São Paulo, sábado, 22 de março de 2008

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Taiwan vota hoje de olho no Tibete

Candidato independentista ganha novo fôlego ao levantar temores sobre Pequim

Relação entre o governo comunista e a ilha é gélida na política, mas quente na economia; China é principal mercado para exportações


Goh Chai Hin/France Presse
Ma Ying-jeou, do Kuomintang, prometeu acelerar a economia criando mercado comum com China


RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM

Ao defender aproximação com a China para não perder o bonde da economia que mais cresce no mundo, o ex-prefeito de Taipé Ma Ying-jeou se tornou o favorito para vencer as eleições de hoje para a Presidência de Taiwan. Mas, na última semana, graças à repressão chinesa no Tibete, o candidato independentista Frank Hsieh, do partido do governo, conseguiu diminuir a distância do favorito. Hsieh é mais crítico com a China e faturou ao levantar os temores sobre as atitudes do regime comunista.
As relações de Taiwan com a China são economicamente quentes e politicamente geladas. As empresas da ilha já investiram US$ 100 bilhões na China, o principal mercado de suas exportações e o segundo mercado de onde compram, depois do Japão. Um milhão de taiwaneses mora na China.
Mas, nos últimos oito anos de governo, do independentista Partido Progressista Democrático, as relações políticas só pioraram. Para muitos, um mau negócio -esse seria um dos motivos da desaceleração da economia taiwanesa.
O tigre asiático, que crescia mais de 10% ao ano nos anos 90, cresceu "apenas" 5,7% no ano passado - taxa superior ao crescimento brasileiro em qualquer ano nos últimos 20 anos, mas frustrante na Ásia.

Sucesso na bolsa
Antes da repressão no Tibete, iniciada há dez dias, a economia dominou todos os debates na campanha. Os dois candidatos prometem melhorar a relação com a China, mas diferem na intensidade e nos prazos da mudança. Ma propôs um mercado comum com a China, mantendo a autonomia política da ilha, o que foi duramente criticado por Hsieh. O independentista acha que Taiwan seria inundado de produtos e mão-de-obra barata chineses.
Se eleito, Ma prometeu elevar o limite para visitantes chineses na ilha, dos atuais mil turistas para 3.000. E tentar facilitar o transporte aéreo. Como os vôos diretos são proibidos, uma viagem de Taipé a Xangai, de uma hora e meia de duração, pode levar até seis horas, com escalas em Hong Kong ou Macau.
O favoritismo de Ma fez com que a Bolsa de Taipé tivesse sucessivas altas nas últimas semanas, mesmo em meio à turbulência mundial. As demais bolsas asiáticas caíram, e em Taiwan a Bolsa se beneficiou da perspectiva de mais relações com a China. O partido de Ma, o nacionalista Kuomintang, controla o Parlamento desde as eleições legislativas de janeiro.

Tibete e referendo
Visto como "pró-China", Ma precisou criticar a repressão no Tibete para não passar uma imagem de fraqueza. Ele rejeitou qualquer comparação entre Taiwan e o Tibete, mas condenou a violência e até ameaçou boicotar os Jogos Olímpicos caso a crise no Tibete piore.
"Quando a China abre a boca, sempre reforça o inimigo. Ma foi forçado a se distanciar da China para continuar favorito", disse à Folha o historiador australiano Bruce Jacobs, autor de vários livros sobre Taiwan, país que estuda desde 1970.
"O favoritismo de Ma se deve à percepção mais ou menos geral de que a economia não vai bem e de que houve muita corrupção com o PPD. Mas o país já é muito desenvolvido, altamente industrializado, não pode crescer a taxas chinesas, há exagero ao se falar de crise em Taiwan", disse Jacob, de Taipé.
Hoje, além da escolha do presidente, os taiwaneses votarão em um referendo convocado pelos independentistas, que propõe que o país pleiteie sua entrada na ONU, como Taiwan ou como República da China. O referendo tem poucas chances de dar em alguma coisa.
Até os EUA, aliados tradicionais de Taiwan, são contrários ao referendo, e é improvável que a ONU aceite sua candidatura. Para ser válida, a proposta deve ter mais de 50% dos votos de todos os eleitores aptos a votar na ilha, algo difícil de se atingir. A proposta é vista como inadmissível pela China, que considera a ilha parte de seu território. O premiê chinês, Wen Jiabao, disse na semana passada que a China continuaria a fazer tudo ao seu alcance pela reunificação. Em 1895, uma derrota militar obrigou a China a ceder Taiwan para o Japão. Mas a ilha voltou às mãos da China, por três anos, depois da Segunda Guerra.
Após a vitória dos comunistas na China, em 1949, 2 milhões de nacionalistas chineses fugiram para Taiwan. Desde então a ilha foi governada pelos nacionalistas. Quarenta anos depois, Taiwan se tornou uma democracia e, em 2000, pela primeira vez houve uma transição pacífica de poder entre os dois principais partidos.


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