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São Paulo, domingo, 22 de junho de 2003

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ORIENTE MÉDIO

Grupo arregimenta amplo apoio na diversificada população do Líbano, apesar das acusações de terrorismo

Hizbollah alia extremismo e ação social

FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM BEIRUTE

O Líbano é um oásis de liberdade num deserto de proibições. O mesmo país que acolhe o grupo extremista islâmico Hizbollah é o único da região que vende a revista "Playboy" nas bancas.
Em menos de dez minutos de carro, vai-se de um bairro repleto de imagens da Virgem Maria a um outro com o rosto onipresente do aiatolá Khomeini, líder da Revolução Islâmica iraniana.
O Líbano também faz inveja ao Brasil como um país que tem feriados oficiais para mais de quatro religiões diferentes. No centro de Beirute, os bares se enchem de clientes de religiões diversas, com mulheres de "hijab" fumando narguilé ao lado de homossexuais mostrando o umbigo com piercing antes de irem para as raves.
Às sextas, são todos vítimas da competição sonora entre o sino estridente da igreja e o chamado para a oração do muezim na mesquita, algo certamente não previsto por são Pedro ou Muhammad. Em sua visita em 1997, o papa João Paulo 2º disse que "o Líbano é mais que um país, é uma mensagem". A mensagem, contudo, não é a mesma para todos. Mesmo evitando tocar no assunto, o Hizbollah não nega que almeja viver numa República islâmica.
Se as religiões não se distinguem na praia, nas danceterias e nas universidades, na política a distinção fica clara. O Líbano é um país em que o presidente é sempre um cristão maronita, o líder do Congresso é muçulmano xiita, o premiê é muçulmano sunita, e o vice-líder do Parlamento é cristão-ortodoxo. O Parlamento também tem quotas religiosas.
O problema é que a divisão foi feita baseada num censo de 1932, quando os maronitas eram a maioria. Uma das razões da guerra civil (1975-90) foi que os muçulmanos não concordavam em ter menos cadeiras no Parlamento, pois acreditavam ser maioria.
O balanço do país é mantido com o acordo tácito de que a democracia não será exercida pelo voto da maioria, mas pelas minorias representando suas maiorias internas. O equilíbrio externo também não está escrito em nenhuma Constituição, mas foi cimentado em um discurso que virou norma: o Líbano é uma entidade independente e não pode se associar nem com o Ocidente nem com o Oriente. A regra que inspirou a frase "uma dupla negação não faz uma nação" é mais um peso na complicada balança que mantém o Líbano em pé.
O outro peso, mais evidente, ainda que menos oficializado, é que todos os partidos são inimigos de Israel. É assim que o Hizbollah passou a ser mais que o "Partido de Deus". Ele virou o partido do Líbano, congregando apoios mais diversos que qualquer outro grupo político.
O Hizbollah surgiu em 1982 com o intuito de defender o Líbano da invasão israelense. O grupo é acusado pelos EUA de ter inventado o homem-bomba e de ter matado mais americanos do que qualquer outro grupo terrorista além da Al Qaeda, responsável pelos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001.
Para o Departamento de Estado americano, o Hizbollah é suspeito de envolvimento nos ataques suicidas contra a embaixada americana em Beirute e o alojamento dos fuzileiros navais em 1983, que matou 241 americanos.
O Hizbollah também é acusado de ter sequestrado dezenas de estrangeiros no Líbano, vários mantidos em cativeiro por até cinco anos. O grupo nega as acusações.
Apesar (ou por causa) de tudo isso, Hassan Nasrallah é depositário de mais respeito do que praticamente todos os outros políticos. Com aquela aura que só os chefes militares podem ter acima das picuinhas políticas e da corrupção, o Hizbollah atua também na frente social, administrando hospitais gratuitos, escolas e fundações tidos como mais competentes do que os oferecidos pelo governo. (PAULA SCHMITT)


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