São Paulo, domingo, 17 de setembro de 2006

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Dar Yasin/Associated Press
Em discurso na terça, papa usou o termos 'jihad' e 'guerra santa' ao dizer que a violência é 'incompatível com a natureza de Deus'


Bento 16 "lamenta" ter ofendido o islã

Texto do Vaticano diz que palavras do papa foram mal compreendidas, mas muçulmanos exigem "desculpa pessoal"

Em discurso na terça-feira, pontífice usou os termos "jihad" e "guerra santa" ao afirmar que a violência é incompatível com Deus

DA REDAÇÃO

Em um comunicado emitido ontem, o Vaticano diz que o papa lamenta ter ofendido os muçulmanos em um discurso proferido na terça-feira passada, em sua Alemanha natal, e que provocou protestos em todo o mundo islâmico.
"O papa lamenta que algumas passagens de sua fala possam ter soado ofensivas às sensibilidades dos fiéis muçulmanos", diz o comunicado do secretário de Estado do Vaticano, cardeal Tarcisio Bertone.
No discurso, o papa se referiu à crítica feita ao profeta Maomé, no século 14, pelo imperador Manuel 2º, o Paleólogo (1391-1425), que afirmou que todas as coisas que Maomé trouxe foram más, "como sua ordem para espalhar pelo medo da espada a fé que pregava". Usando os termos "jihad" e "guerra santa", o papa afirmou que a violência era "incompatível com a natureza de Deus".
O documento diz ainda que Bento 16 confirmou "seu respeito e estima por aqueles que professam a fé islâmica" e espera que suas palavras sejam entendidas "em seu verdadeiro sentido". Diz ainda que o sumo pontífice "não teve intenção nenhuma" de apresentar as opiniões de Manuel 2º sobre o islã como sendo suas.
Em reação, o egípcio Mohammed Abib, líder da Irmandade Muçulmana, afirmou que isso não era suficiente e queria uma "desculpa pessoal". "Sentimos que ele cometeu um grave erro contra nós e que esse erro somente será removido por meio de uma desculpa pessoal."
Mas a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e outros políticos do país defenderam os comentários do papa. "Foram um convite ao diálogo entre as religiões", disse.
O "New York Times" afirmou em editorial que o papa deve "uma profunda e persuasiva" desculpa pelas citações usadas em seu discurso. "O mundo ouve com muita atenção as palavras de qualquer papa. E é trágico e perigoso quando provocam dor, seja de forma deliberada ou displicente."
Diplomatas do Vaticano afirmam que Bento 16 pode ter embaralhado seu papel de papa, que exerce desde abril de 2005, com suas antigas atribuições de teólogo e líder da Congregação pela Doutrina da Fé, ainda como cardeal Joseph Ratzinger.

De volta às Cruzadas
Furiosos, líderes muçulmanos devolveram ao Ocidente cristão as alegações de uso de violência. "Como o papa pode sugerir que os muçulmanos são os criadores do terrorismo no mundo, enquanto são os seguidores da cristandade que agrediram os países do mundo islâmico?", perguntou o clérigo saudita Salman al-Odeh. "Quem atacou o Afeganistão e quem invadiu o Iraque?"
Na Líbia, a Instância Geral de Assuntos Religiosos disse que o "insulto nos leva de volta à era das Cruzadas contra os muçulmanos, lideradas pelos políticos e religiosos ocidentais".
A reação contra as palavras do papa colocou em dúvida uma viagem que ele fará à Turquia em novembro. O premiê turco, Tayyip Erdogan, afirmou ontem que Bento 16 deveria "retirar" os comentários que fez sobre o islã. Já o jornal turco "Vatan" cita o líder do governista Partido da Justiça e do Desenvolvimento, que afirmou que o papa entrará na história na mesma categoria de líderes como Hitler e Mussolini.
O Marrocos convocou de volta seu embaixador no Vaticano em protesto. O Egito chamou o representante da Santa Sé no país para explicar as declarações do papa.
Na Índia, no Estado de maioria muçulmana da Caxemira, a polícia prendeu cerca de 20 manifestantes no segundo dia de protestos contra as declarações de Bento 16. Na Cisjordânia, homens armados atacaram quatro igrejas em Nablus e uma na faixa de Gaza. Não houve feridos em nenhum dos casos.
Em Basra, no Iraque, depois que uma igreja foi atacada, o governo pediu aos muçulmanos que se sentiram ofendidos que não se voltem contra a pequena minoria cristã.


Com agências internacionais

O papa lamenta que algumas passagens de sua fala possam ter soado ofensivas às sensibilidades dos fiéis muçulmanos

VATICANO em comunicado oficial

Sentimos que ele cometeu um grave erro contra nós e que esse erro somente será removido por meio de uma desculpa pessoal

MOHAMMED ABIB líder da Irmandade Muçulmana

[Os comentários do papa] foram um convite ao diálogo entre as religiões

ANGELA MERKEL chanceler (premiê) da Alemanha



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