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COMENTÁRIO
Manifestações antiguerra em países árabes foram ridículas
ROBERT FISK
DO "THE INDEPENDENT", EM BEIRUTE
Poderia algo ser mais ridículo
do que as manifestações contra a
guerra promovidas em países árabes? Um milhão de britânicos
participaram do protesto em
Londres, mais de meio milhão de
espanhóis fizeram o mesmo, em
Madri, e 200 mil, em Paris e Nova
York. E no Cairo? Apenas 600
egípcios saíram às ruas para protestar contra uma invasão americana de seu país irmão, o Iraque.
E o fizeram cercados por 3.000
policiais. A título de contraste, vale notar que 3.000 bravos israelenses, em Tel Aviv, demonstraram
seu repúdio à guerra.
Qual é o problema dos árabes?
Afinal, são eles, e só eles, que provavelmente vão sofrer na invasão
americana de sua terra. Eles, e
apenas eles, têm a capacidade de
compreender que, como declarou
o secretário de Estado americano,
Colin Powell, essa aventura militar americana tem por objetivo
mudar o mapa do Oriente Médio.
No entanto, confrontados com
a catástrofe, os árabes estão mudos. Seus líderes podem concordar com a população, mas não
deixam que a população o diga.
O presidente Hosni Mubarak,
do Egito, já deixou claro que há
muito pouco que ele pode fazer
para refrear o presidente Bush. O
rei Abdullah, da Jordânia, disse
que não há quase nada que os árabes podem fazer para evitar a
guerra. O resultado é que, cada
vez mais, os árabes se perguntam
para quê servem seus líderes. Parece que os reis e os presidentes
do mundo árabe concordam com
seu povo, mas não querem que
este expresse as opiniões que também são deles.
Uma coisa é Mubarak criticar os
EUA, mas outra, é egípcios comuns fazerem o mesmo. É verdade que 200 mil sírios se reuniram
em Damasco contra a guerra. Mas
ninguém protesta na Síria a não
ser com a aprovação do governo
-o que significa que o protesto
supostamente popular foi organizado pelo Partido Baath sírio.
Pelo menos, porém, os sírios
não carregaram retratos de Saddam Hussein, como fizeram seus
vizinhos em Beirute. Sim, pois há
um problema especial que acontece nas capitais árabes: cada vez
mais, a oposição árabe à guerra se
funde ou se confunde com o
apoio árabe ao ditador iraquiano.
No Cairo, há duas semanas, fotos de Saddam levadas num ato
antiguerra prejudicaram a contundência da manifestação. Em
Beirute, homens que combateram em lados opostos na guerra
civil libanesa se uniram para
opor-se à invasão do Iraque pelos
EUA, mas foram aviltados pelo
número muito maior de libaneses
que saíram em apoio a Saddam.
O líder do Hizbollah, Hassan
Nasrallah, criticou os árabes pelo
silêncio que vêm mantendo e os
exortou a rever sua atitude em relação à Europa. É interessante observar que essa posição foi adotada pelo homem que lidera uma
organização cujos grupos satélites
mantiveram reféns dezenas de
ocidentais no Líbano, nos anos
1980. Ele lamentou que a "maior
manifestação muçulmana da história" -o encontro de 2 milhões
de muçulmanos em Meca, para o
Hajj- não tivesse adotado o slogan "Morte à América" ou "Não à
Guerra". Acusou ""certos" regimes árabes de apoiar a guerra ou
aprová-la em segredo. Todos sabemos quais são esses regimes.
Tradução de Clara Allain
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