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DOUTOR MORTE
Inquérito confirma que Shipman matou quase 1 pessoa por mês em 23 anos; ele cumpre prisão perpetua desde 2000
Médico britânico matou ao menos 215
DA REDAÇÃO
O médico Harold Shipman, o ""Dr. Morte" britânico, entrou para o ranking dos piores ""serial killers" do mundo ontem, quando um inquérito oficial concluiu que ele assassinou pelo menos 215 pacientes com injeções de opiáceos.
A investigação constatou que Shipman matou de maneira fria, sistemática e discreta ao longo de 23 anos, pondo fim à vida de um paciente após outro, numa quebra da relação de confiança médico-paciente ""que não tem paralelo na história", disse o inquérito.
Há dois anos e meio, o médico de família, hoje com 56 anos, começou a cumprir pena de prisão perpétua. Ele foi condenado pela morte de 15 mulheres, em sua
maioria idosas, mas a extensão plena de seus crimes só está vindo
à tona agora. Ele atingiu a média de quase um assassinato por mês
ao longo de quase um quarto de século.
As razões que o levaram a assassinar seus pacientes continuam
desconhecidas, e ele se recusa a confessar os crimes.
Plena confiança
"Por profundamente chocante que seja, a simples afirmação de que Shipman matou mais de 200 pacientes não reflete plenamente a enormidade de seus crimes", escreveu no relatório a juíza Janet Smith, que conduziu o inquérito.
""Como clínico geral, Shipman gozava da plena confiança de seus
pacientes e das famílias deles. Ele traiu a confiança deles de uma
maneira e a um ponto que acredito não ter paralelos na história."
Em entrevista coletiva à imprensa, a juíza disse ter ""causas
reais" para suspeitar que o médico tenha matado outros 45 pacientes no norte da Inglaterra, em sua maioria perto de Manchester, e considerou ""profundamente
perturbador" que ele tenha passado tantos anos agindo sem ser
descoberto.
Para a promotoria, o desejo de matar de Shipman, descrito como
sendo atencioso, porém arrogante, era alimentado pela vontade de
exercer poder divino sobre a vida e a morte. Outros especularam
que ele possa ter sido influenciado pelo fato de ter assistido à morte
de sua mãe, por câncer, quando era adolescente.
Seja qual for o motivo, foi o fato de o médico ter usado os instrumentos de sua profissão -a medicina e a confiança que os pacientes depositavam nele- para
matar que mais chocou a pequena comunidade de Hyde, na Grande
Manchester.
A descoberta de muitas outras vítimas confirma Shipman como um dos mais prolíficos assassinos em série da história recente, comparável ao colombiano Pedro Lopez -conhecido como ""o monstro dos Andes"-, que, em 1980,
foi condenado por 57 mortes, mas é suspeito de ter assassinado 300
meninas.
Shipman cometeu seus crimes entre 1975 e 1998. De suas vítimas,
171 foram mulheres e 44, homens.
A mais velha foi uma mulher de
93 anos. A mais jovem, um homem de 41.
A juíza Smith excluiu a busca de
lucro financeiro ou a perversão
sexual como possíveis motivações
do médico, dizendo que ele era altamente dominador, mas que sua
verdadeira psique ainda é um
enigma.
As famílias se perguntam como
ele pôde matar tantas pessoas e
por tanto tempo sem atrair suspeitas, fato que a Associação Médica Britânica atribuiu a uma
"trágica falha no sistema". "Podemos garantir ao público que algo
dessa magnitude não voltará a
acontecer", disse Ian Bogle, presidente do sindicato dos médicos
britânicos. Ele afirmou que já foram adotadas novas medidas de
verificação.
Os crimes de Shipman normalmente começavam quando ele ia
examinar um paciente idoso na
residência deste. ""Durante a consulta, ele matava o paciente. Após
a morte, ele agia de maneiras diferentes e oferecia diversas explicações distintas para o ocorrido",
contou a juíza. ""A maneira como
Shipman era capaz de matar alguém, enfrentar os familiares do
morto e sair sem despertar suspeitas seria vista como fantástica e
improvável se fosse descrita numa obra de ficção."
Foi o assassinato de uma ex-prefeita de Hyde que acabou por
levar Shipman à prisão, quando a
filha da paciente contestou um
testamento novo no qual sua mãe
teria deixado todos os seus bens
para o médico. O corpo de Kathleen Grundy, de 81 anos, foi exumado, e foram encontrados traços da droga fatal.
O padre católico Denis Maher,
da igreja St. Paul's, em Hyde, implorou diretamente a Shipman
para que confessasse seus crimes.
"Dr. Shipman, por favor, admita
o que o senhor fez. Não apenas
pelo bem da população da Hyde,
mas também pelo senhor mesmo", disse o sacerdote.
Após a divulgação dos resultados do inquérito, Peter Wagstaff,
cuja mãe foi morta por Shipman,
disse em entrevista coletiva à imprensa: ""É a eterna pergunta
-por que ele fez o que fez? É muito duro para nós".
Jane Ashton-Hibbert, cuja avó
estava entre as vítimas de Shipman, falou: ""Ele ainda está com o
poder porque não está falando
nada. Enfrentar esse silêncio é
muito duro para as famílias".
Pai de quatro filhos, Shipman
em nenhum momento admitiu
que cometeu os crimes, e sua mulher, Primrose, se manteve a seu
lado o tempo todo.
Uma cópia do longo relatório da
juíza será enviada a ele, na penitenciária de Frankland, no condado de Durham, norte da Inglaterra. Mas a polícia afirmou ontem
que Shipman não vai enfrentar
novos julgamentos devido à virtual impossibilidade de encontrar
jurados ingleses que não tenham
conhecimento de seus antecedentes.
Com agências internacionais
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