São Paulo, domingo, 22 de junho de 1997.



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ANÁLISE
Cautela de autoridades mostra que termos definidos sexta, apesar de rígidos, parecem ser bons para empresas
Indústria do fumo pode ganhar
com acordo

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
de Washington

Se o acordo anunciado na sexta-feira pelos secretários da justiça de 40 Estados dos EUA é mesmo um "remédio amargo" para a indústria de tabaco engolir, como explicar o fato de suas ações nas bolsas de valores terem subido em média 17% desde que os termos básicos do entendimento foram divulgados, em abril?
De fato, apesar do estardalhaço com que a notícia do acordo foi saudada, muita água há de rolar antes de se poder decretar a morte do fumo nos EUA. Gente séria, a começar pelo secretário da Justiça do Estado de Minnesotta, um dos que aprovaram o acordo, acha que os executivos das indústrias de cigarro do país estão comemorando o acerto firmado no Hotel Ana, em Washington, onde o líder palestino Iasser Arafat se hospeda quando está na capital dos EUA.
Hubert Humphrey Jr., filho do vice-presidente de Lyndon Johnson (1965-1969) e candidato derrotado por Richard Nixon na eleição presidencial de 1968, pondera que acionista não joga dinheiro fora. Se ele está apostando nas ações das empresas de fumo é porque elas saíram ganhando com o acordo.
Pode ser. Primeiro, se o acerto for validado pelo Congresso (o que pode acontecer com emendas favoráveis à indústria, que desfruta de grande apoio entre parlamentares que ela cortejou por décadas), ele vai livrá-las de custos de centenas de milhões de dólares anuais com advogados e limitar a US$ 368 bilhões nos próximos 25 anos suas despesas com indenizações de vítimas do fumo. Como calculam alguns, isso dá cerca de US$ 30 mil por morte provocada por cigarro, muito menos do que elas teriam que pagar se todos os casos fossem levados à Justiça.
Depois, o acordo torna praticamente impossível a proibição pelo governo do consumo de nicotina. Ele assegura que essa medida não poderá ser tomada antes de 2009 e, então, se for proposta, terá que passar pelo Congresso e apenas sob a condição de haver garantias do não-surgimento de um mercado negro da droga no país.
O acordo dá muito tempo para as empresas pesquisarem novos tipos de cigarro menos nocivos à saúde humana, como a marca Eclipse, que a RJ Reyndols acaba de lançar, que diminui em 90% a quantidade de fumaça. Além disso, não mexe nos negócios da indústria fora dos EUA, responsáveis por 50% de seus lucros atuais.
A cautela com que o presidente Bill Clinton reagiu ao acordo, as primeiras manifestações desfavoráveis dos líderes da oposição que tem a maioria no Congresso e a dissensão entre os secretários expressada por Humphrey são indícios de que a batalha final da guerra ao fumo nos EUA está longe de decidida, embora o cerco aos fumantes nunca tenha sido maior.



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