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ARTIGO
Como no Líbano, poder se fragmenta no Iraque
PATRICK COCKBURN
DO "INDEPENDENT"
"No Iraque ocorrem atos de violência constantes, mas a liberdade
está avançando", disse o presidente George W. Bush, em tom
despreocupado.
Não é verdade. A violência piora
a cada dia, e a liberdade está visivelmente em queda livre. Os EUA
e o governo iraquiano interino
não exercem controle pleno de
praticamente nenhuma cidade
iraquiana, grande ou pequena, fora do Curdistão. A insurgência está se alastrando. Os iraquianos dizem que seu país está se fragmentando em centros de poder rivais,
como o Líbano na década de 70.
Vista de longe, a violência no
Iraque parece ter virado endêmica. Mas o padrão vem mudando
significativamente nos últimos
seis meses, e para pior. Um ano
atrás, os combates se limitavam
principalmente aos distritos sunitas nas Províncias que cercam
Bagdá. Hoje, as forças americanas
são atacadas em todo o país.
Agosto foi o primeiro mês em que
mais soldados americanos foram
mortos e feridos por combatentes
xiitas do que por sunitas.
Os EUA e o governo interino
exercem controle cada vez menor, mesmo na região central de
Bagdá. Nesta semana o Exército
americano disparou foguetes de
helicópteros para controlar uma
multidão na rua Haifa, a poucas
centenas de metros de distância
da Zona Verde, sede das forças
americanas e do governo iraquiano. Os insurgentes responderam
cometendo sua própria atrocidade no mesmo lugar, quando um
carro-bomba explodiu no meio
de uma multidão de candidatos a
policiais, matando 47 deles.
Poderíamos imaginar que a selvageria desse último ataque, no
qual foram mortos apenas iraquianos, resultaria em apoio
maior ao governo. Mas, quando
conversei com sobreviventes do
ataque, eles achavam que tinham
sido atingidos por um míssil americana ou perguntavam por que
os insurgentes estavam matando
iraquianos, quando deveriam estar matando americanos.
No ano passado, a população
iraquiana estava dividida em sua
visão da ocupação e da resistência
armada. Hoje é difícil encontrar
um iraquiano que não apóie os
ataques contra americanos.
Usando as Forças Armadas
americanas, o governo pode abrir
caminho à força em qualquer cidade do Iraque. Mas o poderio
militar americano não se traduz
facilmente em força política. A
base política do governo é pequena e não cresceu desde a posse,
em 28 de junho.
Os EUA estão tentando aumentar a autoridade do governo interino, com a ajuda de seu poderio
aéreo. É contraproducente. Porta-vozes militares anunciam ataques
aéreos de precisão contra ""terroristas", enquanto a população do
Iraque assiste na TV a imagens de
crianças feridas.
Por que os EUA se mostram tão
desastrados no Iraque? A razão
principal, provavelmente, é que
os responsáveis pelas decisões finais nos EUA estão muito mais
interessados em quem detém o
poder em Washington do que no
que acontece em Bagdá.
O general dos marines James
Conway, que está saindo do Iraque, deixou claro que se opôs, primeiro, à decisão de montar o certo a Fallujah, inquietando sua população, e depois à decisão de entregar a cidade aos insurgentes.
Em ambos os casos, o impacto sobre a eleição presidencial americana parece ter sido a única preocupação da Casa Branca.
Nas circunstâncias atuais, será
impossível realizar eleições que
tenham qualquer significado no
Iraque. A população iraquiana
não vai reconhecer como justa
uma eleição na qual as urnas vierem amarradas às costas de tanques americanos. Se as Províncias
sunitas não participarem das eleições, mas os distritos xiitas, sim,
as divisões entre as duas comunidades só irão se aprofundar. ""Estou certo de que o resultado das
eleições será uma fotocópia do
governo interino", disse um comerciante de Fallujah. ""Eles [os
candidatos] são americanos que
falam árabe."
As eleições só poderiam dar certo se todos os iraquianos acreditassem que elas serão justas e livres. Isso só poderia acontecer se
houvesse uma conferência de todas as comunidades e os grupos
de poder no Iraque, incluindo os
insurgentes sunitas e xiitas, para
acertar regras básicas. Mas, para
isso, seria preciso que os EUA e o
governo interino reconhecessem
que são apenas dois entre os muitos poderes presentes no Iraque, e
isso eles não dão qualquer sinal de
que estejam prontos a fazer.
Tradução de Clara Allain
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