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"Teremos uma boa conversa com Teerã"
PATRICE CLAUDE
DO "LE MONDE", EM BAGDÁ
O embaixador dos EUA no Iraque, Zalmay Khalilzad, que se
prepara para discutir com autoridades iranianas eventuais soluções para acabar com a onda de
violência sectária no Iraque, reconhece que os EUA cometeram erros em sua campanha militar no
país, mas diz não crer que a guerra civil seja inevitável.
Nascido no Afeganistão, Khalilzad ressalta em entrevista que
conversar com os iranianos -algo que poderá fazer no idioma deles- não é novidade para ele.
Uma das convicções que levará
para as conversas será a de que a
paz no Iraque é impossível sem
que os principais grupos religiosos e políticos participem da criação do novo governo.
Pergunta - Acusada pelo presidente George W. Bush de armar alguns setores insurgentes e de infiltrar o poder em Bagdá, a República
Islâmica do Irã acaba de aceitar discutir a questão do Iraque com os
EUA. Isso é boa notícia?
Zalmay Khalilzad -Fizemos a
oferta de discutir com os iranianos, atendendo a pedidos de vários dirigentes iraquianos. Estamos dispostos a conversar com
todos os países vizinhos do Iraque, incluído o Irã. Mas sejamos
claros: não se trata de negociar o
futuro do Iraque com eles. Temos
algumas preocupações quanto à
política que eles adotam e ao papel que eles pretendem desempenhar com relação ao Iraque. Vamos conversar com eles, estamos
abertos a uma discussão sobre todas as questões relativas a esse
país. Eles têm as questões deles,
nós temos as nossas, vamos falar
delas. Não é a primeira vez que faço isso com os iranianos.
Pergunta - O senhor discutiu com
eles sobre o Afeganistão, país do
qual o sr. é originário e ao qual retornou como embaixador dos EUA
até 2005. Mas o que o senhor poderá oferecer ao Irã, em troca da suspensão dessa ou daquela das ações
iranianas no Iraque?
Khalilzad - [Risos] Não vou lhe
dizer isso aqui. Teremos uma boa
conversa, pode ter certeza. Eles
me conhecem, sabem de onde venho, falo sua língua fluentemente.
Pergunta - Três anos após a invasão do Iraque pelas tropas americanas, as mortes são mais freqüentes do que nunca e o país aparenta
estar à beira de uma guerra civil.
Que erros os EUA cometeram?
Khalilzad - Não acredito que a
guerra civil seja inevitável. Reconheço que a segurança é um problema. Sem dúvida cometemos
erros; não somos perfeitos. Reconheço que, depois de três anos, a
polarização entre setores religiosos aumentou. Nós viemos para
cá, derrubamos o regime de Saddam Hussein e somos responsáveis por muitas coisas. Mas, se nos
retirássemos agora, se disséssemos "OK, vamos voltar para casa", não há dúvida nenhuma de
que as perspectivas de uma guerra intercomunitária aumentariam, correndo o risco de extravasar as fronteiras do Iraque.
Pergunta - Mas o que fazer a partir de agora? Com toda essa matança diária, já não é tarde demais?
Khalilzad -Não creio que seja.
Acredito que, se os dirigentes iraquianos conseguirem construir o
governo de unidade nacional que
esperamos deles e cuja idéia eles já
aceitam, se os temores da minoria
sunita forem levados em conta e
os direitos da maioria xiita forem
respeitados, teremos uma boa
chance de evitar o pior. Aqui no
Iraque estamos engajados num
processo duplo: a construção de
um Estado e de uma nação. O Estado baathista [que foi regido por
Saddam Hussein] foi destruído
por nós, com todas as suas instituições. E, apesar de o Iraque ser
um país antigo, temos aqui três
grandes comunidades diferentes
com as quais é preciso fazer uma
nação. Acredito que a solução
melhor seja a federal, prevista na
nova Constituição.
Pergunta - Como fazer para incluir nesse processo os árabes sunitas, que rejeitam essa Constituição
e hoje formam a essência da insurreição com a qual se confrontam as
tropas americanas?
Khalilzad - É preciso distinguir
entre os terroristas jihadistas de
Abu Musab al Zarqawi [chefe da
Al Qaeda no Iraque], os baathistas
que desejam a volta do antigo regime e os grupos armados que se
apresentam como a "resistência
nacional". Com os dois primeiros
não há nada a negociar -nós os
caçamos. Com os outros, já começamos a debater. Mas eles são
muitos e estão divididos. Nós lhes
propomos depor suas armas e ingressar no processo político.
Pergunta - O senhor não teme
que a maioria xiita, que ganhou as
eleições e à qual vocês agora pedem que abra um espaço maior para os sunitas nas instâncias governamentais acabe por também se
revoltar contra forças americanas?
Khalilzad - Sempre existe o perigo de alguns setores fazerem um
cálculo equivocado. Os sunitas,
que de modo geral são mais instruídos e prósperos do que os xiitas, têm receios legítimos. Nós
lhes oferecemos a mão. Mas digo
a eles: "Vocês não podem ter um
pé na violência armada e outro no
processo político -têm que escolher ou um ou outro".
Pergunta - Seus dois antecessores no cargo (Paul Bremer e John
Negroponte) não falavam assim. O
que provocou essa virada?
Khalilzad - Não vou julgar o que
os outros fizeram. Insisto apenas
sobre esse ponto: assim como não
é possível no Afeganistão, não é
possível construir aqui uma nação e edificar uma ordem democrática sólida se uma ou outra das
comunidades principais do país
não participar do processo. A alternativa é uma guerra sem fim,
algo que joga a favor do terrorismo. As partes envolvidas precisam fazer concessões, e acredito
que estão prontas para isso.
Tradução de Clara Allain
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