São Paulo, quinta, 22 de janeiro de 1998.



Próximo Texto | Índice

VISITA HISTÓRICA
João Paulo 2º pede "atmosfera de liberdade" em Cuba; no vôo, ele falou sobre Che Guevara
Papa chega com críticas ao comunismo

JOÃO BATISTA NATALI
enviado especial a Havana


O papa João Paulo 2º não es perou chegar a Cuba para dar sua primeira de claração de teor político.
No avião que o levava a Havana, na tarde de on tem, ele disse que se preparava pa ra se manifestar sobre os direitos humanos durante a visita que co meçou ontem e vai até domingo.
"Vocês sabem bem o que eu penso sobre os direitos humanos. É o mesmo que eu disse na Polônia e em outros países desde 1979. Os direitos humanos são direitos fun damentais e a base de toda a civili zação. Levei esta crença à Polônia no meu embate com um sistema comunista totalitário."
A referência à Polônia, seu país natal, não é casual: o combate ao comunismo, especialmente ao en tão rígido regime polonês, foi o principal mote da primeira parte de seu pontificado, que em 1998 completa 20 anos.
Essas declarações demonstram que a viagem pode ser menos "pastoral" (e portanto mais polí tica) do que vinha anunciando, por exemplo, o cardeal-arcebispo de Havana, dom Jaime Ortega.
Os repórteres quiseram saber se sua viagem significaria o começo do fim do comunismo na ilha. "Não sou profeta. Quem viver ve rá", respondeu o papa.
Mas em pronunciamento de 14 minutos ao desembarcar ontem em Havana, João Paulo 2º usou ex pressões bastante amenas ao criti car o regime comunista cubano.
O papa se referiu às "circunstân cias difíceis" e aos "sofrimentos" da igreja local, sobretudo em razão da falta de sacerdotes.
Sem criticar regime local, exor tou para que Cuba possa "oferecer a todos uma atmosfera de liberda de, de confiança recíproca, de jus tiça social e de paz duradoura".
O dirigente Fidel Castro tentou roubar a cena. Disse em seu dis curso que Cuba é o país com me lhores indicadores sociais (menos crianças sem escola ou enfermos sem hospitais) "que qualquer ou tro país" que o papa já visitou.
Todo o protocolo montado pelo governo cubano consistiu em fazer do papa bem mais um chefe de Es tado estrangeiro -o Vaticano- que um dirigente espiritual.
O papa aparentava estar bem de saúde. Desceu a escada do MD-11 mais rapidamente que o fizera há meses no Rio. Curvou-se sem difi culdades para beijar quatro crian ças que o esperavam na pista.
Críticas aos EUA
Durante o vôo o papa também fez referências críticas à posição norte-americana em sua disputa ideológica com Cuba. Um jorna lista perguntou qual era a mensa gem que ele enviaria a Washing ton. "Que mudem", foi a respos ta. Era uma referência ao embargo econômico contra Cuba, iniciado em 1962 e frequentemente ques tionado pelo Vaticano.
A reação dos EUA foi dizer que o embargo "é uma questão da lei americana que recebe forte apoio bipartidário", segundo comuni cado do Departamento de Estado.
O papa também fez referência ao maior herói do comunismo cuba no, o guerrilheiro argentino Er nesto "Che" Guevara. "Ele dese java seguramente ajudar os po bres. 'Che' se acha agora diante do tribunal do Senhor, deixemos com Ele a tarefa de julgá-lo."
Do presidente Fidel Castro, o pa pa disse que espera ouvir "a ver dade" -"Sua própria verdade como homem, como presidente, o chamado comandante da revolu ção", disse ainda no avião.
João Paulo 2º, 77, fez um comen tário irônico sobre sua saúde. Ad mitiu que ela já não é mais a mes ma do início do pontificado. Mas provocou: "Quando quero saber de minha saúde, leio os jornais".


Com agências internacionais


Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.