São Paulo, sexta-feira, 17 de agosto de 2007

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Uma devastadora bofetada da natureza

SANTIAGO PEDRAGLIO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A região do Peru mais atingida pelo terremoto da quarta-feira é a de Ica, com cerca de 300 mil habitantes, cuja capital fica cerca de 300 quilômetros ao sul de Lima. Trata-se de uma região tradicionalmente vinícola que vem tomando parte no boom de exportação agrícola que está se desenvolvendo em boa parte da costa peruana nos últimos anos.
Em Ica, produz-se algodão, aspargos, páprica e alcachofras. Nos últimos anos, devido à demanda por mão-de-obra rural, surgiu uma forte migração de pessoas vindas da serra localizada no centro-sul do Peru, especialmente de regiões muito pobres como Ayacucho e Huancavelica. De acordo com jornalistas que foram à região, a cidade mais atingida foi Pisco, que parece ter sofrido um bombardeio. Além de promover o desenvolvimento da economia agrícola, como o restante do departamento, Pisco é também um porto, pequeno mas muito ativo. De acordo com as mais recentes informações, mais de 200 das cerca de 500 mortes causadas pelo terremoto teriam acontecido na cidade, de acordo com números divulgados às 16h, horário local; o total pode crescer substancialmente, à medida que as equipes de resgate procedam ao seu trabalho nas edificações demolidas.
O governo do presidente Alan García reagiu com rapidez. Poucas horas depois do abalo, ele falou ao país pedindo calma e anunciando que estavam sendo tomadas medidas urgentes de socorro. O governo criticou severamente o fato de que as comunicações telefônicas da região tenham sido interrompidas pelo abalo. A ministra dos Transportes e Telecomunicações, Verónica Zavalla, anunciou que havia exigido às operadoras de telefonia que explicassem os motivos do colapso, e afirmou que providências seriam tomadas quanto ao assunto o mais rápido possível.
Ainda assim, é evidente que, apesar dos esforços do governo, o desafio gerado pela emergência è superior às suas forças. A rodovia Panamericana Sur, a via através da qual deve ser deslocado o maior volume da assistência, no momento está bloqueada devido a rachaduras e deslizamentos de terra. A pista de aterrissagem do pequeno aeroporto de Pisco também sofreu avarias, o que só permite o pouco de helicópteros e de aviões de pequeno porte. A ajuda está chegando com lentidão excessiva, apesar da proximidade entre a região e a capital; em tempos normais, a viagem de Lima a Ica demora cerca de três horas e meia.
A população atingida está solicitando urgentemente ataúdes, água e cobertores. Os hospitais estão superlotados. A população está desolada, mas sua atitude é positiva e milhares de pessoas estão ajudando no trabalho de resgate.
O efeito político do acontecido sobre o governo de Alan García é impossível de prever. A rápida reação inicial provavelmente será reconhecida pela população, mas os habitantes da região atingida e do país avaliarão se o governo está de fato comprometido para com um plano de reconstrução, e se o implementará imediatamente.
O Peru é uma área muito propensa a movimentos sísmicos. Um dos principais sismologistas do mundo, o peruano Julio Kuroiwa, afirma que devemos aprender a conviver com esses efeitos da natureza. De 2001 para cá, o país passou por 11 abalos sísmicos consideráveis, quatro dos quais acima dos 6.5 pontos na escola Richter. Não há como evitar terremotos ou minimizar seus efeitos. É preciso desenvolver uma capacidade preventiva que, infelizmente, não é cultivada de maneira rigorosa ou sustentada.


SANTIAGO PEDRAGLIO é analista político, colunista do jornal "Peru 21"


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