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EUA exageram valor dos detidos em Guantánamo
TIM GOLDEN E
DON VAN NATTA JR.
DO "NEW YORK TIMES"
Por quase dois anos e meio, autoridades americanas vêm afirmando que os prisioneiros mantidos em Guantánamo são alguns
dos mais perigosos terroristas do
mundo. Mas uma investigação do
"New York Times" descobriu que
autoridades militares e do governo repetidas vezes exageraram
tanto o perigo que os presos representam como as informações
que eles forneceram.
As autoridades dizem que as informações passadas pelos prisioneiros expuseram células terroristas, impediram ataques e revelaram dados vitais sobre a Al Qaeda. De acordo com funcionários
da Casa Branca, os segredos que
escondem e a ameaça que representam justificam sua detenção
por tempo indeterminado e sem
acusação formal.
Atualmente há em Guantánamo 595 "combatentes inimigos",
como são chamados pelo governo
americano os detidos -uma definição que os coloca fora do alcance das leis americanas e das
Convenções de Genebra que regulamentam o tratamento de prisioneiros de guerra.
A base militar de Guantánamo
está instalada em uma área de 115
quilômetros quadrados no sudeste da ilha de Cuba. O território foi
tomado pelos americanos durante a guerra EUA-Espanha (1898) e
está cedido por Cuba aos EUA em
regime de leasing desde 1903. A
Suprema Corte está se preparando para deliberar sobre o status
legal desses prisioneiros.
Em entrevistas, dezenas de militares, policiais e agentes de inteligência de alta patente dos EUA,
da Europa e do Oriente Médio dizem que, ao contrário do que afirmam altos funcionários da Casa
Branca, nenhum dos prisioneiros
da base naval em Guantánamo é
líder ou agente graduado da Al
Qaeda. Todos dizem que só um
punhado -alguns colocam o número em uma dúzia, outros em
mais de duas dúzias- são membros jurados da Al Qaeda ou militantes capazes de revelar como a
rede terrorista funciona.
Recrutas e inocentes
Em setembro de 2002, oito meses após os prisioneiros começarem a chegar a Cuba, um estudo
secreto da CIA (o serviço secreto
dos EUA) levantou indagações
sobre a sua importância. De acordo com autoridades que tiveram
acesso ao documento, ele sugere
que muitos dos terroristas acusados pareciam ser recrutas de baixo nível que foram ao Afeganistão
apoiar o Taleban ou simplesmente eram gente inocente colhida
pelo caos da guerra.
Quase dois anos depois, afirmam autoridades militares, as
provas contra muitos dos prisioneiros ainda é tão esparsa que os
investigadores foram capazes de
montar casos para a abertura de
processo militar contra apenas 15
dos suspeitos. Segundo essas fontes, os investigadores preparam
outros 35 a 40 casos para irem a
julgamento.
Autoridades em Guantánamo e
no Pentágono defendem os esforços de inteligência e dizem que
eles continuam a produzir dados
úteis. "Todos os dias nós conseguimos algum pedaço de informação relevante", afirmou Steve
Rodriguez, que dirige as equipes
de interrogadores na base.
Ao mesmo tempo em que defende a importância das informações conseguidas, o comandante
da prisão de Guantánamo, general Jay Hood, reconhece o desapontamento em Washington. "As
expectativas eram muito altas
desde o começo. Alguns esperavam um fluxo de informações que
ajudaria no desmantelamento da
mais sofisticada organização terrorista numa questão de meses.
Mas isso não aconteceu."
Mesmo agora, autoridades admitem que foram incapazes de
extrair informações de pelo menos 60 presos -em alguns casos,
sequer suas identidades. Essas incertezas, dizem as autoridades,
deixam aberta a possibilidade de
que existam terroristas mais perigosos entre os detentos.
Espiões
Funcionários do governo inicialmente esperavam conseguir
mais em Guantánamo do que extrair informações dos prisioneiros. Eles pretendiam fazer com
que alguns dos detentos se transformassem em trunfos da guerra
contra o terrorismo.
De acordo com várias autoridades, a CIA fez um grande esforço
para recrutar alguns espiões entre
os prisioneiros, oferecendo ajuda
para tirá-los de Guantánamo e
mandá-los de volta a seus países
-em troca, receberia informações sobre atividades de militantes. O sucesso desses esforços é
desconhecido. Bill Harlow, porta-voz da CIA, se recusou a comentar o assunto. O que se sabe, no
entanto, é que os EUA soltaram
alguns presos perigosos.
Autoridades afirmam que fizeram exames cuidadosos sobre os
146 presos que foram libertados,
incluindo os 16 que tiveram sua
custódia transferida para os governos dos países de sua origem.
Ainda assim, pelo menos alguns
sérios erros já foram cometidos.
Relatos de autoridades afegãs e
americanas indicam que pelo menos cinco dos 57 prisioneiros afegãos soltos retornaram aos campos de batalha do Taleban. Alguns dos cinco se envolveram em
novos ataques contra americanos,
dizem autoridades do sul do Afeganistão -incluindo Mullah
Shahzada, um comandante taleban que teria sido morto recentemente. "Eles estão lutando de novo e matando gente", disse Khan
Muhammad, o militar afegão
mais graduado na região.
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