UOL


São Paulo, sábado, 18 de outubro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VIZINHO EM CRISE

Avião que devia trazer 53 brasileiros chega ao país superlotado com 107 passageiros, incluindo estrangeiros

Resgatados cantam hino ao entrar no Brasil

HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
TALITA FIGUEIREDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DO RIO

Superlotado com 107 passageiros resgatados em La Paz, na Bolívia, o avião Hércules C-130 da FAB (Força Aérea Brasileira) pousou às 11h25 (horário de Brasília) no aeroporto internacional de Campo Grande (MS), dando fim à missão iniciada às 4h de ontem. A aeronave transporta normalmente 80 pessoas.
A previsão era fazer o resgate de 53 turistas, mas vieram também brasileiros que estavam a trabalho ou morando na Bolívia, além de 17 estrangeiros (sete chilenos, três mexicanos, uma espanhola, uma colombiana, três uruguaios, um boliviano e um argentino).
O piloto do avião, major Fernando Colnago, 38, disse que, quando anunciou a entrada do avião no espaço aéreo brasileiro, os passageiros bateram palmas e cantaram o Hino Nacional.
Para a Agência Folha, Colnago afirmou que em situações normais não levantaria vôo com um excedente de 27 passageiros a bordo. "Era uma situação de emergência, de guerra", explicou.
Os sete tripulantes do avião chegaram por volta das 7h20 a La Paz. O motor da aeronave permaneceu ligado durante 40 minutos. "Se houvesse qualquer risco, nós iríamos embora", disse Colnago.
A FAB não usou os dois helicópteros Super Puma que estavam em Corumbá (418 km de Campo Grande), na divisa com a Bolívia. Segundo o comandante da Base Aérea de Campo Grande, coronel-aviador Ademilton Tenório de Albuquerque, 48, as duas aeronaves seriam utilizadas caso o Hércules não pudesse resgatar todas as pessoas.
A maioria dos brasileiros estava no hotel Esplanada. Todos as pessoas ouvidas pela Agência Folha relataram que já havia falta de alimentos em La Paz.
Entre os estrangeiros que conseguiram ajuda da embaixada brasileira para sair de La Paz estava a colombiana Patrícia Londoño, sobrinha do ministro do Interior e da Justiça da Colômbia, Fernando Londoño.
Por volta das 13h30, o avião Hércules voltou para o Rio de Janeiro, de onde saíra na quarta-feira. Segundo informações da Base Aérea, 80 passageiros seguiram para o Rio. Os outros 27 embarcaram em Campo Grande para as cidades onde moram.

Caminhada de 50 km
Na chegada ao Rio ontem à tarde, a auditora fiscal do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) Maria Rita Carvalho Dutra, 50, lembrou os momentos de terror vividos com a tia Alda Dutra Batista, 64, e com o marido, cujo nome ela não quis revelar.
Os problemas dos três turistas, que tinham entrado na Bolívia no dia 6, por terra, e planejavam chegar ao Peru, começaram na estrada que liga Cochabamba a La Paz. Eles seguiam em um microônibus quando a viagem foi interrompida por manifestantes que montaram barricadas na estrada.
Sem ter para onde ir, Dutra, o marido e a tia decidiram caminhar até El Alto, a cerca de 50 km. Ela não revelou quanto tempo levaram para chegar a El Alto, onde conseguiram abrigo em uma fábrica de macarrão.
"A gente não aguentava mais andar quando vimos um senhor abrindo a porta da fábrica e pedimos socorro", disse ela.
Eles dormiram na fábrica. Dutra disse que, no dia seguinte, o dono do estabelecimento tentou levá-los a La Paz, mas teve o carro apedrejado. Também apedrejaram a fábrica, segundo ela.
"Para eles [os manifestantes], não interessa se é criança, mulher, adulto. Se você passa e a sua cor é diferente, você é gringo", disse.
Segundo Dutra, eles conseguiram voltar à fábrica, onde passaram mais quatro dias, e apenas na quarta-feira conseguiram telefonar para parentes em São Paulo, que entraram em contato com a embaixada brasileira.
"Ontem [anteontem] saímos de madrugada com dois empregados da fabrica e fomos para o aeroporto de El Alto, onde ficamos o dia inteiro. O aeroporto não estava funcionando, mas, por sorte, deram um copo de sopa para a gente. Água a gente pegava do banheiro. De madrugada foram nos buscar e nos levaram para o local onde estava o avião do Exército."


Texto Anterior: Líder indígena exige mudanças e quer revolução
Próximo Texto: Marco Aurélio Garcia articula transição
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.