São Paulo, terça-feira, 19 de novembro de 2002

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AMÉRICA LATINA

Anúncio foi feito um mês após general americano pedir a revisão da compra; colombianos e EUA negam pressão

Colômbia susta compra de aviões do Brasil

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Um mês após um general dos EUA ter solicitado à Colômbia que reconsiderasse a compra de 40 aviões da Embraer, o governo do país decidiu suspender as negociações com a empresa de São José dos Campos (SP).
A suspensão foi anunciada pela ministra da Defesa da Colômbia, Marta Lucía Ramírez, em entrevista a uma rede de TV colombiana, anteontem. O governo colombiano esclareceu não ter desistido formalmente da compra de aviões leves como os da Embraer, mas apenas suspendido as negociações atualmente em curso.
Em outubro, o general James T. Hill, chefe do Comando Sul do Pentágono, enviou uma carta ao governo colombiano sugerindo que a compra, avaliada em US$ 234 milhões, fosse reconsiderada. Na carta, sugeriu que a prioridade da Colômbia deveria ser a modernização da frota existente e alertou que a compra de aviões brasileiros poderia "influenciar negativamente a aprovação" de ajuda financeira à Colômbia pelo Congresso americano. O teor da carta foi divulgada pelo jornal "O Estado de São Paulo".
Ontem, o porta-voz do Comando Sul do Pentágono, Stephen D. Lucas, disse à Folha que a carta de Hill foi um "conselho franco" e não uma posição do governo americano. Acrescentou ainda outro ingrediente polêmico ao dizer que a suspensão da compra não deve ser creditada à carta enviada pelo general, mas a suspeitas "nebulosas" envolvendo o negócio com os brasileiros.
"A ministra já disse publicamente que o negócio com a companhia brasileira estava sendo revisado antes mesmo da carta do general Hill, devido a outros assuntos", afirmou. "Acho que as palavras usadas em espanhol foram algo como um "negócio obscuro". Houve alguma forma de irregularidade nos preços, propina ou alguma outra coisa." A Embraer não quis comentar ontem a denúncia de propina.
O ministro do Interior da Colômbia, Fernando Londoño, disse ontem que "a possível aquisição dos aviões se tornou uma rede de intrigas e influências".
Anteontem, a revista colombiana "Cambio" publicou uma reportagem na qual indicava que as quatro companhias interessadas na venda -além da Embraer, uma suíça, uma americana e uma coreana- tinham a ajuda de "amigos" do governo de Andrés Pastrana (1998-2002), que iniciou o processo de compra.
Segundo a "Cambio", o governo anterior já havia decidido suspender a compra em maio após tomar conhecimento de uma gravação telefônica com detalhes dos supostos jogos de influência.
A ministra da Defesa negou ontem que a suspensão tivesse alguma relação com a pressão americana ou mesmo com a reportagem da "Cambio". Segundo ela, a razão foi fiscal. "Possivelmente, em uns dois anos, haja a necessidade de comprar aviões de combate, mas nós consideramos que então a situação fiscal do país já será mais favorável", disse.
Segundo a imprensa colombiana, a posição do ex-ministro da Fazenda Juan Manuel Santos, contrário à compra, teria sido determinante para a suspensão.
"Eu me opus em seu momento à compra dos aviões porque um investimento dessa natureza não era conveniente do ponto de vista das prioridades das finanças públicas e superava a capacidade de endividamento das Forças Armadas", disse. Santos admitiu que o representante da empresa suíça é seu amigo de infância, mas negou favorecimento. "Eu não tinha sequer a mais remota idéia de que ele vendia aviões", disse.
O porta-voz do Comando Sul do Pentágono rejeitou de forma enfática a idéia de que a referência à corrupção pudesse ser uma estratégia para colocar em segundo plano as pressões do Pentágono sobre o governo da Colômbia.
"Isso não faz sentido. O general não fez pressões, mas respondeu a um pedido de sugestão feito pela própria ministra. Quanto à suposta corrupção, só estou relatando o que já havia sido dito antes de forma pública", afirmou ele.
O porta-voz disse que o Pentágono não tem qualquer objeção aos aviões da Embraer - os jatos leves EMB-314 Super Tucano. "Quero enfatizar, particularmente para o público brasileiro, que isso não tem qualquer relação com a qualidade dos aviões brasileiros. Os EUA, aliás, são o maior mercado da Embraer."
Com relação aos motivos pelos quais a carta foi enviada pelo general Hill, ele disse que "não foi uma manifestação política do governo americano", mas uma simples sugestão num contexto de intercâmbio militar franco.
"A ministra reconheceu ter ela mesma requisitado a opinião do general Hill sobre as prioridades da Força Aérea Colombiana. A resposta enviada pelo general não faz nenhuma crítica a qualquer tipo de jato, brasileiro ou não. A recomendação do general foi que a Força Aérea tinha necessidades maiores de aprimorar sua mobilidade operacional, de aprimorar sua frota de C-130 a fim de movimentar suas forças pelo território colombiano."
Segundo o porta-voz, a referência ao Congresso não visou a pressionar a Colômbia. "O general disse na carta que a compra dos aviões poderia causar problemas. Ele não disse que "causaria" problemas nem ameaçou fazer uma denúncia no Congresso ou no governo. Foi uma assessoria franca, solicitada pelos colombianos."


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