena de contribuintes. Tais investimentos entram em colapso com qualquer
queda no preço do petróleo (o
país é grande produtor de petróleo, que responde por 76,8% das
exportações). Mas o argumento é
de pouquíssimos eleitores.
Folha - Quais os valores que
Chávez representa?
Gil - O presidente é para os venezuelanos uma esperança de
mudança, uma revanche contra
40 anos de poder dividido entre
os partidos tradicionais, a Ação
Democrática e o Copei, uma resposta à ineficiência nos gastos públicos e à corrupção.
Folha - E o que evocam os que
votaram "não"?
Gil - Essa parcela da população
acredita que Chávez e os constituintes nada fizeram contra o desemprego, não atraíram investimentos privados e não resolveram os problemas da educação,
da saúde, da democracia e da segurança pública.
Folha - Onde se concentra a
maior resistência a Chávez?
Gil - Entre os mais jovens e os
mais ricos (só 34% de "sim" nas
classes A e B). As mulheres registram uma adesão ao "sim" em dez
pontos menor que os homens.
Folha - É inédita a linguagem
utilizada por Chávez, de vingança contra os privilegiados e em
favor de uma melhor distribuição das riquezas nacionais?
Gil - Não. Essa postura é tradicional no discurso da oposição há
pelo menos duas décadas. Chávez
apenas a sintetizou, mas com a
vantagem de ser militar e, portanto, um personagem externo ao establishment partidário.
Folha - Sua imagem tende a
piorar ou a melhorar ainda
mais?
Gil - O índice de aprovação do
presidente, que obteve há um ano
56% dos votos, chegou a 91% em
fevereiro. Está agora em 69% de
ótimo ou bom. Mas é uma taxa de
aprovação muitíssimo frágil. Ela
se fundamenta na expectativa do
que o governo pode fazer e não na
avaliação daquilo que está sendo
feito. O presidente dispõe agora
de um ano e meio ou dois anos
para ser bem-sucedido em frentes
complicadas: criação de emprego
e investimentos privados, saúde,
educação e segurança pessoal.
Mas a Venezuela não tem meios
para em tão pouco tempo investir
tudo o que deveria nesses setores.
Folha - Chávez pode ser um fenômeno efêmero?
Gil - É um fenômeno com pavio
muito curto. Gerou expectativas
que serão objeto de cobrança no
curto prazo. E Chávez não poderá
pôr a culpa nos partidos, na burocracia ou no Judiciário, como seus
antecessores. Ele hoje encarna sozinho a imagem do poder.
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