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"Paraguai não pode esperar pelo Mercosul", diz vice
Principal pré-candidato governista, Luis Castiglioni defende acordo com EUA
Vice-presidente, conhecido em Assunção como "homem dos Estados Unidos", foi convidado a fazer visita ao Brasil
RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL A ASSUNÇÃO
O vice-presidente do Paraguai, Luis Castiglioni, 44, afirmou que vai buscar um acordo
comercial com os EUA se for
eleito presidente no ano que
vem. "A burocracia da negociação bloco a bloco com o Mercosul é muito lenta e o Paraguai
não pode esperar", disse.
Castiglioni é o favorito a ser o
candidato do Partido Colorado
nas eleições de abril de 2008,
segundo pesquisa divulgada
ontem pelo jornal "Última Hora", de Assunção. Entre cinco
pré-candidatos, ele tem 39,6%
da preferência.
Engenheiro civil e empresário da construção, Castiglioni é
chamado em Assunção de "homem dos Estados Unidos".
Além de apoiar um acordo com
os EUA, que poderia implicar a
saída paraguaia do Mercosul,
ele defendeu a presença de tropas americanas no país até o final do ano passado.
A polêmica é tanta que, há
dois meses, a embaixada americana emitiu comunicado dizendo que não tinha candidato.
O jovem político contou à reportagem da Folha que foi convidado pelo vice-presidente
brasileiro, José Alencar, para
visitar o Brasil em março. O
convite foi feito pessoalmente
pelo secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães, em Assunção.
O governo brasileiro ainda
não convidou o principal rival
do Partido Colorado e favorito
nas pesquisas, o ex-bispo esquerdista Fernando Lugo, 55.
Sua bandeira é exigir aumento
da tarifa da energia elétrica excedente de Itaipu que o Paraguai vende ao Brasil.
Castiglioni está no Partido
Colorado desde 1979. O único
obstáculo à sua candidatura é a
vontade do presidente, Nicanor Duarte Frutos, de aprovar
uma emenda constitucional
que permita a reeleição. Leia
trechos da entrevista que Castiglioni concedeu à Folha.
FOLHA - O favorito em todas as
pesquisas eleitorais é o ex-bispo Fernando Lugo. À Folha, ele disse que
podem impedir sua vitória. Ele pode
ser o próximo presidente?
LUIS CASTIGLIONI - Neste momento, ele tem um impedimento constitucional. A resposta de Sua Santidade o papa
Bento 16 diz que ele continua
sendo bispo, padre, e nossa
Constituição é clara em dizer
que nenhum ministro de nenhuma religião pode ser candidato.
FOLHA - Se o senhor for eleito,
quais seriam suas prioridades?
CASTIGLIONI - Levar o Paraguai a
um caminho de desenvolvimento sustentável. Não quero
apenas crescimento, porque ele
não resolve os problemas sociais. Quero abrir o Paraguai ao
mundo, a todo o mundo. Estive
na China, no Oriente Médio,
em Israel, no México, nos Estados Unidos, na Alemanha, chefiando missões comerciais.
FOLHA - E o Mercosul?
CASTIGLIONI - Temos que aperfeiçoar o Mercosul. Precisamos
levar em conta as enormes diferenças entre um gigante como
o Brasil e nosso país. Paraguai e
Uruguai não chegam a 1% da
economia do Mercosul. Não
queremos uma integração solidária, não queremos caridade.
Precisamos de uma integração
justa. Não queremos ser um
problema. Quero interação
com o Brasil. Confio no Brasil
como um líder positivo, que faça o Mercosul se relacionar
com todo o mundo.
FOLHA - O senhor já chamou os
fundos estruturais do Mercosul de
"migalhas". Continua a achar isso?
CASTIGLIONI - Isso mudou. Notamos que Lula tem um interesse genuíno de superar as assimetrias. É um sinal concreto,
me entusiasma. Mas o Mercosul continua sofrendo com as
barreiras extratarifárias, que
bloqueiam a entrada no Brasil
de nossos poucos produtos
com valor agregado. Nossos inseticidas, por exemplo, que têm
ISO 9001, não conseguem entrar no Brasil há 13 anos.
FOLHA - O Tratado de Itaipu é um
grande tema na campanha eleitoral. Qual é a sua opinião?
CASTIGLIONI - Estão usando esse
tema como um clichê, de forma
eleitoreira. Não dizem à população que qualquer mudança
precisa da aprovação das duas
partes. Fernando Lugo prometeu mudar o tratado, mas ele
não pode. Tem que falar com o
Brasil primeiro. Precisamos tirar mais benefícios de Itaipu, e
confiamos que nosso sócio, o
Brasil, tenha abertura necessária para entender e ir negociando por partes. É o que podemos
dizer. O resto é demagogia e populismo.
FOLHA - O senhor defende acordos
bilaterais com os EUA.
CASTIGLIONI - A assinatura de
um tratado por um governo dito de esquerda, do presidente
Tabaré Vázquez, do Uruguai,
com a economia mais importante do mundo, os EUA, é um
exemplo. Eu apóio completamente o Tabaré [o governo
uruguaio está negociando um
acordo de investimentos e comércio com os EUA]. Se for
presidente, farei o que favoreça
o povo paraguaio.
FOLHA - Se o senhor for presidente,
o Paraguai também buscará acordo
com os EUA?
CASTIGLIONI - Sim. Com certeza.
Mas sem prejudicar o Mercosul. Quero deixar isso claro. Espero que o Mercosul se aperfeiçoe tanto que no futuro nós negociemos com todos os blocos
econômicos, com a Europa,
com o Nafta. Enquanto persistem os problemas de integração, as assimetrias não solucionadas, acho que os países menores, menos desenvolvidos,
têm o direito de procurar esse
tipo de acordo.
FOLHA - Mas o Mercosul está tentando fazer acordos com esses blocos. O Paraguai não pode esperar?
CASTIGLIONI - Nós vemos que o
povo não pode esperar. Não é
ideologia. É o futuro de nossas
nações. Gosto que os EUA vejam o Brasil como líder de uma
revolução energética. Comemoramos porque o Paraguai se
beneficia como sócio. Mas não
podemos esperar pela prosperidade -38% de nossa população é pobre. Não dá para esperar as burocracias, a lentidão,
os discursos. Precisamos mercados e bons preços para os
nossos produtos.
FOLHA - O senhor ofereceria espaço para uma base militar americana
no Paraguai?
CASTIGLIONI - Não, de jeito nenhum. Quero desmentir categoricamente as mentiras das
agências de notícias que dizem
que temos uma base militar no
Chaco paraguaio. Os militares
que vieram fizeram exercícios
com os paraguaios, assim como
nosso Exército faz exercícios
com os brasileiros e os argentinos. Tivemos 450 militares
americanos aqui, em grupos de
12 ou 15. Nem chegaram juntos!
FOLHA - O Partido Colorado está há
60 anos no poder e é acusado há
anos de muita corrupção. O que fazem os colorados para combatê-la?
CASTIGLIONI - Começamos um
processo de mudança, mas falta
muito o que fazer. Luto por
uma depuração no partido.
NA INTERNET - Leia a íntegra da entrevista em
www.folha.com.br/070471
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