São Paulo, quinta-feira, 18 de março de 2004

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COMENTÁRIO

Espanhóis não baixaram a cabeça diante do terrorismo

OTÁVIO DIAS
DA REDAÇÃO

A seriedade dos fatos ocorridos na Espanha tem suscitado intenso debate e muita confusão. Pode ser útil clarear alguns pontos.
Em primeiro lugar, parte dos espanhóis mudou seu voto na última hora porque o governo de José María Aznar foi irresponsável ao culpar rapidamente o ETA -e persistir no erro-, quando, pouco depois, surgiram indícios de que os atentados provavelmente foram cometidos pela Al Qaeda ou por extremistas ligados à rede.
Ainda que o governo não tenha agido inteiramente de má-fé, mostrou-se despreparado. Isso ficou claríssimo quando o candidato a premiê conservador, Mariano Rajoy, disse à rede BBC ter "convicção moral" de que o ETA era o autor. Como eleger um premiê com tal "convicção moral"?
É difícil saber qual seria o impacto dos ataques na eleição caso o governo Aznar tivesse admitido, desde o início, a hipótese de uma ação da Al Qaeda e houvesse apresentado uma defesa firme de sua política de alinhamento aos EUA. Teria havido um sério debate, mas a credibilidade do governo não teria sido tão abalada.
Em segundo lugar, não é verdadeiro dizer que a maioria dos espanhóis votou com medo do terrorismo e por uma política menos incisiva de combate ao terror islâmico, como se pretendesse fugir da "guerra contra o terrorismo".
Nenhum governo de nenhum país perderá votos por combater energicamente o terrorismo, pois essa é uma questão de vida ou morte. Essa maioria mostrou que acredita que a guerra contra o terrorismo não tem -ou melhor, não tinha- nada a ver com a Guerra do Iraque, apesar do presidente George W. Bush tê-la vendido, com apoio de Aznar, como estando na "linha de frente" do combate ao terror islâmico.
O regime de Saddam Hussein era condenável e merecia ser contido, mas, pelas evidências disponíveis, não possuía ligações com a Al Qaeda. Segundo alguns dos mais sérios estudiosos do tema, a invasão do Iraque foi uma distração que não trouxe avanços no combate ao terror, pois complicou as coisas ao atiçar o sentimento antiamericano e antiocidental.
Uma ressalva: agora não é possível abandonar o Iraque. O máximo que pode ser feito é aumentar o papel da ONU no pós-guerra.
A mensagem da maioria na Espanha foi simples: ela quer -ainda que, de certa forma, simbolicamente- separar a guerra contra o terrorismo da Guerra do Iraque. Mas, de maneira alguma, baixou a cabeça diante da Al Qaeda e dos extremistas islâmicos ou se rendeu a seus métodos terroristas.


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