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A VISÃO ISRAELENSE
Chanceler interino pede contraproposta palestina
Violência é resultado da frustração com Arafat
FERRAN SALES
DO "EL PAÍS"
O ministro do Interior e chanceler interino de Israel, Shlomo Ben
Ami, 56, tem uma tarefa duplamente difícil: impulsionar o processo de paz e tratar de reprimir
uma revolta palestina que já deixou mais de cem mortos.
Ele diz que a violência é fruto da
frustração com Iasser Arafat, tanto do lado israelense quanto do lado palestino, e faz um pedido ao
líder palestino: "Em vez de orquestrar toda essa onda de violência, faça-nos uma contraproposta".
O paradoxo de Ben Ami -um
judeu nascido em Tânger (Marrocos) que migrou para Israel quando tinha 12 anos de idade, licenciado em língua e literatura hebraicas, pedagogia e história, professor da Universidade de Tel
Aviv- é um dos mais difíceis
quebra-cabeças colocados hoje
no Oriente Médio.
O ministro, que afirma acreditar que Israel esteja fazendo uso
abusivo da força para conter a
violência palestina, disse que não
sabia que o líder da oposição conservadora, Ariel Sharon, iria visitar o Monte do Templo (Esplanada das Mesquitas, para os muçulmanos), o que os palestinos identificam como o estopim dos conflitos. Afirma, porém, que "o líder
da oposição não tem porque pedir permissão para visitar uma
zona de litígio".
Pergunta - O sr. pode ir mais além
da frente de batalha e analisar as
causas da revolta palestina?
Shlomo Ben Ami - Não desvalorizo os interesses dos palestinos.
Respeito suas reivindicações por
sua terra e sua firme determinação de atingir seus objetivos. Mas
considero que parte dessa violência é fruto da frustração gerada
pela própria Autoridade Nacional
Palestina.
Sou incapaz de traçar uma linha
que fosse capaz de delimitar a
frustração originada por Arafat
daquela gerada por Israel. Mas digo que 98% da população palestina está sob o controle da autoridade de Arafat.
Há alguns dias, escutei um manifestante gritar: "A paz só existe
para os que têm o estômago
cheio. Para nós não". Assim, com
poucas palavras, estabelecia uma
divisão entre os que estão se beneficiando do processo de paz, devido à natureza da Autoridade Nacional Palestina, e aqueles que sofrem, o povo faminto.
Não irei muito mais longe em
minha análise. Mas será que alguém impediu Arafat de converter os milhões de dólares que recebeu da comunidade internacional em benefício de seu povo?
Pergunta - Passada a onda de violência, o sr. crê que será possível retomar as negociações no mesmo
ponto em que estavam no mês de
julho, em Camp David?
Ben Ami - Negociamos com eles
em Camp David e lhes fizemos
uma oferta razoável. Mas eles preferiram fazer gestos de desaprovação e acabaram rumando para
uma guerra.
Devo fazer uma recomendação
a Iasser Arafat: em vez de orquestrar toda essa onda de violência,
faça-nos uma contraproposta.
Em todo caso, Camp David será
sempre uma referência. Será muito difícil voltar atrás sem esse legado. Estou orgulhoso que a
União Européia, na cúpula celebrada em Biarritz, tenha dado seu
apoio à plataforma de Camp David como ponto de partida para
futuras negociações.
Pergunta - Contudo vocês não se
cansam de dizer sempre que Arafat
não é o sócio adequado para o processo de paz, tratando sempre de
desautorizá-lo.
Ben Ami - Inicialmente deveríamos definir a palavra sócio. Arafat é o líder do povo palestino,
presidente da Autoridade Nacional Palestina. Mas nós temos sérias dúvidas de que Arafat esteja
disposto a alcançar um acordo
com Israel. Fomos a Camp David
com ele. Negociamos. Continuamos negociando. Agora estamos
no meio de uma explosão de violência.
Estes dias escutamos alguns palestinos envolvidos nos acontecimentos, como Marwan Barghouti
(chefe da milícia armada da Fatah), dizerem que a Intifada continuará até que Israel seja expulso
dos territórios e que o direito dos
refugiados ao retorno seja garantido. Essa é sua posição. Agora
nos perguntamos se Arafat é um
parceiro válido para as negociações de paz.
Eles estão atuando da mesma
maneira que o Hizbollah, a guerrilha fundamentalista libanesa.
Pergunta - Existem queixas e condenações feitas pela comunidade
internacional a respeito do que está acontecendo no campo de batalha. O sr. crê que Israel tenha feito
uso abusivo da força militar em sua
luta contra a violência palestina?
Ben Ami - Essa é uma pergunta
difícil de responder. Posso dar
uma resposta automática como
ministro israelense: sim.
Mas a realidade é muito mais
complicada. O que podemos fazer
se temos um bairro de Israel (Guilo, em Jerusalém) sendo atacado
de um vilarejo palestino vizinho?
O comando do Exército nos diz
que a melhor maneira de repelir
os ataques é o uso dos helicópteros.
Todo o bairro está em perigo, e
nós, como governo, temos somente uma obrigação: dar-lhe
proteção. Chega um momento
em que somos obrigados a usar os
helicópteros, porque não há nenhuma outra opção. Seria isso
uso excessivo da força? Utilizamos os helicópteros contra posições, não contra pessoas.
Pergunta - Mas é nítida a desproporção entre mortos israelenses e
palestinos.
Ben Ami - Quando há uma combinação de milícia armada, polícia disparando contra ela e gente
movendo-se no meio das duas, o
Exército tem dificuldades para
atuar. Essa combinação é única. É
um coquetel explosivo, típico do
Oriente Médio. Para qualquer
resposta que dermos, estaremos
sempre por um fio, ela poderá ser
criticada e qualificada como uso
abusivo da força.
Pergunta - Quando será definitivamente levantado o bloqueio dos
territórios autônomos palestinos
estabelecido pelo Exército de Israel?
Ben Ami -Existem dois tipos de
bloqueio: o exercido entre cidades
palestinas e o estabelecido entre
Israel e os territórios autônomos.
O primeiro já suspendemos. O segundo depende da ameaça de ataques terroristas.
Os palestinos soltaram da prisão alguns, digo, muitos terroristas do Hamas e da Jihad Islâmica
nos últimos dias.
O bloqueio está diretamente
vinculado e condicionado a uma
nova detenção desses elementos
radicais. Israel encontra-se em estado de alerta frente uma possível
nova onda de atentados.
A política dos bloqueios não é
nova e já foi feita no passado, sem
Intifada alguma. Inclusive já foi
feita em alguns casos com a cumplicidade da Autoridade Nacional
Palestina.
Pergunta - O sr. ou o seu ministério (o do Interior) deu permissão
para que o líder do partido nacionalista Likud, Ariel Sharon, visitasse o Monte do Templo, o que é considerado pelos árabes como o estopim da violência?
Ben Ami - Naquele momento eu
estava nos Estados Unidos. O governo também não foi responsável por nenhuma decisão a respeito do caso.
Deve-se entender que o líder da
oposição não tem porque pedir
permissão ao primeiro-ministro
para visitar uma zona de litígio.
Por um acaso William Hague (líder conservador britânico) tem
de pedir permissão a Tony Blair
para visitar Gibraltar?
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