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Famílias ainda buscam desaparecidos
SETH MYDANS
DO "NEW YORK TIMES", EM BESLAN
Todos os dias, durante as últimas duas semanas, Zema Godzhiyeva tem se esforçado para recuperar a esperança enquanto
examina os corpos queimados do
necrotério de Beslan à procura de
seu filho de 14 anos, Roman.
E todas as vezes em que falha,
diz ela, a sensação é a de que o seu
filho morreu novamente e dia a
dia ela sente que está morrendo
com ele.
"Eu me tornei um cachorro",
diz, sentada em seu apartamento
pouco iluminado. "Depois de todos esses dias, não sinto nada.
Meu coração é como uma pedra."
Duas semanas depois de rebeldes tchetchenos terem tomado
uma escola aqui, o número de
mortos subiu para bem mais de
300 -muitos deles crianças-, e
o número dos internados em hospitais tem caído.
Mas não há cifras oficiais para o
que parece ser o destino mais difícil de todos -o pânico claustrofóbico daqueles que ainda não sabem o que aconteceu com as pessoas que mais amam.
De acordo com uma contagem
feita pelas próprias famílias, há
122 desses casos: 84 irreconhecíveis no necrotério e 38 que aparentemente não deixaram nenhum rastro, a não ser a dor.
No dia em que a escola foi tomada, Robert, 16, irmão de Roman,
se livrou de uma seqüestradora e
conseguiu escapar. Ele, também,
está se afundando sob o peso da
ausência de Roman. "Ele começou a dormir com seu pai", disse
Godzhiyeva. "Ele chama: "Roman, Roman!". E diz: "Queria que
Roman tivesse sobrevivido no
meu lugar"."
A Rússia não é um país cujo governo atenda aos lamentos dos
parentes das vítimas, e eles foram
deixados desamparados da mesma forma que os sobreviventes e
famílias de mortos dos últimos
desastres dessa nação.
Eles pedem ajuda a vários funcionários do governo; eles fazem
buscas em hospitais de cidades
distantes; vasculham restos de osso, carne e dentes que foram deixados de lado no necrotério como
se fossem bandejas de lembrancinhas de festa.
"Lá é o inferno", disse Aza Pukhayeva, que comanda sua família na busca de sua sobrinha de 12
anos, Madina. "Há só restos queimados lá. Não dá para saber se é
um menino ou menina. Alguns
protegem a cabeça com as mãos,
como bebês num berço. Nós examinamos cada fragmento, cada
dedo, os cabelos, os dentes."
Madina usava um anel de ouro e
tinha uma mancha sobre seu olho
direito, relata Pukhayeva. Ela
mostra um retrato que carrega
para todos os lados. "Vê? É bonita
como uma pintura."
A família Kusov reuniu um grupo de parentes vindos de várias
partes do país em busca de sua
matriarca de 70 anos, Maria, que
havia levado seu neto à escola naquele dia e nunca voltou.
"Ela tem cinco irmãs e três irmãos. Você pode imaginar quantos primos nós temos", diz o seu
filho Vladimir, 37. "Todos temos
checado hospitais. Estive no necrotério 8, 10, 12 vezes. Não temos
mais idéia do que fazer."
Resgatada e desaparecida
Todos da região da pequena cidade de Beslan, todos menos aparentemente as autoridades, conhecem a história de Konstantin
Mamayev e de sua filha que ele
encontrou e perdeu novamente.
Seu nome é Sabina, 14, e, como
seu pai relata, ele a encontrou entre os feridos naquele último dia e
a mandou de carro para um hospital. Em seguida, ele voltou para
resgatar mais vítimas.
Foi a última vez que a viu.
"Simplesmente não posso explicar", diz, um exausto e confuso
homem de 44 anos. "O fato é: eu a
tive em meus braços. Eu a carreguei. E ela não está aqui."
Ele conta assim sua história: "Eu
a encontrei no chão com os outros feridos. Eu me agachei ao lado dela e perguntei: "Saba, como
você está?". E ela respondeu: "Estou bem". Foi tudo o que dissemos."
Ele não carregou a maca, disse,
porque estava exausto. "Tinha ficado três noites sem dormir. Estava desmaiando de pé".
Cansado como estava, e desesperado para encontrar sua única
filha, não teria ele resgatado outra
menina?
Mamayev tem um vídeo de televisão que mostra um fragmento
da cena caótica.
Em meio a uma multidão que
grita e corre, uma garota é carregada rapidamente numa maca até
uma grande van branca. Atrás da
maca está Mamayev. Quando a
maca é colocada no chão, ele se
ajoelha perto de seus pés.
E então a câmera vira.
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