Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ENTREVISTA
Juiz federal fecha cerco aos militares
de Buenos Aires
O juiz federal Adolfo Bagnasco
concedeu uma entrevista à Folha
em seu gabinete. Na parede, os
originais de várias caricaturas
suas publicadas nos jornais argentinos. "Gosto muito do humor", disse. Ele afirma ter subsídios para acreditar que os chefes
da ditadura sabiam do roubo sistemático de bebês.
(VA)
Folha - O que o sr. investiga?
Adolfo Bagnasco - A idéia principal é averiguar se houve um plano sistemático de roubo de bebês
de 76 a 78. A primeira junta militar da ditadura seria responsável,
pois tinha o poder militar e político na época.
Folha - Por que esse período?
Bagnasco - Foi o período em
que a luta armada contra a subversão foi maior. Depois, a quantidade de detentos caiu.
Folha - E onde se praticaram
os supostos roubos de bebês?
Bagnasco - Havia cerca de 350
centros clandestinos de detenção
na época. Mas dois eram mais importantes, o da Esma (Escola Mecânica da Marinha) e o Campo de
Mayo, ambos em Buenos Aires.
Havia de 4.000 a 5.000 pessoas em
cada um deles, muitas eram mulheres e algumas estavam grávidas. Nesses dois centros, ocorriam dois delitos: a substituição
de identidade e subtração de menores. Isso é o que investigamos.
Folha - E como se pode comprovar o plano sistemático e
responsabilizar os militares?
Bagnasco - No Campo de Mayo, por exemplo, há um hospital.
Temos testemunhos de médicos e
enfermeiras que atendiam às detentas grávidas. Essas pessoas não
eram registradas. Na Esma ocorreu a mesma coisa. Houve uma
sistematização, com muitos casos
iguais, partos nas mesmas salas,
crianças separadas das mães e, na
maioria das vezes, as mães desapareciam, perdendo-se o rastro
das crianças. Tudo provado.
Folha - Os líderes sabiam?
Bagnasco - Acreditamos que
sim. Eles não negam que aconteceu, alegam que não sabiam. E
nós dizemos que é impossível que
eles não soubessem porque havia
muita informação.
Folha - E qual era a razão para
tudo isso?
Bagnasco - Não buscamos
identificar as causas. Mas existem
distintas teorias de extermínio.
Uma delas diz que os militares
queriam reeducar os filhos de um
setor da sociedade que consideravam subversivo. Por outro lado,
há quem se refira a benefício econômico.
Folha - O ex- presidente Rafael
Videla se nega a depor?
Bagnasco - Desde 83, quando
voltou a democracia, ele nunca
reconheceu a Justiça civil como
apropriada para julgá-lo e nunca
depôs quando foi julgado.
Folha - Ele está lúcido?
Bagnasco - Totalmente. Ele tem
médicos que o acompanham,
mas está absolutamente em condições de participar do julgamento. Ele é um místico. Em 85, durante os julgamentos, ele lia a Bíblia o tempo todo. É um homem
que vive sem luxo.
Folha - O que o sr. acha da tentativa do juiz espanhol Baltasar
Garzón de extraditar militares
argentinos para julgá-los na Espanha?
Bagnasco - Ele está interessado,
tanto quanto os juizes argentinos,
em evitar a impunidade de delitos
contra os direitos humanos. O
trabalho é conjunto e complementar.Torço para que ele consiga alcançar seu objetivo.
Texto Anterior: Multimídia: Venda do "LA Times" é marco histórico Próximo Texto: Eleição: Independentista vence em Taiwan Índice
|