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São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 2003

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Governo diz não ter recursos suficientes

DA REDAÇÃO

Em entrevista à rede de TV britânica ITN em abril de 2001, o presidente da África do Sul, Thabo Mbeki, negou ter questionado a ligação entre o HIV e a Aids.
"O problema surgiu porque existe o slogan "O HIV causa a Aids" e, assim, deve-se agir de determinada maneira. Mas, quando alguém diz "vamos olhar a questão de forma mais ampla", a resposta é que se está questionando a ortodoxia", afirmou.
"Meu ponto de vista é que não podemos nos focalizar em uma única coisa. A doença é adquirida por meio de um vírus, mas más condições de saúde contribuem para destruir o sistema imunológico. Há a questão da nutrição, da água potável, das condições de moradia. Há, portanto, necessidade de lutar contra a pobreza", disse Mbeki.
Embora o líder sul-africano afirme ter sido mal interpretado, suas declarações tiveram tal impacto negativo que o governo incluiu, em nota oficial de abril de 2002, uma frase esclarecendo a questão: "O ponto de partida do governo é baseado na premissa de que o HIV causa a Aids."
Ao consultar documentos oficiais sul-africanos pela internet, verifica-se que há estudos sobre a dimensão da epidemia (o governo não está desinformado), ampla legislação de proteção aos portadores do vírus ou com Aids e diversos programas de prevenção, de apoio às vítimas e de combate a aspectos específicos da doença, como a transmissão de mãe para filho. Há também um projeto para a descoberta de uma vacina. E planos, muitos planos.
Entretanto a África do Sul ainda não tomou a decisão fundamental de fornecer tratamento gratuito a todos os que necessitam, por meio do sistema público de saúde. É uma decisão difícil, pois exige muitos recursos, mas é a única que pode oferecer uma vida mais longa e de melhor qualidade aos 4,7 milhões de infectados no país (em 2010, serão 7 milhões).
Segundo cálculos do governo, a distribuição gratuita de remédios anti-retrovirais (que combatem o vírus) custaria R$ 2,73 bilhões por 1 milhão de pacientes.
"Não peço desculpas pelo fato de atualmente não podermos custear a terapia anti-retroviral. Ao contrário do Brasil, nós não manufaturamos essas drogas, estamos presos a acordos de patentes e temos um número muito alto de soropositivos. O Brasil tem e pode tratar menos de 1 milhão de pessoas [há 600 mil infectados no Brasil". Nós temos quase 5 milhões de soropositivos e de doentes de Aids", disse à Folha a diretora-chefe do programa de HIV/ Aids do Ministério da Saúde sul-africano, Nono Simelela.
"Estamos saindo de mais de 40 anos de apartheid, durante os quais os negros não tinham qualquer acesso à saúde. Em oito anos, fizemos imensos progressos em melhorar os serviços básicos. Pode não ser suficiente, mas é o que podemos fazer agora", afirmou.
A Ação pelo Tratamento encomendou um estudo independente para avaliar os custos da implementação progressiva do tratamento anti-retroviral.
Com 20% da demanda atendida, custaria R$ 87,36 milhões em 2003. Os gastos subiriam gradativamente até 2007, quando chegariam a R$ 2,65 bilhões e cobririam 90% da demanda. O pico seria em 2015, com custo de R$ 7 bilhões.
O tratamento comprometeria 70% do orçamento da saúde atual, que, obviamente, teria de ser aumentado. Entretanto o estudo calcula que, somente em 2015, haveria uma economia de até R$ 3,5 bilhões com internações hospitalares. E até 2,8 milhões de mortes seriam evitadas nos próximos 13 anos. (OD)


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