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Convulso, Paquistão vota hoje
Eleição legislativa, a mais conturbada na história recente do país, ocorre em meio ao extremismo e ao caos político
Metade dos 160 milhões de paquistaneses está apta a votar; opositores prevêem fraude maciça, mas ditador promete transparência
IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL AO PAQUISTÃO
Sob um rígido esquema de
segurança para tentar evitar
atentados e sob acusações de
que o governo promoverá uma
fraude generalizada, o Paquistão realiza hoje as eleições parlamentares mais conturbadas
de sua história recente. Metade
dos 160 milhões de habitantes
está apta a votar.
Não será o caso de Mohammad Anwar, 30, que ontem ajudava a carregar as urnas de
plástico transparente para uma
zona eleitoral de Rawalpindi.
"O presidente vai para a TV e
diz que não vai ter fraude, mas
eu duvido. Vou aproveitar o feriado", diz ele.
De fato, até a escolha do material das urnas parece feita para ecoar o mantra do ditador
Pervez Musharraf: "As eleições
serão transparentes". Os dois
principais partidos de oposição, o PPP (Partido do Povo Paquistanês) e a PML-N (grupo
do ex-premiê Nawaz Sharif na
Liga Muçulmana do Paquistão)
prevêem fraudes maciças.
Estão em jogo 342 assentos
da Assembléia Nacional, similar à Câmara dos Deputados no
Brasil, e 728 nas Assembléias
Provinciais, equivalente ao Legislativo estadual. A última
eleição ocorreu em 2002.
O pleito é crucial porque,
após anos de diversas crises, o
Paquistão está em convulsão.
No ano passado, Musharraf
usou poderes ditatoriais para
intervir no Judiciário, o qual
acusava de querer governar às
avessas, ao contestar ações do
Executivo sistematicamente.
Em novembro, suspendeu a
Constituição e declarou estado
de emergência, numa situação
que só foi agravada pelo assassinato da líder oposicionista
Benazir Bhutto, recém-chegada do exílio.
O governo diz que Benazir foi
assassinada por radicais islâmicos, os mesmos que agora
ameaçam a eleição com novos
atentados. Anteontem, 46 pessoas morreram com a explosão
de um carro-bomba em um comitê do PPP, partido de Benazir, no norte do país. Ontem um
candidato e três simpatizantes
foram feridos num ataque com
granada em uma região tribal.
Em Rawalpindi, a presença
policial era ostensiva ontem.
Comboios com policiais e militares fortemente armados desfilam ao lado de carros com
bandeiras de partidos. Na capital, a vizinha Islamabad, não há
uma esquina importante que
não esteja policiada. Em todo o
país, são 81 mil soldados e 47
mil paramilitares para vigiar 64
mil zonas eleitorais.
"Eu espero que dê tudo certo,
mas estamos prontos para o
pior", diz Ahmad Nizam, chefe
da seção de uma escola masculina em Rawalpindi. Como nas
mesquitas, mulheres e homens
votam em locais distintos.
Do lado de fora das seções, há
tendas montadas para que os
partidos façam a boca-de-urna
oficial. Em tese, cidadãos não
podem fazer propaganda num
raio de 400 metros de cada seção. O voto não é obrigatório, e
a abstenção já chegou a 60% em
eleições passadas. "Se isso
acontecer de novo, prevejo
muitas dificuldades para quem
ganhar dizer que seu direito é
legítimo", diz o comentarista
político Pervaiz Narum.
Governabilidade
A vitória da oposição, apontada em pesquisas feitas por
institutos estrangeiros, é vista
como natural. Analistas apontam a possibilidade, contudo,
de um acordo de governabilidade, já que Musharraf ainda tem
o apoio do Exército -o qual comandou até o fim do ano passado, mas que dá sinais de o estar
abandonando. E sem militares
ninguém governa o Paquistão,
país que tem armas nucleares.
Mas, na hipótese de não haver fraude e as pesquisas estarem certas, o governo tem alternativas. A PML-Q, pró-Musharraf, investiu tudo na campanha na principal Província, o
Punjab, que tem 183 das 342 cadeiras do Parlamento. Se ganhar bem lá, há a possibilidade
de formar o governo em aliança
com partidos menores.
Mas essa hipótese já é vista
pela oposição como prova de
fraude. "Vamos às ruas se perdermos", disse Sharif. Já Musharraf disse que iria "proibir"
contestações. E sempre há o
elemento radical islâmico, literalmente explosivo. O circo está armado.
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