São Paulo, sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Próximo Texto | Índice

Eleição afegã tem 26 mortes e baixa presença

ONU e governo festejam relativo sucesso em conter onda de terror prometida pelo Taleban; temor agora é de fraude maciça

Estimativa não oficial de comparecimento é de cerca de 50%; redutos eleitorais de presidente ficaram mais vazios do que os de opositor


Dilma Gavysh/Associated Press
Afegão vota em zona eleitoral da capital Cabul; resultado final do pleito para eleger novo presidente sai só no dia 17 de setembro

IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL AO AFEGANISTÃO

A eleição presidencial no Afeganistão foi considerada um sucesso por seus organizadores, já que, apesar de 26 pessoas terem morrido, a violência relativa ao pleito ao longo do dia de ontem foi menor do que a grande onda de terror prometida pelo Taleban permitia prever. Mas a taxa de comparecimento, aliada às denúncias de fraudes, coloca várias interrogações sobre os próximos passos do processo.
"Dentro do que a situação permitiu, foi um grande dia para o Afeganistão", afirmou o representante da ONU no país, Kai Eide. Ele lamentou as mortes, mas foi pragmático: "A eleição aconteceu, e isso em si é uma conquista".
Para o presidente Hamid Karzai, que, segundo as últimas pesquisas, liderava a corrida eleitoral, mas não tinha garantida vitória no primeiro turno, a votação o "deixou feliz". Após votar, disse a repórteres que apenas um turno seria melhor para o país.
Para seus rivais, tal desejo trai um processo de fraudes. A mais denunciada: policiais impedindo eleitores de chegar perto de zonas consideradas perigosas, só para ver as urnas desses locais serem preenchidas por votos pró-Karzai.
"Nós vamos apurar tudo. Temos duas semanas para receber queixas", disse o presidente da Comissão Eleitoral Independente, Azizullah Lundi. Ele, assim como o comandante das forças americanas e estrangeiras, Stanley McChrystal, comemorou o pleito.
Lundi listou a abertura de 6.199 zonas eleitorais, 95% das disponíveis. As outras 5% foram fechadas devido a ameaças. Não é possível saber ainda qual foi o comparecimento às urnas, algo que começará a tomar forma amanhã, mas só será oficializado no dia 3 de setembro. O resultado final sai em 17 de setembro e, se houver segundo turno, será provavelmente em 1º de outubro.
A Folha ouviu de dois organizadores internacionais do pleito que uma estimativa correta, sem fraudes a inflar a presença, é de algo menos que 50% de comparecimento -havia 15,6 milhões de eleitores registrados. Em 2004, o comparecimento foi de 70% dos registrados para votar. O voto no Afeganistão é facultativo.
Embora o Taleban tenha fracassado em sua tentativa de interromper o processo eleitoral, isso não significa que tenha sido um dia tranquilo. Das 26 mortes, 9 foram de civis, e o restante, de forças de segurança. Houve cerca de 20 membros do Taleban mortos.
O centro dos ataques foi a região sul. Candahar, bastião do Taleban, teve ataques de foguetes durante o dia todo. "Eu contei uns 15, 20", disse por telefone à Folha um funcionário da Comissão Eleitoral na cidade que se identificou como Nazim. O "New York Times" citou dois enforcamentos como punição a eleitores, mas ninguém confirmou oficialmente.
Na capital, que havia sido o foco dos ataques pré-eleitorais com atentados suicidas, a segurança foi muito reforçada. Durante toda a noite antes da abertura das urnas, o som de aviões Predator americanos dando rasantes dificultava o sono dos moradores.
Ainda assim, houve pelo menos duas explosões de foguetes audíveis por volta das 8h, e membros do Taleban atacaram uma delegacia pouco depois. Além de dois terroristas mortos, o chefe do serviço secreto afegão disse em entrevista coletiva que houve ataques a bomba desbaratados e nove detidos em Cabul.
Em entrevista à Folha, o principal desafiante de Karzai, Abdullah Abdullah, afirmou que houve fraudes, mas adotou um tom moderado.
Há um temor entre as forças estrangeiras, a ONU e o próprio governo que uma alta abstenção ou fraudes muito evidentes levem a protestos potencialmente violentos.
Segundo aliados, Abdullah teve forte votação em Herat (oeste) e em toda área norte, onde predomina seu grupo étnico -ele tem sangue misto pashtun e tadjique, mas é identificado com a última etnia.
A ONU avalia que nessas áreas a ida às urnas foi maior. No sul e leste conflagrados, de maioria pashtun, a violência afastou os eleitores. Como são regiões pró-Karzai, em tese o presidente teria problemas.
Dois candidatos coadjuvantes, Ramazan Bashardost e Ashraf Ghani, reclamaram de fraudes generalizadas.
"É preciso colocar em perspectiva que essa é a terceira eleição livre do país, a segunda presidencial. Não dá para ser perfeito", disse Eide, da ONU.


Próximo Texto: Dinâmica da votação é terreno fértil para ocorrência de fraude
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.