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Coalizão heterogênea faz de Lugo mistério
Aliança Patriótica para a Mudança, que apóia favorito no Paraguai, reúne da centro-direita à esquerda antiglobalização
Temas com potencial de dividir, como privatizações, passam longe da campanha; ativistas atraem interesse de congêneres como o MST
FÁBIO VICTOR
ENVIADO ESPECIAL A ASSUNÇÃO
Para tentar pôr fim a um domínio de 61 anos do Partido Colorado no Paraguai, a oposição
montou uma coalizão tão ampla e heterogênea que tornou
uma incógnita o rumo de um
eventual governo de Fernando
Lugo, o ex-bispo católico que é
o favorito para vencer as eleições presidenciais do próximo
domingo.
Com um candidato de histórico e propostas esquerdistas, a
APC (Aliança Patriótica para a
Mudança, na sigla em espanhol) tem como principal âncora partidária uma sigla de centro-direita, o PLRA (Partido Liberal Radical Autêntico), que
indicou o vice da chapa, o médico Federico Franco.
Maior e único com experiência administrativa (em níveis
estadual e municipal), o PLRA
é um dos nove partidos da
aliança, que tem outros integrantes conservadores, como o
nanico Partido Democrata
Cristão, ao qual Lugo se filiou
só para concorrer, social-democratas, como o País Solidário, e siglas de centro, como o
Partido Encontro Nacional.
Mas reúne maioritariamente
pequenas agremiações de esquerda, caso do Partido do Movimento ao Socialismo.
Mas a amálgama ideológica
forma só uma parte da aliança,
composta ainda por tantos movimentos sociais que nem os integrantes da aliança se entendem sobre o número exato
-varia de 15 a 20.
O principal deles é o Tekojoja
(algo como "somos iguais", em
guarani; pronuncia-se "tekoyoyá"), formado há pouco mais de
um ano para dar sustentação
social à candidatura de Lugo e
que congrega grupos de sem-terra, operários, estudantes e
outros. Define-se como "claramente socialista" e trabalha para reconstruir o Paraguai, "devastado pela voracidade da globalização neoliberal".
Há espaço até para dissidentes do Partido Colorado. O Comando Juvenil Colorado é uma
das células da Juventude Patriótica para a Mudança. "Há
uma grande decepção dos jovens com o atual modelo de governo, que não corresponde às
raízes do Partido Colorado, que
tinha uma ideologia quase socialista, agrária e de prioridade
aos pobres. É uma corja corrupta, e por isso estamos com
Lugo", disse Victor Genes, presidente do grupo.
Rede regional
A diversidade de movimentos sociais atraiu o interesse de
congêneres de outros países. O
MST brasileiro tem desde o fim
de março um representante em
Assunção como observador.
Grupos de Argentina, Venezuela e Equador começam a chegar
a Assunção, suscitando reação
irada do governo -que disse
para o venezuelano Hugo Chávez "não se meter" no país.
Temas sensíveis e com potencial para rachar a coalizão,
como privatizações, passam ao
largo da campanha. A dúvida
suscitada por analistas é como
seria uma gestão com posições
internas tão díspares.
"Não há unidade na aliança.
O que os une é o desejo de tirar
o Partido Colorado do poder",
afirma o sociólogo Domingo
Rivarola, professor da Universidade Nacional de Assunção.
"Com o tamanho e a força
que tem, se o Colorado passa à
oposição e opta por uma política de confronto -contra um
governo que se iniciará sem homogeneidade nem experiência-, isso será um problema."
O analista político Alfredo
Boccia, colunista do diário "Última Hora", aponta que Lugo
tem sido até agora "um autêntico equilibrista", pois por enquanto a preocupação é ganhar
a eleição. "Como poderão governar é uma pergunta que ninguém tem interesse de responder neste momento."
Ele lembra, porém, que "diziam que isso não ia durar, mas
eles chegaram até aqui". Boccia
aposta que Lugo terá de se render ao pragmatismo. "Ele estará obrigado a uma atuação moderada, não só pelo apoio estrutural do PLRA, mas também
pela falta de história da esquerda paraguaia."
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