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São Paulo, domingo, 20 de abril de 2003

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Bush parte agora para ataque na frente doméstica

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

Vencida a guerra contra o Iraque, o presidente norte-americano, George W. Bush, está partindo para o ataque no front doméstico. Nos últimos dias, vem procurando constranger o Congresso a aprovar um pacote de corte de impostos de US$ 550 bilhões para reativar a economia.
"Esse dinheiro deve circular. Vai ajudar a combater o desemprego", vem repetindo o presidente, que enfrenta uma eleição daqui a 18 meses.
Depois do rápido avanço no Iraque, Bush espera agora correr contra o tempo no deserto de boas notícias que se tornou a economia americana.
Um crescimento medíocre, projetado em 2,2%, o aguarda no fim de 2003. Para o ano eleitoral de 2004, se não quiser engrossar a lista dos 2 milhões de americanos que perderam o emprego durante seu mandato, Bush deve percorrer um campo minado por expectativas e realidades ruins.
A favor do presidente republicano há, além de duas guerras vencidas (Afeganistão e Iraque), uma enorme desorganização no campo adversário.
Os democratas têm hoje nove pré-candidatos ao pleito de novembro de 2004, e, até aqui, nenhum discurso consistente.
A única tentativa nesse sentido provou-se desastrosa. Tido como o opositor com melhores chances, o senador democrata John Kerry posicionou-se frontalmente contra a guerra e defendeu uma "mudança de regime nos EUA".
Depois de os marines chegarem a Bagdá, Kerry vive em um país onde sete em cada dez americanos aprovam o presidente, e nove em dez, a condução da guerra.
Pesquisa divulgada pelo ""The Wall Street Journal" revelou que 52% dos americanos votariam para reeleger Bush. Apenas 24% escolheriam um candidato do Partido Democrata.
""Ter nove candidatos equivale a não tem nenhum. A cabeça dos democratas ainda é Bill Clinton, e ele não quer se envolver. É uma situação triste", disse à Folha Robert Pelletreau, ex-secretário-assistente de Estado no primeiro mandato de Clinton.
Clinton percorreu oito anos na Presidência flutuando sobre a chamada "exuberância irracional". Investimentos, novos ricos e projeções otimistas sobravam até 2000, quando a famosa ""bolha" financeira estourou. Coube ao seu sucessor pagar a conta.
Desde que assumiu, em 2001, Bush viu um dos principais ícones da economia americana, o índice Dow Jones da Bolsa de Valores de Nova York, perder cerca de 25% de seu valor. O indicador representa não só a saúde das empresas. É também a medida da poupança e das aposentadorias dos americanos.
Há outras armadilhas pela frente. A real possibilidade de uma queda abrupta nos preços dos imóveis nos EUA, supervalorizados desde 95, pode respingar no setor bancário e há o temor de que "esqueletos" escondidos nos balanços de empresas voltem a assombrar a economia.
O problema crucial, contudo, é o desemprego, na faixa de 5,8%.
Já se tornou lugar-comum comparar Bush filho a Bush pai, que ganhou a Guerra do Golfo, em 1991, mas não se reelegeu. A economia ia mal.
Bush pai, no entanto, não apenas entregou o cargo com um Dow Jones 29% mais gordo, como conseguiu criar 1,3 milhão de empregos em seu mandato.
"Não é preciso bola de cristal para descobrir que vamos entrar em uma onda de gastos", afirma David Rosenberg, economista da corretora Merrill Lynch.
Bush vem fazendo o que pode. Seus gastos militares, por exemplo, vão representar sozinhos 30% do crescimento do PIB dos EUA neste ano.
Para estimular a economia, Bush também demonstrou tranquilidade ao propor um corte de impostos de US$ 726 bilhões em dez anos para um país que já projeta um déficit na casa dos US$ 400 bilhões em 2003.
Nem o Senado, dominado pelos republicanos, engoliu a extravagância. Para "choque e pavor" de Bush, os senadores limitaram o corte em US$ 350 bilhões, implodindo a única e polêmica estratégia de curto prazo do presidente.
Agora, Bush exorta o Congresso a aprovar, no mínimo, a proposta de corte de US$ 550 bilhões sugerida pela Câmara.
Economistas estimam que normalmente os EUA têm de crescer a uma taxa superior a 3% ao ano para começar a gerar novos postos de trabalho.
Isso pode ocorrer no ano que vem, mas precisaria começar logo para que os eleitores sentissem os efeitos antes de novembro.
Em 2000, Bush venceu a disputa contra Al Gore por uma margem apertada. Teve 53% dos votos válidos. Agora, sem muitos instrumentos para se cacifar na economia, é de se esperar um reforço substancial na retórica.
Com um apelo extraordinário entre a opinião pública, o mantra da "necessidade de segurança interna e do combate ao terrorismo sem fronteiras" deve soar mais do nunca nos meses que ainda estão pela frente.

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