São Paulo, terça-feira, 20 de abril de 2004

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Dúvidas de Powell sobre Iraque irritam Casa Branca

STEVEN R. WEISMAN
DO "NEW YORK TIMES"

Por mais de um ano, o secretário de Estado dos EUA, Colin Powell, e seus assessores vêm reconhecendo, tacitamente, que ele estava preocupado antes da guerra com o que poderia sair errado depois que as tropas americanas capturassem o Iraque.
Mas a aparente decisão de Powell de expressar suas dúvidas de maneira ainda mais explícita para um livro do jornalista Bob Woodward abalou a Casa Branca e agravou as tensões que, há muito, fervilham no gabinete de George W. Bush. Além disso, dizem alguns funcionários, o livro criou problemas para o secretário no seio do governo bem no momento em que a situação no Iraque está se deteriorando, e a campanha de Bush não vai tão bem.
Powell não admitiu ter cooperado com Woodward, mas o livro, chamado "Plan of Attack" (plano de ataque), apresenta as reservas sentidas pelo secretário de maneira tão detalhada que deixa poucas dúvidas. Um porta-voz de Powell voltou a dizer, anteontem, que não faria comentários.
Os críticos de Powell na ala belicosa do governo dizem que ficaram atônitos diante de uma decisão que viam como egoísta por parte do secretário, que optou por reforçar sua reputação como analista previdente, talvez em detrimento de Bush. Muitos deles disseram que o livro provava aquilo que de qualquer forma já esperavam: Powell não continuará no governo caso Bush se reeleja.
A opinião manifestada, anteontem, por membros da administração, de que a imagem que o livro apresenta de Bush é a de um líder sóbrio e resoluto que se antecipou e solicitou planos de contingência para uma guerra, mas só se decidiu pelo ataque no último minuto, salva Powell de quaisquer dificuldades imediatas que poderiam ser causadas por sua aparente traição da relação confidencial entre um secretário e um presidente que preza muito a lealdade, disseram diversos funcionários.
Os democratas pretendem aproveitar o retrato oferecido por Powell, dizendo que ele lhes dá munição para criticar o governo por ir à guerra sem obter amplo apoio internacional ou planejar devidamente a ocupação.
Anteontem, John Kerry (virtual candidato à Presidência) mencionou o livro de Woodward ao menos três vezes.
"Eis um livro de um escritor respeitado", disse Kerry a milhares de estudantes da Universidade de Miami. "Ele mostra que o presidente chegou a enganar membros de seu próprio governo."
Pessoas ligadas a Powell disseram que não tinham dúvida de que ele suportaria quaisquer críticas internas por sua aparente cooperação com Woodward, diretor-assistente de Redação do "Washington Post".
As pesquisas de opinião apontam que ele é uma das figuras mais populares do governo. As pessoas ligadas a ele apontam que a maioria dos observadores que acompanharam de perto a situação sabia que Powell tinha reservas em relação à guerra.
"O secretário perderá influência porque estava certo?", perguntou um funcionário próximo de Powell. "Não creio. Perderá influência em favor de quem? Donald Rumsfeld? Dick Cheney? São estes os membros do governo que estão enfrentando problemas reais agora. Não estão lendo o livro de Bob Woodward. Estão lendo as mensagens de campo."
O livro de Woodward também afirma que Powell sentia que, embora tivesse dúvidas quanto a entrar em guerra, era sua obrigação apoiar o presidente quando Bush tomou sua decisão.
O presidente disse a Woodward que não pediu a opinião do secretário de Estado quanto a ir ou não à guerra, pois sabia qual seria a opinião dele: "Não".
Mas um importante assessor de Powell afirmou, durante o final de semana, que o secretário não se opunha à guerra ao ponto que algumas pessoas presumem, não importando as implicações sugeridas no livro.
"O retrato de Powell no livro de Woodward é bastante consistente com aquilo que todo mundo sabe", disse o funcionário. "Estávamos com o presidente se fosse preciso entrar em guerra. Montamos uma rampa de saída para Saddam, e ele não quis usá-la. Powell, no final, se sentia muito confortável, pois sabia disso."


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