São Paulo, quinta-feira, 22 de abril de 2004

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IRAQUE OCUPADO

Entre os mortos há 17 crianças; cerca de 200 pessoas foram feridas nas cinco explosões sincronizadas

Atentados matam ao menos 68 em Basra

DA REDAÇÃO

Uma série coordenada de atentados terroristas com carros-bomba deixou ontem ao menos 68 mortos em Basra, no sul do Iraque, sendo 17 deles crianças. A ação, que feriu cerca de 200 pessoas, rompe um período de 50 dias sem ataques no país onde, desde agosto, 753 pessoas foram mortas em incidentes similares.
As explosões ocorreram pouco após as 7h, no horário do rush. Os terroristas detonaram quatro carros carregados com TNT em frente a uma academia de polícia e a três delegacias, uma delas vizinha ao maior mercado de rua da cidade. Uma hora depois, um quinto veículo explodiu em frente a uma delegacia em um subúrbio sunita da cidade, a maior do majoritariamente xiita sul do país, região sob jurisdição britânica na ocupação.
A explosão mais dramática ocorreu em frente à delegacia do bairro de Saudia, abrindo uma cratera de dois metros de profundidade e atingindo dois microônibus escolares. Ao menos dez crianças da pré-escola e sete meninas com idades entre 10 e 15 anos morreram carbonizadas.
Quando soldados britânicos acorreram ao local, foram impedidos de prestar socorro por uma multidão que os acusava de fracassar em garantir a segurança.
As características dos ataques -alto grau de coordenação e grande número de civis atingidos- levaram as autoridades iraquianas a citar a Al Qaeda, a rede responsável pelo 11 de Setembro, como principal suspeita. A administração americana no país acredita que a organização terrorista comandada por Osama bin Laden tenha forte presença no Iraque.
A polícia descobriu outros três carros-bomba que ainda não haviam sido detonados e prendeu três suspeitos dos ataques.
"Novamente, atentados nos mostram que os terroristas querem matar o maior número possível de pessoas, indiscriminadamente", disse o líder da administração americana no Iraque, Paul Bremer. "Eles têm uma visão distorcida do futuro do Iraque."

Guerra civil
Os ataques de ontem preservam duas características já vistas em ataques, ambas aparentemente talhadas para acirrar as tensões internas, dificultando tanto a ocupação quanto a transição política.
A primeira delas é o fato de o alvo primário serem policiais -dez deles morreram ontem. Analistas citam duas causas para isso: o fato de a polícia ser vista como aliada das forças americanas, logo considerada traidora pelos insurgentes, e a intenção de solapar as já débeis forças de segurança iraquianas instituídas pelos EUA. Nesta semana, autoridades americanas afirmaram não ver nessas forças a capacidade necessária para conter a insurgência.
A outra característica a ser ressaltada no ataque é o fato de ele ter ocorrido na maior cidade xiita do país, Basra, relativamente tranqüila sob a presença das tropas britânicas. Depois das delegacias, o segundo alvo iraquiano mais visado pela insurgência -e pelos terroristas estrangeiros, caso se confirme a suspeita sobre a Al Qaeda- são as mesquitas. Além disso, os últimos grandes atentados visaram os xiitas, inclusive o maior deles, ocorrido em 2 de março último, que matou 171 pessoas em Bagdá e Karbala.
Analistas apontam esse fator como uma tentativa de instigar os xiitas -que perfazem 60% da população iraquiana e passaram os 35 anos da ditadura do partido Baath reprimidos- contra a minoria sunita, detonando uma guerra civil e inviabilizando a transição. Essa percepção ganhou corpo em janeiro, quando as forças dos EUA apreenderam uma carta atribuída a um militante da Al Qaeda na qual ele pedia ajuda para fomentar tal confronto.
O ministro do Interior iraquiano, Samir Shaker Mahmoud al Sumeidi, comparou o ataque de ontem ao do dia 2 de março e ao duplo atentado nas sedes de partidos curdos em Irbil, que matou 109 pessoas em 1º de fevereiro.
Um funcionário do governo britânico que falou sob condição de anonimato disse "estar certo de que os atentados foram provocados por terroristas estrangeiros ou por sunitas" que faziam parte do regime deposto. "Se há uma coisa da qual tenho certeza é de que não foram os xiitas", disse.

Bush e Blair
Em Londres, o premiê Tony Blair disse que não pretende reforçar a presença militar britânica no país, atualmente de 11 mil homens, apesar dos atentados. O líder britânico, principal aliado dos EUA na operação iraquiana, também declarou que a determinação da coalizão de reconstruir o país não seria abalada.
"A maioria do povo iraquiano quer um Iraque estável e democrático", disse Blair na Câmara dos Comuns. "Esses terroristas querem nos deter, e nós, todos nós na comunidade internacional, temos de nos unir à maioria iraquiana para assegurar que eles não sejam bem-sucedidos e que a democracia prevaleça", declarou.
Em Washington, seu aliado George W. Bush fez comentários semelhantes, mas admitiu que as últimas semanas no Iraque -marcadas por seqüestros de civis estrangeiros e levantes contra a ocupação em Najaf e Fallujah - foram "especialmente difíceis. "O povo iraquiano está olhando para os americanos e perguntando: vocês vão sair correndo? Nós não vamos sair correndo enquanto eu estiver no governo", afirmou.


Com agências internacionais

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