São Paulo, domingo, 18 de junho de 2006

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Montenegro faz reacender sentimento separatista na Europa

Separação de República que formava com a Sérvia o último resquício da antiga Iugoslávia estimula referendos que podem criar micropaíses no continente

ADRIANA MARCOLINI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O nascimento de mais um pequeno país no território da antiga Iugoslávia praticamente já teve repercussões no delicado equilíbrio dos Bálcãs e promete refletir em toda a Europa.
Com quase 700 mil habitantes e uma área de 13.812 km2 (menor que Sergipe), Montenegro conquistou a independência em referendo no último dia 21, sob a supervisão de observadores internacionais.
Ciente do precedente que pode trazer para o continente europeu o surgimento de um país por meio do instrumento legal do referendo, a União Européia fixou em 55% o percentual requerido para a maioria. Foi por um fio, mas o premiê montenegrino, Milo Djukanovic, conseguiu: com 55,4% de votos, Montenegro deixou a união de Estados que formava com a Sérvia, último resquício do que foi a Iugoslávia.
Os desdobramentos do resultado, porém, vão além. Para o professor francês Jacques Rupnik, membro da Comissão Internacional Independente sobre Kosovo, a Sérvia deverá oferecer ainda menos cooperação nas negociações internacionais para determinar o futuro de Kosovo, Província sérvia administrada pela ONU desde o fim dos bombardeios da Otan (aliança militar ocidental), em junho de 1999. "Isto poderá dificultar uma alternativa satisfatória para ambas as partes e, no limite, levar à imposição de uma solução vinda da União Européia", alerta.

Bósnia
A faísca lançada por Montenegro chegou à República Sérvia (RS), entidade que, ao lado da Federação Muçulmano-Croata, forma a Bósnia-Herzegóvina. Na semana passada, políticos nacionalistas propuseram a convocação de um referendo para decidir se a RS deve permanecer na Bósnia ou ser um país independente, o que seria uma violação ao acordo de paz de Dayton.
"A proposta não irá adiante", afirma Nicholas Whyte, responsável pela região da Europa no International Crisis Group, ONG sediada em Bruxelas especializada na análise de conflitos. Ele salienta que a RS foi construída com base no genocídio, o que é bem diferente de Montenegro. "Há ainda uma grande dose de retórica na proposta, pois este é um ano eleitoral na Bósnia", argumenta.
O ar de referendo se estendeu até a Moldova, uma ex-república soviética vizinha à Romênia. Desde a guerra civil em 1990, o país está dividido em dois: a Moldova, que goza de reconhecimento internacional, e a região separatista da Transdnístria. O sopro balcânico esquentou os ânimos dos separatistas, que já anunciaram o seu referendo em setembro. E não deve poupar a região do Cáucaso. Lá estão as "repúblicas autônomas" da Abkázia e da Ossétia do Sul, na Geórgia, que não têm reconhecimento oficial, e o território de Nagorno-Karabakh, foco de conflito entre a Armênia e o Azerbaijão.
E ainda a república russa da Tchetchênia. Na direção da Europa Ocidental está lançada a pergunta: se Montenegro pôde conquistar sua independência legitimamente, por que não o podem o País Basco, na Espanha, ou a Córsega, na França? Ao aprovar o referendo, a UE pode ter dado o sinal verde para que novos micropaíses venham a surgir no continente, justamente quando consolida sua ampliação e planeja receber futuros parceiros.


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