São Paulo, domingo, 22 de outubro de 2000

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PAZ SOB ATAQUE
Países moderados tentam abrandar teor da resolução final do encontro no Cairo em apoio aos palestinos
Líderes árabes tentam ação unificada

France Presse
O líder palestino Iasser Arafat (à esquerda) conversa com o emir de Qatar momentos antes do início da cúpula da Liga Árabe


PAULO DANIEL FARAH
ENVIADO ESPECIAL AO CAIRO

Líderes árabes reunidos no Cairo iniciaram ontem uma cúpula de dois dias para acertar uma resposta unificada à onda de violência que atinge Israel e os territórios palestinos.
Apesar de duros ataques contra as ações israelenses, líderes árabes moderados e o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Iasser Arafat, reiteraram o desejo de seguir negociando a paz.
Na abertura da reunião, o presidente egípcio, Hosni Mubarak, pediu um minuto de silêncio pelas vítimas dos confrontos.
O Egito e a Jordânia, que firmaram acordos de paz com Israel, teriam pressionado para que fossem feitas mudanças no texto da declaração final do encontro, que reconhece "o envolvimento popular (árabe) sem precedentes" e, a princípio, pedia a suspensão da normalização das relações diplomáticas com Israel.
A nova versão diria que os Estados árabes "atribuem a Israel a responsabilidade por resoluções e medidas que possam ser tomadas quanto às relações" com o país.
A delegação líbia se retirou do encontro ontem protestando contra o teor brando do documento final.
A declaração também deve reafirmar que, para os árabes, "a paz completa não virá sem que Jerusalém Oriental fique sob soberania total palestina e o respeito dos direitos dos palestinos".
Tunísia, Sudão, Iêmen e Líbano pediram um boicote a Israel "enquanto houver terras árabes ocupadas". Grupos mais radicais pediram, antes do encontro, a declaração de guerra e o uso do petróleo como arma no conflito.
Manifestações contra Israel nos países árabes intensificaram a pressão sobre os líderes para que eles mostrassem seu comprometimento com a questão palestina. Protestos chegaram a reunir mais de 500 mil pessoas, em aglomerações semelhantes às que marcaram a década de 60.
Na TV e no rádio egípcios, uma canção diz: "Devemos acordar. Os que morrem por sua pátria não estão mortos, renascem. Matar crianças não é heroísmo".
É também cada vez maior o número de pessoas que participam de um boicote a produtos israelenses e norte-americanos no Egito. No Cairo, circulam listas com produtos que devem ser evitados.
"Os países árabes tentam, neste momento, harmonizar a posição oficial do governo com a da população. As ruas árabes falaram de maneira muito clara nos últimos dias", afirma Ahmad Abdul Halim, analista do Centro de Estudos do Oriente Médio, no Cairo.
Segundo a analista política egípcia Hala Mustafa, a cúpula quer "estabelecer uma ação de acordo com a nova realidade do conflito israelo-árabe e dentro de um círculo diplomático, sem guerra".
Em seu discurso, Arafat disse que "nosso povo da Intifada (revolta popular) sagrada, cujas ondas não pararão até atingirmos a vitória... fez uma promessa a todo árabe, muçulmano e cristão deste mundo que seguirá sua luta com todos os meios legítimos até conseguirmos a vitória".
Mas Arafat disse que os palestinos ainda querem negociar a paz, apesar das "mortes em massa e bombardeios bárbaros" das tropas israelenses.
Cerca de 120 pessoas morreram nos choques entre Israel e palestinos desde o dia 28 de setembro, quase todas árabes. Israel já foi condenado pelo Conselho de Segurança da ONU e pela Assembléia Geral da organização por "uso excessivo de força".
Israel diz que seus soldados estão agindo de forma contida e que só disparam com munição real quando suas vidas estão em perigo diante dos manifestantes palestinos, que usam pedras, bombas incendiárias e, ocasionalmente, armas de fogo.
Dos 22 países que participam da Liga Árabe, 14 chefes de Estado compareceram à cúpula no Cairo, a primeira reunião desse tipo desde 1996, convocada para prestar solidariedade aos palestinos e estudar formas de agir contra Israel.
Mubarak condenou as ações de Israel, mas afirmou que os árabes têm o dever histórico de "tentar mais uma vez resgatar o processo de paz".
A Arábia Saudita pediu aos países árabes que estabeleçam dois fundos para ajudar os palestinos e proteger "o caráter árabe e islâmico" de Jerusalém Oriental.
O príncipe-herdeiro saudita, Abdullah bin Abdul Aziz, disse que um fundo de US$ 200 milhões deveria ser criado para apoiar as famílias palestinas que tiveram mortos ou feridos nos combates recentes e que US$ 800 milhões deveriam ser destinados para as ações em prol de Jerusalém Oriental. O príncipe disse que seu país daria 25% do total.

ONU
Resolução aprovada anteontem à noite pela Assembléia Geral da ONU condenou Israel por "uso excessivo de força contra civis palestinos" e pediu que o país impeça "atos ilegais de violência cometidos pelos colonos israelenses" nos territórios palestinos.
A resolução foi aprovada com 92 votos a favor (incluindo o do Brasil), 6 contra e 46 abstenções. Israel rejeitou a resolução e a chamou de "parcial".


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