São Paulo, sábado, 23 de junho de 2007

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Escravidão chinesa vira escândalo

Cumplicidade de funcionários provinciais com exploração faz aumentar pressão sobre Pequim

Famílias de crianças seqüestradas para serem escravizadas em olarias lideraram movimento que desencadeou ação policial

DA ASSOCIATED PRESS, EM PEQUIM

A China anunciou mais detenções e um governador provincial pediu desculpas, enquanto o governo reforçava seus esforços para tentar demonstrar que estava reagindo ao crescente escândalo causado por casos de trabalho escravo em olarias e minas das Províncias de Henan e Shanxi, no centro do país. A imprensa revelou que os líderes das quadrilhas de escravocratas estavam escondendo as crianças operárias e cobrando resgates por sua libertação. Muitas delas foram seqüestradas em estações de trens e vendidas por apenas 500 yuans (US$ 65) a olarias ilegais.
O escândalo não perde o ímpeto. Com usuários de internet e alguns veículos de mídia expressando indignação, o premiê Wen Jiabao pode sofrer abalos em sua reputação como defensor dos menos privilegiados, caso não leve a investigação adiante. Wen e o presidente chinês, Hu Jintao, governam sob o lema da "sociedade harmoniosa", que promete prioridade à redução das diferenças entre ricos e pobres no país. Shanxi e Henan são Províncias atrasadas quando comparadas com as regiões costeiras da China, onde se concentrou o desenvolvimento econômico das últimas décadas.
Na manhã de ontem, a agência oficial de notícias Xinhua reportou a detenção de dois funcionários do serviço estatal do trabalho, por cumplicidade com os escravocratas das olarias de Shanxi. Os dois foram os primeiros funcionários públicos detidos em conexão com as acusações de que centenas de crianças e adultos trabalham como escravos nas olarias, em jornadas prolongadas, sob condições precárias e sem pagamento algum.
Segundo a agência, os dois funcionários são responsáveis pelo seqüestro de um trabalhador menor de idade libertado de uma olaria e que estava sendo transportado para casa. Eles a seguir enviaram o menino a uma outra olaria, onde uma vez mais ele teve de trabalhar como escravo, segundo a Xinhua.
O escândalo gerou um episódio extraordinário de autocrítica, esta semana, de parte de Yu Youjun, governador de Shanxi. A autocrítica surgiu durante uma reunião de gabinete presidida na quarta-feira pelo premiê Wen, que ordenou um inquérito completo sobre o caso. Ontem, o governador foi ainda mais franco: "Em nome do governo da Província, peço perdão às vítimas e às suas famílias, bem como a todo o povo de Shanxi", disse.
Desde que o caso irrompeu, no mês passado, mais de 8.000 olarias e pequenas minas de carvão em Shanxi e Henan foram alvo de batidas policiais, com 591 trabalhadores libertados, entre os quais 51 crianças, de acordo com a mídia estatal. Cerca de 160 proprietários de olarias suspeitos foram detidos e um secretário do Partido Comunista em uma aldeia do condado de Hongtong, Shanxi, foi expulso da agremiação depois que seu filho foi descoberto operando uma olaria onde havia 31 operários escravizados.
O governo do condado de Hongtong despachou equipes a 12 cidades para entregar aos parentes das vítimas cartas em que pede desculpas e promete indenizações de 1.410 yuans (US$ 184) por mês de trabalho de cada operário escravo -valor três vezes superior ao do salário mínimo local.
O início das investigações foi desencadeado por pais que percorreram as montanhas do sul de Shanxi à procura de filhos desaparecidos. Um grupo que alega representar 400 pais fez circular na internet uma carta aberta na qual informava que mil crianças estavam detidas como escravos, e acusava funcionários do governo de ignorar ou obstruir suas buscas.


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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