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LUTA EM VÃO
Membros da etnia abandonam Kosovo e culpam ditador iugoslavo por fracasso no conflito com a Otan
Sérvios fogem e criticam Milosevic
KENNEDY ALENCAR
enviado especial a Kosovo
Presos em um
congestionamento de cerca
de 2 km na fronteira norte de
Kosovo, sérvios
deixavam ontem a Província,
rumo ao interior da Sérvia, criticando o presidente iugoslavo, Slobodan Milosevic.
"De que adiantou essa guerra?",
pergunta Rodoljub Bulajic, 50, fiscal da alfândega iugoslava em Pristina. Ele está deixando a capital de
Kosovo com a mulher e as duas filhas. Às 11h, estava parado havia
uma hora na estrada para Belgrado, pouco depois da cidade de Podujevo (a última em Kosovo).
"Nosso país foi destruído, e agora o ELK está nas ruas de Pristina",
diz. Para ele, a "mentalidade comunista" de Milosevic afundou o
país, e o ditador deveria "sair do
governo" (seu mandato vai até o
meio de 2001).
Bulajic prefere um político mais
"aberto". Menciona Vuk Draskovic, líder do SPO (Movimento de
Renovação Sérvio). Milosevic pertencia ao antigo Partido Comunista da Sérvia e hoje lidera o SPS
(Partido Socialista da Sérvia).
Durante a guerra de 11 semanas,
Draskovic manteve críticas à Otan.
Ele foi destituído (em abril) do cargo de vice-premiê da Iugoslávia
porque discordava da condução
do conflito pelo lado iugoslavo.
"Draskovic tem boas conexões
com outros países e pode sair da
Sérvia", afirma, referindo-se ao fato de Milosevic e membros de seu
governo terem sido acusados de
crimes de guerra pelo tribunal internacional da ONU para a ex-Iugoslávia, sediado em Haia (Holanda). "Se Milosevic pôr o pé fora da
Sérvia, prendem-no."
Bulajic estava indo para Smederevo, cidade próxima a Belgrado.
Ficará na casa de um irmão "por
uns dez dias". Acha que, depois
desse período, terá uma avaliação
mais clara sobre "a segurança" em
Kosovo. "Minha mulher está muito nervosa", diz.
Ele começa a fantasiar coisas sobre o ELK (Exército de Libertação
de Kosovo). Conta que um helicóptero da Otan transportou um
contêiner até a cidade de Lipljan,
20 km ao sul de Pristina. "Dez terroristas do ELK saíram de dentro."
A repetição dessa história absurda mostra como os sérvios estão
com medo dos guerrilheiros separatistas do ELK.
Mas, de fato, seus soldados estão
retomando posições em todas as
cidades de Kosovo, e já ocorreram
agressões contra a minoria sérvia
na Província.
Soldados da aliança militar ocidental, que não fizeram nada na última quarta-feira ao ver a guerrilha
se transformar na polícia da cidade
de Prizren, começaram a endurecer nos últimos dois dias com o
ELK e a apreender suas armas.
Marija não quer revelar o sobrenome. Está com medo de tudo.
Deixou o namorado em Lipljan e
viajou com o irmão, a cunhada e
uma sobrinha de dez meses para
Belgrado. Estavam no engarrafamento.
"Acho que nunca mais voltarei
(para Kosovo)", lamenta. Enfermeira, diz que vai tentar recomeçar a vida em Belgrado. "Não sei
como. Não há emprego lá."
Ela faz críticas a Milosevic: "Nos
levou a uma guerra e agora estamos mais pobres e sem casa".
Ljubisa é um policial de Prokuplje, na Sérvia, que tenta organizar o
trânsito depois da fronteira kosovar. "Milosevic tem dinheiro na
África do Sul. Não liga para nós",
diz, aludindo a eventuais contas
secretas que o ditador teria no exterior. Esse é um boato que corre
por toda a Iugoslávia.
"É claro que perdemos (a guerra). Quantos sérvios você acha que
ficarão em Kosovo? Zero", afirma,
num tom impaciente. Para Ljubisa, Kosovo, onde estão monumentos históricos da cultura de sua etnia, nunca mais voltará a ser sérvia. "Perdemos nossas raízes."
A viagem do jornalista Kennedy Alencar é parcialmente custeada pela editora DBA
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