São Paulo, domingo, 22 de junho de 1997.



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CÚPULA DE DENVER
EUA, eufóricos, recebem colegas do G-7 tentando "vender" a sua receita de crescimento econômico
Modelo americano busca hegemonia

CLÓVIS ROSSI
enviado especial a Denver

Ao desembarcar em Denver, para ser o anfitrião da reunião de cúpula do G-7, o clube dos sete países mais ricos do mundo, o presidente Bill Clinton foi pouco modesto:
"Recebemos nossos parceiros em um momento em que a economia norte-americana é a mais saudável em uma geração e a mais forte do mundo", disparou, para uma platéia que incluía os líderes dos outros sócios do clube (Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Canadá), mais a Rússia.
Um dos textos de trabalho que Clinton recebera para a cúpula sugeria que ele dissesse a seus parceiros do mundo rico que "há uma profunda e interligada relação entre crescimento econômico e mudança econômica".
Maneira sutil de ensinar, especialmente aos europeus, que apegar-se ao modelo de bem-estar social que é orgulho da Europa já não funciona nos novos tempos.
"O processo de mudança econômica inevitavelmente envolve uma certa quantidade de destruição criativa", acrescentava o "paper", usando, aliás, terminologia que é frequente em parte da equipe econômica brasileira.
O discurso de Clinton ao chegar a Denver é uma espécie de baliza para o debate, recém-reaberto, sobre os modelos econômico-sociais, bem diferentes na Europa e nos EUA.
A derrota do comunismo parecia ter encerrado o debate, com o triunfo do capitalismo puro e duro e o sepultamento do papel do Estado até mesmo como instrumento de proteção aos mais pobres.
Mas vieram as eleições francesas e "o consenso que supúnhamos ser universal entre os líderes mostrou-se não compartilhado pelos eleitores", como diz Robert Hormats, vice-presidente da empresa de investimentos Goldman & Sachs.
Dan Tarullo, representante pessoal de Clinton para o G-7, vai na mesma linha. Diz que "a discussão sobre globalização e reforma estrutural provavelmente ganhará um matiz ligeiramente novo, por causa das mudanças de liderança e algumas eleições no mundo".

Luzes e sombras
Talvez por isso, a Casa Branca distribuiu aos cerca de 3.000 jornalistas do mundo todo credenciados para a cúpula de Denver um texto comparando a situação dos países do G-7 entre Houston (local da cúpula anterior nos EUA, em 90) e Denver.
Título: "O ressurgimento da economia americana".
Comparações: "O crescimento da economia, do emprego e do investimento, nos EUA, superou a média do G-7 em todos os anos, desde que o presidente Clinton assumiu".
De fato, a economia norte-americana está entrando em seu sétimo ano de crescimento, o desemprego é de 4,8% (o menor em 24 anos) e a inflação não passa de 3%.
Na Europa, ao contrário, o crescimento é baixo e o desemprego bate recordes históricos tanto na Alemanha como na França, só para citar as duas economias mais importantes entre os países da União Européia.
"Velhos bons tempos"
A ofensiva da Casa Branca capturou o título principal de "The Wall Street Journal" na quinta-feira: "Economia dos EUA mostra às nações estrangeiras os meios de crescer muito mais depressa".
Antes, a revista "Fortune" já festejava: "Estes são os velhos bons tempos", em alusão ao período entre o fim da Segunda Guerra Mundial (1945) e 1973 (primeira crise do petróleo), os anos dourados da economia norte-americana.
É compreensível, nesse ambiente eufórico, que Robert Reich tenha desistido de ser secretário de Trabalho de Clinton, cargo que exerceu no primeiro mandato, ou seja, entre 93 e 97.
Reich, um acadêmico que jamais pediu que esquecessem o que escreveu, saiu com uma devastadora análise da realidade social norte-americana:
"Ainda há milhões de pessoas tentando desesperadamente se manter à tona. Uma de cada cinco crianças vive na pobreza. Há 44 milhões de americanos que não têm seguro-saúde, as pessoas de 50 anos sem educação superior não viram, na média, um aumento de salário ou de benefício em 20 anos. Os americanos estão segregados pela renda como nunca antes".



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